Cap 14 - O capítulo do todas deixavam ela entrar

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O sol brilhava como todo um imperador. A luminosidade batia em seu rosto deixando sua pele mais branca. Parecia que não voltava a sua cidade natal há muito tempo. Sua roupa era de frio e o casaco de couro preto contrastava ainda mais com o tom de sua pele. Seu cabelo castanho longo e liso estava preso em um rabo de cavalo. Seus fios deslizavam sobre seus ombros e pareciam um pouco mais claros pela luz que batia neles. Os lábios rosados denunciavam a presença do brilho labial que passara a pouco, e mais para cima, a parte de seu corpo que mais chamava a atenção faiscava. Seus olhos eram de um verde difícil de se encontrar por aí. Para ser bem sincera, nunca havia visto algum nem mesmo parecido. Não poderia nem comparar a algo na natureza que eu tenha visto. Eles eram indescritíveis e demonstravam uma despreocupação com o mundo a seu redor que me instigou. Entretanto, o ambiente em que estava, no banco do motorista de um carro que aparentemente era seu, a deixava com um ar de dominadora, de dona. Ela era fatal.

Eu ainda não conseguia parar de olhar para a foto. Ela é o tipo de pessoa que você pediria uma carona para ir embora da faculdade. Parece ser aquela amiga meio certinha e super responsável. Eu, por um exemplo, não pegaria carona com Marielle mas nem pagando. Tenho medo de onde ela possa me levar, ou melhor dizendo, de qual enrascada me meteria. Mas Lauren parece o tipo de pessoa que não deixa a gente entrar com comida no carro. Bom, ninguém é perfeito né? Mas para tudo na vida há uma solução. Luciano Huck quem o diga… “Vou de taxi, cê sabe…”. Ele sabe bem, mas duvido que tenha se recusado a ter um saquinho de bolacha Bauducco aberto no carro. Duvido também que não tenha pedido um… só para experimentar.

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Acordei com o barulho da chuva na janela. Não gosto de chuva. Me julgue. A chuva me prende em casa. É mais difícil sair de um McDonalds comendo um sorvete de casquinha enquanto vai pra casa. Casquinha em uma mão, guarda chuva na outra, bolsa no ombro propensa a cair do casaquinho fino. Ser mulher não é nada fácil. E o que é ainda pior: lidar com a umidade. Um exemplo? Semana passada… meu cabelo estava lindo naquela segunda-feira a noite e até dormi tarde pensando que depois da meia noite o efeito Cinderella passaria. Não passou. Me deitei, dormi e quando acordei no dia seguinte constatei que o efeito Disney do cabelo, mesmo não sendo o Cinderella, continuava prevalecendo. Acordei parecendo o Mufasa.

Tomei meu banho correndo, comi correndo e fui correndo para a faculdade. Sentei na minha cadeira habitual quando o professor deixou sua pasta na mesa e abriu o primeiro slide da aula no computador. Comenius, filósofo tcheco que… é impossível eu não me lembrar da maldita música do Rick & Renner. Não sei porque sempre tive interesse em canais brasileiros.

Ah, se vocês não sabem qual é a música do Rick & Renner que eu me refiro. Sorte de vocês!

Olhei meu celular e automaticamente a tela do WhatsApp com a foto dela apareceu. Me perdi outra vez naqueles olhos. Me fez lembrar de outra música. “Me hipnotizas...hay algo en tus ojos que amo”. Não que eu amasse algo naqueles olhos, mas eles me perturbavam. Não de maneira ruim, ao contrário… era instigante, era hipnotizante. Não pude também deixar de verificar a hora da última vez que ela havia aberto o aplicativo. 7hr42min. Não era pra mim, mas eu gostaria que fosse. Gostaria de mandar uma mensagem de bom dia pra ela.

Mando ou não mando?

Ok, não vou mandar. Ela vai achar que eu sou uma criança carente querendo atenção o tempo todo. Se ela falar comigo eu respondo. Ela deve estar trabalhando, estudando, arrumando a casa… eu nem sei como ela está encontrando um tempo para me conhecer.

A manhã passou rápido até. Saímos da faculdade (lê-se com Marielle e Sandra) ainda com chuva. Já estava abrindo meu guarda chuva quando escutei uma buzina que me chamou a atenção. Olhei para a única brecha que havia entre estudantes e a rua e vi Phillip com o corpo esticado me procurando na multidão.

Mila, quer uma carona? Venham também meninas!

Não precisa, sua casa fica para o outro lado… - Sorri meio sem graça. Não era nem pelos sentimentos que ele nutria por mim no passado, e sim por não querer incomodá-lo. Não se enganem. -

Aceita Mila, olha essa chuva. Eu não quero que outro carro me dê outro banho de lama como aquela vez… - Marielle sussurrou. -

Mas não será um problema levar vocês. Entrem. - Phillip abriu a porta do carro por dentro e bom, fui né. Ele então levou as meninas primeiro e depois a mim. -

Mila, antes de você ir, posso te perguntar uma coisa?

Claro! - Meu claro foi mais estremecido do que se estivesse dentro de uma máquina de lavar. -

Um primo meu de 4 anos está com uma certa dificuldade em se adaptar no colégio. Você é a única pessoa que eu conheço que poderia de repente ajudar. - Então, ta aí um algo que me deixa totalmente desconfortável e ninguém sabe. Vou contar. Enter *click*

Desde que comecei a faculdade, ou seja, ano passado, minha mãe sempre falou em buscar um estágio. Eu sempre concordei, é claro, mas também não poderia entrar em um estágio no primeiro semestre da faculdade onde ainda estou aprendendo a história da Pedagogia. As crianças não vão querer saber disso. Nem eu mesma que sou adulta tenho tanto interesse. Quero mesmo ir para a parte prática. Sim, eu sei que preciso do embasamento teórico para entender a prática e seus princípios. Pois bem… eu acho que enquanto eu não souber pelo menos como começar a “botar a mão na massa” mesmo, não conseguirei desempenhar o mínimo do que eu devo desempenhar para qualquerr trabalho. E é por isso que venho enrolando a minha mãe quanto a história do buscar estágio.

Eu não me sinto preparada ainda, a menos que seja pra me vestir de Patatí ou Patatá na frente das crianças e cantar as músicas que eu gostava quando era pequena. Menos É o Tchan. Na minha época, a dancinha da garrafa não era nem um pouco maliciosa e a loira do Tchan era linda e todas deixavam ela entrar.

Hoje em dia, a Dancinha da Garrafa e Maionese (ele me bate, bate feito maionese) seriam músicas inescutáveis (isso existe?) pelas crianças devido ao alto grau de maliciosidade precoce que elas tem já em fase de crescimento. A Dança da Vassoura do Molejão seria trabalho infantil. E o que falar de Atirei o Pau no Gato? Essa mesmo já foi proibida de se cantar nas escolas porque assim as criancinhas iriam atirar o pau no gato. Entendido que o meu perfeccionismo me bloqueia de certa forma, não é?

Bom, eu não sei se saberia lidar muito com o assunto porque ainda não nos foi aprofundado isso. Poderei me informar, se você quiser.

- Claro! Por favor! - Me despedi dele agradecendo a carona e entrei em casa correndo me desviando das pequenas poças do caminho. -

Passei minha tarde fazendo trabalhos de faculdade, elaborando planos educacionais, metas e outras coisas. Até me esqueci um pouco do celular e de me perguntar se ela falaria comigo hoje. É só aquela vontade instigante de querer saber mais dela, o que está fazendo… e eu deveria parar de pensar nisso. Quanto mais nervosa eu fico, mais nervosa ficarei falando com ela e sendo assim eu poderia imaginar já o quão patético seria meu comportamento.

Trabalhei horas em uma cartolina cheia de colagens. Parecia Picasso em seus tempos modernos. Escuto o som do celular. SMS.

[18:36] Lauren Jauregui: Oi Camz! :)

Quando cliquei no teclado para responder meu celular apagou.

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