Chego no apartamento de Bianca ofegante, o pé um pouco dolorido. Assim que ela abre a porta, vou sentar no sofá para descansar.

Ela me trás um copo de água e depois se senta ao meu lado me chamando de louca por subir escadas com o pé todo danado. Caíque vem correndo ate a mim me dá um abraço, mas logo volta para o quarto pulando animado dizendo que vai dormir com o pai.

- Gabriel vai vim levar ele. Diz que vão jogar vídeo game. Coisa de garotos! - a loira explica. - Ele queria dormir aqui, mas eu não quis. Na verdade, querer eu quero, mas acho melhor não. Quero ir devagar.

- Eu não te entendo. - falo colocando o copo no chão. - Ir devagar? Você já tem dois filhos com ele. Não tem mais nada devagar aí. Tem é você deixar de ser fresca. Toda vida foi fresca, nada está bom para você. Sempre quer mais, sempre insatisfeita com tudo. Menos em cozinhar. - Rio levemente me lembrando de todas as vezes que minha amiga traiu Gabriel e perdoou as traições dele também, todas as vezes que ela surtou com ele e ele foi atrás. - Você são tóxicos.

- É que eu ando descobrindo que não tem como saber o que quero, se eu não sei quem eu sou. Quero me descobri, quero estar bem comigo e ter um bom relacionamento. Não quero que seja como antes, eu amo o Gabriel demais para suportar nossas infantilidades.

Encaro os olhos verdes da loira. Sinceros e brilhantes, ela parecia triunfante. Bianca tinha razão.

- Nossa história é sobre isso, amiga. - concordo. - No final somos duas vadias iguais.

Ela se levanta do sofá. - Eu quero fazer isso pela minha filha, não quero que ela veja o mesmo que Caíque. E também nao quero que Caíque continue assim...  Eu tava vendo vídeos na Internet sobre psicologia, nossos pais ferram a gente. Eu não quero meus filhos ferrados, eu quero que eles tenham autoestima, se sintam amados, que saibam amar...

Eu encaro o chão pensando sobre o que minha amiga. Além de trocar fraldas, ouvir choros, gastar meu dinheiro, vou ter que dá certo no amor? Eu acho que não entendi esse conceito.

Filhos dão trabalho. Já estão me dando.

Estou a meses vomitando horrores. O médico mandou eu tomar um monte de vitamina, ficar de repouso, comer bem e eu nem vou poder malhar mais, pois eu cai da escada grávida.

Nem vou poder beber, pois grávidas não podem se embriagar. Não pode isso e aquilo pra manter outra pessoa viva. E eu nem sei se quero isso.

- Você não vai fazer o exame pra saber o sexo do seu bebê?

- Já dá pra saber?

Bianca olha pra mim sorrindo enquanto cortava um melão em cubinhos na cozinha.

- Dá sim. Existe um exame que se chama sexagem fetal. Você pode fazer. - ela responde já guardando o pote. - Vou trocar de roupa para irmos ao mercado, aqui em casa tá sem nada.

Ela se apressa em ir para o quarto dela. Logo aparece com um vestido num tom verde, rasteirinha e uma bolsinha de lado.

Me levanto e juntas vamos descendo as escadas devagar para esperamos o carro do aplicativo na rua.

Depois de longos minutos e um pé latejando, chegamos no terreo.

- Qual vai ser o nome da sua neném? - pergunto curiosa.

- Isis.

Encosto no poste de luz pra descansar o corpo. Eu preciso recuperar esse pé logo.

- Bacana. Gostei!

Daí Bianca engata num outro assunto sobre o trabalho e sim, o pessoal lá costuma ser um pé no saco. Mas qual empresa não é assim?

Sempre tem uns pra encher o saco e fazer a gente querer perder o réu primeiro.

Já no supermercado compro todas as besteiras que tive vontade de comer, mas também comprei coisas saudades. Minha amiga me convenceu a comprar umas fraldas na promoção para meu bebê, logicamente achei ruim. Por isso me pus a reclamar durante a volta pra casa.

- É um absurdo. Já não basta os remédios lá que o médico mandou tomar, esse tal de sexagem pra fazer, tenho que comprar as fraldas? - questiono dentro do uber. - Você nao acha um absurdo moço? - pergunto ao motorista.

Ele apenas me olha através do retrovisor, mas não diz nada.  Bianca apenas dá um suspiro irritado, entretanto também fica quieta e logo muda de assunto para um sobre o trabalho e falava com empolgação sobre um dia começar a trabalhar com confeitaria para ela mesma.

- Conversei com meu pai e ele me emprestará um dinheiro. Vai colocar um dos meus cookies para vender lá na lanchonete dele, estou confiante! Se dê certo, quero mexer com isso.

- Você é muito boa com os doces. Aprendi a fazer personalizados também. Daí você pode fazer um kit festa completo, onde compraram tudo com você, doces e os papéis personalizados.

Ela me encara com os olhos brilhando, estava confiante.

Nunca imaginaria que estaríamos as duas grávidas, discutindo sobre fraldas e depois negócios. Eu achava que seriamos piranhas a vida toda, só me esqueci de que piranhas choram, amam, trabalham e se sustentam... ah, claro, também podem ser mães.

A vida não é uma eterna farra. Me pego pensando muito sobre a fala de Bianca sobre o amor. Talvez eu senti tanta falta de me sentir realmente amada que passei anos arrotando arrogância, orgulho, andando por aí como se fosse muito querida, mas eu sabia que era mentira.

Sexo não é amor. É só sexo. Ser desejada não é amor, é só desejo.

Gentileza não é amor, é só Gentileza.

São tantas regras e coisinhas ali e aqui para se relacionar, que ninguém de fato vive um amor. Ou vive?

Carlos investiu muito dinheiro em mim, qual valor tive para ele?

Nunca fui muito fácil para Felipe, pois os caras não gostam das boazinhas. Ele demorou anos para me assumir e me faz de uma eterna amantes.

Outros me deram apenas orgasmos.

Foram tantos os passos dessa coreografia que dancei.

Agora estou aqui com minha amiga grávida, já do segundo filho, ouvindo falar sobre mêsversario e é provável que terei de fazer isso para meu filho também.

Foram tantos passos nessa valsa, que me confundi. Eu me perdi.

Eu não gosto de valsa.

Nem do tango.

Nem do forró.

Então o que estou fazendo? O que fiz durante todo esse tempo?

Qual balada romantica dançarei agora?

Me EsperaOnde histórias criam vida. Descubra agora