Capítulo 45

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-Como puderam fazer isso?! -pergunto gritando, quase arrombando as portas do escritório do rei do rei- Vocês não tinham esse direito!
-Eu sou o rei, eu tenho o direito de fazer o que eu quiser! -rei Marc responde.
-Elas não tiveram nada a ver com a minha fuga! Eram boas criadas e nunca trataram você com menos do que respeito, Majestade! Você pode readimiti-las ou eu posso fazer da sua vida um verdadeiro inferno!
-Mais do que você já faz diariamente? -Blake comenta do outro lado da sala. O ignoro, melhor do que encará-lo.
-Elas nunca fizeram nada além do seu trabalho. O senhor tem que considerar o que estou pedindo.
-Sinto muito, mas a decisão já foi tomada. E além do mais, você está proibida de jantar na cozinha com os criados, vai jantar junto com a família real, onde é seu lugar. E isso é uma ordem. -ele fala balançando a mão como se estivesse expulsando um inseto.
-Como pode ser tão frio e hipócrita? -pergunto.
-É o que um rei foi criado para ser. -Blake responde no lugar do pai.
-Então seu pai lhe criou muito bem! -falo olhando para o rei- E está fazendo um ótimo trabalho com seu filho!
-Para o seu quarto, Hallen! -diz Blake- E isso é uma ordem.
Tento resistir o máximo que posso. Passam cinco segundos antes que meus ossos comecem a queimar. Aguento trancando a respiração. Até não aguentar mais e ir embora com um suspiro.
Meu guarda, que estava se recuperando de minha correria ali fora me vê e já respira fundo para outra rodada. Mas ando bem devagar, dando tempo para ele se recuperar.
Fico no meu quarto lendo. Aproveito e tiro o vestido. Coloco apenas o suéter da minha mãe e depois de terminar um livro, vou para janela desenhar. Preciso fazer algo sobre Mary, Louise e Chloe. Isso não vai ficar assim. Pego meus horários com a rainha. Me parece que amanhã vamos ter uma visita no Reino. Será que consigo fazer algo até lá? Visto algo rápido e chamo Billy.
-Billy, você poderia chamar Vossa Alteza, Anthony aqui? Pode me trancar no quarto se quiser, não vou sair, prometo. -peço fazendo bico.
Ele assente com a cabeça e sai.
Não demora muito até Anthony aparecer. Assim que ele chega, vou rápido para perto dele e olho bem em seus olhos. Não é o Blake.
-O que é isso? -ele pergunta quase assustado.
-Desculpa, seu irmão anda usando lentes de contato, tentando se passar por você. O que eu vou te pedir agora não pode sair daqui, entendido? -falo rápido.
-Ok, agora eu fiquei assustado! -ele diz, fechando a porta atrás de si- O que aconteceu com seu braço.
-Me machuquei no treino. -minto com tanta facilidade que sinto nojo de mim mesma. Mas ignoro e sigo com meu plano- O que vocês chamam de dinheiro aqui?
-É um pedaço de papel muito similar ao dinheiro que vocês tem na Terra, mas nós chamamos de Celeste. Por que quer saber disso?
-Quão rico meu condado é? -continuo fazendo perguntas.
-Muito, só não tão rico quanto KingsCounty. -reviro os olhos- De novo, por que quer saber disso?
-Eu tenho acesso a esse dinheiro? -ignoro as perguntas dele, primeiro preciso saber as respostas para as minhas perguntas.
-Ben cuida das economias de QueensCounty, que passarão pra você quando se tornar rainha, mas eu duvido que alguém negaria esse dinheiro à você. Por que?
-Eu vou precisar de um pouco desse dinheiro, consegue arranjar para mim?
-Pra que, Millena Hallen? -ele pergunta insistente.
-Seu irmão e seu pai despediram três criadas ótimas por nada. Eu vou dar uma ajudinha à elas. E um trabalho em QueensCounty quando eu me tornar rainha.
-Ok. Quanto? -ele pergunta.
-Muito, e pra amanhã, com o endereço de cada uma delas! Pode fazer? -pergunto esperançosa.
-Sim. Mas vai precisar fazer uma coisa pra mim em troca.
-É só falar. -falo com um sorriso.
-Precisa falar com meu irmão. Agora. -meu sorriso desaparece na hora- Ele está voltando a ser como era antes de você chegar. Não faz mais nada além de resolver problemas do Reino. Se não vão fazer as pazes, pelo menos converse com ele.
-Esse é o único jeito de você me ajudar? -pergunto na esperança que ele tenha piedade.
-Sim. Eu sinto muito.
-Ok. Eu só vou trocar de roupa. Não posso sair do quarto sem vestido, se não meus órgãos começam a... você sabe, queimar e derreterem até eu virar molho de Hallen Perdida.
-Vou estar esperando aqui. -ele fala enquanto eu vou para o closet procurar um vestido.
Coloquei um vestido todo preto, de manga cumprida para evitar perguntas sobre meu braço enfaixado.
Ele é comprido e tem uma saia estufada e brilhante. A parte de cima é apertada e tem brilho em algumas partes. Saio do quarto com o estômago revirado. Pretendia adiar esse conversa até o dia da minha morte, mas as circunstâncias não estão a meu favor ultimamente.
-Acredite ou não esse foi o vestido mais simples que eu encontrei. -falo passando por Anthony em direção à porta.
Ele ri enquanto me acompanha para fora do quarto. Os guardas só me deixam passar porque estou com Anthony. Sinto vontade de vomitar quando paro em frente à porta do Blake.
-Tem certeza que ele está ali dentro? Acho melhor eu voltar amanhã, já está tarde! -tento fugir, mas Anthony me segura.
-Entra no quarto e eu arranjo o dinheiro e dou um jeito de distrair minha mãe e levar você na casa das três. Vai entrar ou não?
-Manda um beijo pro Noah? -pergunto com a mão levantada pra bater na porta. Ele ri e assente. Bato na porta.- Era pra mim bater, eu não preciso ser anunciada ou algo assim? Era assim nos filmes.
Olho para o lado e Anthony já tinha sumido. Eu acho que vou vomitar. Olho para frente e Blake me encara sem expressão alguma. Sinto falta até da carranca dele. Qualquer coisa é melhor que esse robô.
-Hallen?
-Posso entrar? -engulo em seco diante do modo como ele me chama. E eu nem tenho uma desculpa para estar ali! Pensa Millena!- Preciso tirar uma dúvida com você sobre uma poção. O professor que você arranjou para mim é horrível, até eu sei mais que ele.
-Não fui eu quem escolheu o professor. -magoou um pouco saber que ele não se preocupou em me deixar em boas mãos- Tenho certeza que vai descobrir sozinha.
-Vossa Alteza, por favor. -Essa foi a primeira vez que não o chamei de vossa Alteza com ironia. Ele contorce um pouco a boca, a única reação diante do seu título dito por mim- Por favor.
Ele entra no quarto e deixa a porta aberta. Fico dividida entre entrar ou sair correndo.
-Vossa Alteza, eu realmente não entendi se devo entrar ou ficar aqui fora. -falo quase gritando. Sem ter certeza do quão longe ele está para me ouvir.- Além do mais, sua mãe me hipinotizou para ficar longe do seu quarto, receio que se eu entrar eu vou... derreter no seu chão. Dizem que sangue mancha e eu realmente odiaria estragar seu carpete.
-Entre! -ele diz sem emoção e meu corpo obedece imediatamente.
Fecho a porta atrás de mim e entro com cautela. Está do jeito que eu lembro. Há uma quantidade maior de papéis na mesa, mas tudo parece igual.
Olho para cima, minha pintura ainda está lá. As estrelas.
-Então, qual sua pergunta? -ele pergunta passando por mim e parando atrás de mim.
Não ouso me mexer e mantenho as mãos juntas atrás das costas, para tentar disfarçar que estou tremendo.
Respiro fundo pensando em alguma pergunta.
-Eu... Eu queria saber o que acontece quando misturamos uma fruta da Terra com uma fruta celestial e uma obscura. E também, seria possível fazer um fruta mestiça, tipo plantar uma semente de cada tipo juntas, ou fundir as sementes.
-Já tentamos. Sementes celestiais e sementes obscuras nunca se fudem. Elas acabam matando uma a outra. E não acontece nada quando se mistura fruta terrestre em meio a poções mas ela também acaba sucumbindo e matando as outras quando é fundida com outras sementes. Era só isso?
-Não. Eu só inventei essas perguntas pra você me deixar entrar. Eu vim aqui pra conversar. -falo engolindo em seco.
-Está na hora de você ir embora.
-Por favor.
-Você não deveria estar aqui. -ele insiste.
-Se você me deixar falar, eu nunca mais vou incomodar você. Não vou mais te procurar ou dirigir a palavra à você se não for extremamente necessário, eu prometo. Só me deixa falar. -olho para ele.
Ele assente, me dando a palavra. Me aproximo um pouco dele, mantendo uma distância segura. Respiro fundo.
-Eu sei que o que eu fiz com você foi horrível, e eu sinto muito. Não por ter fugido, mas por ter te magoado no processo. Não precisa se preocupar, eu não vim aqui pra pedir desculpas. Eu sei que talvez você nunca me perdoe pelo que eu fiz, e por mais que doa, eu posso viver com isso.
Afasto uma lágrima e continuo.
"Eu vim aqui pedir que, não deixe a minha decisão transformar você em alguém frio e calculista. Não afaste as pessoas que você ama e que te amam porque eu não soube valorizar o seu amor. Não se torne o cara que não se importa porque eu sei que você se importa. Se importa com cada pessoa dessa dimensão e cada pessoa fora dessa dimensão também. E é isso que vai fazer de você o melhor rei que qualquer outra dimensão já viu.
Não seja o cara fechado, carrancudo e insensível que as pessoas esperam que você seja. Seja o cara que sorri de alguma piada idiota. Que ajuda e conversa com a mãe. Que brinca com seus irmãos. Seja o cara que se importa o bastante para arriscar tudo só para ver um sorriso no rosto de quem ama. O cara que se importa e faz a diferença. Seja o cara por quem eu me apaixonei."
Ele fica me encarando, sem expressão. Até que ele finalmente diz:
-Está tarde. Você tem que ir.
Respiro fundo e assinto, limpando as lágrimas.
-Sim, Vossa Alteza. -passo por ele fazendo uma reverência, mas antes de sair do quarto, me viro para dizer:
-No canto direito da estante, quinta fileira contando de baixo pra cima. Tem um interruptor que vai acionar as luzes ultravioleta. Acione se quiser ler o que está escrito nas estrelas.
Saio do quarto andar. Saio do Palácio, vou direto para os jardins, onde ninguém vai me incomodar. Vou até o lago. Sento, sentindo todos os meus órgãos pesarem. Choro o quanto eu posso, sem me preocupar se alguém vai ouvir. Estou bem longe.
Minha cabeça começa a doer e eu me deito na grama. Adormeço antes mesmo de pensar que tenho que voltar.

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