Prove!

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Saí, batendo a porta atrás de mim. Sabia que não tinha chance alguma com o Yohensen. Tudo que o tio dele dissera sobre nós, era apenas uma quimera, um desejo dele, talvez um sonho distante meu. Não podia me iludir. Não tinha tempo para fazer papel de trouxa.

Então era isso. Aquela era minha deixa, minha hora de partir. Peguei minhas coisas que estavam na antesala, jogando todos os objetos que havia deixado ali, na mochila que Sara tinha trazido mais cedo.

No quarto em que ele estava, podia ouvir a garota que realmente combinava com ele fazendo planos de futuro. De um futuro com ele. E eu não fazia parte daquilo ali.

Saí de fininho, abri o celular no aplicativo de transporte e solicitei que um carro viesse me buscar. Aquele lugar me sufocava de tal forma, que já não conseguia respirar.

O transporte chegou, dei boa noite ao motorista e pude sorrir aliviada, mas ao sorrir sentir lágrimas quentes e grossas saírem dos meus olhos, rolando bochechas à baixo.

- A senhora está bem? - perguntou o motorista, me olhando pelo retrovisor do carro, com ar de preocupado. - Tem balas no seu lado esquerdo, quando estou triste sempre como um docinho pra me lembrar que a vida é doce e nós é que a complicamos.

Sorri para ele, um sorriso sincero. Era um senhor de cinquenta e poucos anos de idade, ainda bonito, mas marcado pela vida, notei que seu sotaque era familiar, um falar cantado e alegre que fez eu me lembrar da minha terra.

Saudades de lá, não de pessoas, mas da região, dos lugares, da receptividade do povo em geral. Eu seria feliz lá, se não fosse pelo meu passado sombrio ao lado da minha família.

E nessa hora senti a raiva que nunca senti em minha vida, e era um sentimento horroroso que jamais gostaria de sentir novamente. A partir de hoje não sentiria mais nada por ninguém e muito menos raiva, nem ilusão e amor por pessoas que não mereciam.

A viagem foi rápida, agradeci pela gentileza e segui meu caminho até minha casa.

Sara não estava em casa, entrei em meu quarto, tirei a roupa, entrei no chuveiro e liguei no modo quente. Sentei no chão e desejei o que não podia ter.

Depois, fiz um sanduíche, e o levei para o quarto, comecei a revisar mais uma vez o que já havia estudado antes, e me deitei para dormir, estava tão exausta que em questão de segundos adormeci.

Realmente precisava descansar o máximo que conseguisse, afinal amanhã começaria o caminho para mais uma etapa a ser vencida por mim em busca da minha carreira tão sonhada.

Na bancada da cozinha, o celular tocava sem parar. Mas isso só serviu para embalar meu sono.

Dormi quase por 24 horas, quando acordei, encontrei Sara ao pé da cama junto a mim, tentando sentir minha respiração com os dedos.

Ao abrir os olhos e sorrir para ela, seu semblante mudou de preocupação para alegria.

- Pensei que estava morta, não se mexia! Dia difícil? - para ela não podia mentir, pois me conhecia tão bem como a palma da minha mão.

- É. Coisas que não deveriam deixar acontecer e aconteceram, mas no meu íntimo, minha consciência sempre me falou que eu era burra se deixasse passar e agora Sá, estou completamente apaixonada pelo meu chefe. Mas sei que é um jogo, jogado apenas por um. - disse com muito pesar no coração.

- Ô minha amiga, pensei que ele sentisse algo por você, não é comum a preocupação e cuidado que ele demonstra ter contigo...

Então a cortei, pois não criaria nenhuma expectativa em relação a ele, porque a realidade era muito diferente.

- Ele me trata assim por posse. Não sou o brinquedo dele. A partir de hoje terei um relacionamento estritamente profissional. Não quero nem sua amizade, pois ela me deixa triste e me lembra das coisas que nunca poderei ter ou viver. Olha para mim! - Sara me olhou complacente. Não sério! Olha para mim - disse apontando as mãos em direção ao meu corpo. Não tenho nada a ver com aquele cara, não sou tão bela, não tenho a magreza das mulheres que ele procura, não tenho onde cair morta, porque tudo aqui é graças a ele! E agora olhe para ele! Não tem combinação perfeita, não há match. Eu não entendo o que ele quer, mas com certeza isso não é amor.

- Você é linda minha amiga! Ele é louco se não a enxergar! Linda por dentro e por fora. Agora deixe de besteira e vá se arrumar, pois você tem o mundo para conquistar com a sua inteligência, talvez ele tenha se apaixonado por seu jeito de ser.

Após uma conversa esclarecedora com Sara, fiz um lanche e fui fazer a prova. Estava saindo de casa quando vi um carro muito bonito parado em minha frente.

E encostado ao carro lá estava o Yohensen, muito lindo, de camisa gola polo esporte preta, calça jeans lavado, rasgado, óculos escuros e sorrindo. Como não ser amiga desse deus grego, e como não ficar confusa com as atitudes dele? É algo muito mais forte que eu...

Do meu estômago, sentia as borboletas passearem, dando voltas e voltas, me fazendo sentir cócegas, meu coração acelerou e pensei que de onde ele estava poderia ouvir as batidas, de tão forte que batia, faltou ar, ruborizei.

E foi respirando fundo que consegui soltar um oi que mais parecia um grunhido. E me besliscava mentalmente para parar de ser trouxa, mas meu corpo fazia exatamente o oposto do que meu cérebro, minha consciência era um ser à parte, que não  me pertencia naquele momento, estava frenética. A vida seria muito mais simples e feliz, mas, me lembrei que ele é meu chefe e que de quebra ainda tem uma lombriga vestida de modelo como sua namorada.

Não sei porque Deus foi inventar a consciência, porque a minha vontade era pular em cima dele, jogá-lo dentro do carro e só Ele mesmo saberia o que aconteceu.

- Oi - tentei mais uma vez, pigarreando para a voz sair direito desta vez, acho que funcionou, porque ele sorriu mais ainda.

- Vim lhe dar uma carona... Vai que acontece alguma coisa e você se atrasa para as provas... Não gostaria de ver esse rostinho tão bonito fazendo capa dos jornais como " Os atrasados do Enem". - disse em tom dramático.

- Sério Yohensen que você está fazendo piada. O que está fazendo aqui? - disse tentando ser o mais imparcial possível, mas falhava miseravelmente.

- Não gostou de me ver?! - riu ainda mais.

- Não é isso, deveria estar em repouso ok? Não tem obrigação comigo, não se preocupe, eu sei me virar, mas obrigada pela preocupação. - Falei virando-lhes as costas.

Não o olhei nos olhos, apenas virei e saí, mas pude perceber a cara de besta que ele fez. E mentalmente fiz a dancinha da vitória e consegui imaginar o placar imaginário em minha cabeça reluzindo em letras gigantes e brilhantes:

SANDRA X YOHENSEN
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Mas esse sentimento durou pouco.

- Até quando vai se negar o direito de me amar? - sério que eu ouvi isso?

- O quê? - minha cara era de total espanto.

Tá bom eu o amava, mas até então ele não precisaria saber disso.

- E quem disse que eu te amo?! Você é meu chefe, lhe devo muito por ter me ajudado de diversas formas, e tento retribuir com o meu melhor profissionalmente, mas não passa disso. Quero apenas sua amizade. - Gostaria de não ter dito isso pois, no mesmo instante seu semblante mudou.

Ele se aproximou como um tigre, com passos calculados e lentamente me virou e me fez olhar em seus olhos, que estavam escuros e sombrios.

- Então me prove!

AMOR PARA RECOMEÇAR (COMPLETO) Onde histórias criam vida. Descubra agora