45. Primo (Parte V)

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Ronan sentiu algo agarrá-lo pelos ombros e sacudi-lo. Abriu os olhos em desespero, mas deparou-se com um breu aterrorizante. A força oculta pelas trevas insistiu em arrastá-lo para fora da cama. Ofegando e suando o nervosismo para fora, Ronan tateou a escuridão até apalpar o braço agressor e exprimir seu ódio e revanchismo em um ato, segurou-o com força e enterrou sem piedade as unhas na pele dele.

— Para seu imbecil, sou eu — sussurrou uma voz familiar.

— Anna? — sussurrou de volta.

— Quem mais poderia ser?

— Nessa escuridão poderia ser qualquer um.

— Tens razão...

— Mas como sabe que eu estaria nessa cama?

— Eu escutei o barulho de um idiota pulando naquela cama.

— Bela audição, mas poderia ter sido eu.

— Não se subestime Ronan.

As mãos da amiga o puxaram pelo braço, fazendo com que levantasse.

— O que você quer? Precisamos acordar...

— Quero te mostrar algo, agora! Te espero lá fora, na varanda da frente.

— Hein? O quê? Tá, tá bom...

Os sons dos cautelosos passos de Anna foram desaparecendo aos pouquinhos. Ronan vagou pela escuridão. Buscou com o tato o local onde largou o calçado. Abaixou-se, sentiu o couro de uma das botas e a puxou. Ruídos metálicos puderam ser ouvidos vindos da porta da frente, mas ignorou. Encontrou a bota faltante ali perto e calçou-a. Na primeira esticada de braço alcançou o casaco no cabideiro e o vestiu em três movimentos.

Saiu do quarto tateando as paredes, virou à esquerda e seguiu pelo único corredor, onde no fim, a porta da frente fora aberta, destrancada por Anna, ela permanecia de costas a ele, na varanda, com uma mão na cintura e a outra girando o chaveiro de Vitória. Não disse nada, caminhou pelo corredor mal iluminado até alcançá-la. Anna o ouviu se aproximar quando esteve a três passos de distância, então se virou.

— Boa noite príncipe adormecido. — Seu sorriso e olhar cintilaram um instante, agraciados pelo brilho lunar.

Ronan respondeu após um prolongado bocejo:

— Espero que isso valha a pena.

— Isso vai depender de você.

Uma lufada de vento sacudiu o cabelo dela, empurrando as pontas dos fios na altura do ombro.

— Roubando chaves, hein? Estou decepcionado com você — disse ao contorná-la, com o sarcasmo trasbordando sua voz. — Mas o que você queria me mostrar?

Anna apontou para a estradinha indo para o oeste.

— Que tal uma volta nesta noite estrelada? — o sorriso misterioso daquele lábio cativou o rapaz.

Ronan não respondeu de imediato. Caminhou para fora da varanda, cruzou o quintal e parou ao alcançar a estradinha. Permaneceu de costas para ela e disse olhando por detrás do ombro:

— Vamos? — Com as mãos nos bolsos, uma segunda lufada de vento balançou o seu casaco, assim com as felpas da gola.

Anna adiantou-se e o alcançou. Lado a lado começaram a caminhada em direção oeste, onde a lua banhava os campos verdes que se elevavam no horizonte. Os dois caminharam lentamente. Nenhuma cerca ou coisa do tipo acompanhava o trajeto. Conforme passavam, elevações e depressões foram surgindo. A farta grama não falhava, tingia a paisagem de verde sem deixar o marrom aparecer. Pinheiros surgiam e desapareciam, assim como os inúmeros rios e nascentes, tão famosos na região.

RonanOnde histórias criam vida. Descubra agora