46. Aprendiza (Parte V)

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Por seis dias Anna praticou sua manipulação curativa ao lado do primo. Dois pacientes vieram à cabana nesse intervalo. Ambos carregados pelos moradores do vilarejo ao lado. Felizmente, para ela, nenhum deles em estado grave como o da semana anterior. Na cabana, apenas os primos se encontravam. Ronan e Dario saíram em mais uma viagem rumo à cidade, enquanto Vitória partira em outra jornada solo.

Sentados nos degraus de tábuas enegrecidas da varanda da frente, Anna estudava sob a tutela de Victor, que respondia as suas perguntas logo após elas serem verbalizadas.

— Você não demostra tanto medo agora — ele afirmou reposicionando os óculos.

— Eu só não mostro, mas ainda sinto dentro de mim.

— Daqui algumas semanas você se acostuma.

— Tomara — disse jogando o cabelo por detrás do ombro com as costas da mão.

— Tem alguém vindo — ele disse baixinho. — Alguém não, um grupo inteiro.

Anna voltou o olhar para o leste, onde a trilha até o vilarejo estava vazia.

— Prima, do outro lado.

Da estradinha que seguia para o campo aberto, três figuras carregavam uma quarta. Anna levantou-se num sobressalto, o vestido verde que trajava tremulou quando partiu para os fundos da cabana, mas uma mão a impediu.

— Não, Anna! — A voz do primo soou ríspida, o que a preocupou. — Eles não vêm do nosso vilarejo.

— Mas... — Foi interrompida pelo ríspido chiado proferido por Victor.

Os dois permaneceram em pé, aguardando o grupo se aproximar. Quando às figuras tomaram forma, ouviram os gritos de ajuda dos três rapazes que carregavam uma moça, que apesar da distância, aparentava ser jovem.

— Você é o feiticeiro milagroso não é? — perguntou o rapaz de camiseta desbotada. — Precisamos de ajuda, senhor, por favor — suplicou. Anna temeu o que o "não" de seu primo poderia causar naquele sujeito aflito, que persistiu: — Ela foi roubada e esfaqueada essa manhã. Um curandeiro já a consultou, mas não serviu pra nada, meu senhor. Por favor, ajuda a gente. — Então eles viraram a moça de cabelos negros para mostrar a perfuração nas costas.

— É muito grave — constatou Anna apenas pela quantidade de sangue nas roupas.

— Infelizmente vocês estão perdendo tempo. Aqui não tem nenhum feiticeiro milagroso que possa os ajudar. — Victor desceu os degraus da varanda para olhar no olho do rapaz da camisa desbotada. — Quem falou de nós para vocês?

— Uma tia minha que vive no vilarejo. — Apontou para o leste, para o caminho que levava ao vilarejo de Pinheirio. — Ela disse que vocês podem fazer milagres.

— Eu já disse, somos apenas estudantes e não médicos ou curandeiros.

— Por favor, senhor, apenas uma olhada, qualquer coisa ajuda.

O vestido verde e os fios do cabelo de Anna sacudiram quando ela desceu da varanda e se aproximou da conversa. Ela pôs a mão no ombro do primo.

— Nós podemos dar uma olhadinha. — Piscou com o olho oculto para os visitantes.

— Levem-na para dentro, podem deixá-la no sofá da sala. — Victor ordenou. Então aproximou o rosto e sussurrou no ouvido da aprendiza: — Vá e feche a porta dos fundos.

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