20. Trégua (Parte II)

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Ronan descia o último lance de escadas do Hospital Hobes quando avistou uma garota da sua idade trajando um conjunto de couro preto. Aquele cabelo dourado não o enganava. Ela o notou quando estavam a poucos passos um do outro. Eles se encararam por um momento, até Ronan se manifestar:

— Você vai visitá-lo?

— Eu preciso! — ela respondeu fugindo do olhar julgador.

— Boa sorte, Nathalia.

— Obrigado, Ronan.

Ela parou e observou o colega seguir pelo corredor, sair do hospital, descer o pequeno lance de escadas até se perder na multidão que ia para casa após um longo dia de trabalho.

Reunindo toda a coragem que conseguiu, Nathalia subiu a escadaria interna do hospital, decidida a fazer o que era certo. Após um demorado trajeto pelos corredores brancos e fantasmagóricos, estava de frente à porta do quarto onde o garoto descansava. Respirou fundo, pôs sua mão pálida na maçaneta e a girou. Ao entrar devagarinho, viu o paciente ficar atônito até uma raiva ferina transparecer em seu olhar. Dario se levantou num impulso e sentou na cama, ofegou, e perguntou com frieza em sua voz:

— Veio terminar o serviço, Leonhart?

Os lábios e os olhos de Nathalia tremularam, pôs a mão direita no peito, respirou fundo e caminhou para perto dele.

— Eu vim me desculpar...

Num gesto de amizade levou sua mão direita ao braço dele, mas antes que encostasse, ele rejeitou o gesto. Tomado pela fúria de antes, Dario esbravejou a plenos pulmões:

— O que? Você quase me matou e agora vem pedir desculpas?

A indignação do colega fez reviver algumas das memórias mais desagradáveis, memórias que Nathalia queria enterrar, esquecer para sempre. Lampejos de suas mentiras, manipulações e principalmente, arrependimentos fizeram lágrimas escorrerem pelo seu rosto.

— Eu quase morri também... — ela soluçou levando a mão esquerda aos olhos. — Eu sei que sou uma descontrolada! — finalizou rendendo-se a um choro contido, mas verdadeiro.

Preocupada com gritos vociferados por Dario, uma enfermeira que passava pelo corredor chegou para ver o que havia acontecido naquele quarto. Ao constatar que era apenas uma briga de casal, saiu tranquilizada por não ser algo sério envolvendo o paciente.

Dario constrangeu-se por causar aquela cena, mas o que ela esperava? Ela tentou me matar! É a verdade, ela é louca, tentou convencer-se de que não estava errado em gritar no quarto do hospital. Quando repassou em sua mente o lamento choroso de Nathalia, percebeu que ela poderia estar falando a verdade. Será que foi um acidente mesmo? Afinal, todo mundo vinha falando isso para ele, até mesmo Ronan.

Teria de passar a história a limpo.

— Escuta... Na-ta... — desistiu de chamá-la pelo nome, pois doía só de tentar. — Você não fez aquilo de propósito.. fez? — questionou agora mais calmo.

Ela parou de soluçar, mas ainda com os olhos úmidos tentou responder.

— Claro que não, seu besta! Não é porque sou melhor que você na manipulação que eu iria saber como fazer uma monstruosidade daquelas.

Continua uma bruxa. E o Ronan ainda tentou me convencer que ela tinha mudado, pensou, mas foi interrompido do devaneio.

— Desculpa — disse ela baixinho.

RonanOnde histórias criam vida. Descubra agora