Capítulo 37

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Passei a próxima semana inteira praticamente discutindo os planos pra o arranjo dos efeitos especiais do festival cultural.
Por nenhum motivo aparente, assim que eu cheguei com a planta dos arranjos, os meninos me colocaram como líder do projeto e, como eu ainda não conseguia me virar bem sem a cadeira de rodas, eu ficava observando eles arrumarem tudo do chão enquanto gritava pra eles o que fazer.
- Kirishima tenta deixar o gelo mais fino!- digo e inclino a cabeça mais pra trás pra tentar ve-lo fazer isso enquanto estava apoiado em um andaime que instalamos - Ótimo! Só tenta deixar mais longe dos pássaros do Koda!
- Você é mesmo uma boa líder- disse uma voz atrás de mim e me virei pra ver o Sero com uma caixa cheia de fitas coloridas nas mãos.
- Obrigada, mas foram vocês que me colocaram nessa posição.
- Por isso mesmo!- gritou Kirishima lá de cima e eu dei risada.
Estávamos fazendo os últimos ajustes pro festival naquele momento, então o palco  já estava arrumado, assim como o equipamento de som e os figurinos.
- Tá todo mundo pronto?- pergunto guiando a cadeira pra onde a Mina e os outros estavam ensaiando a parte da dança.
- Sim! Só falta o Midorya chegar com a corda!- minha amiga me respondeu com um sorriso largo. Estava claro que ela estava adorando fazer aquilo.
- Vou conferir o pessoal da música e vou tentar ligar pra ele- digo e guio a cadeira de rodas até os dormitórios, onde a banda estava arrumando os equipamentos.
- Anami!- disse Momo e acenou pra mim enquanto desmontava o teclado - Já acabamos por aqui. Só temos que levar os instrumentos pra lá.
- Tudo bem, eu pedi pro Souji vir ajudar vocês, ele estava atrás de mim - falei e franzi a testa ao encarar a sala ao redor - Eu vou ver uma coisa e eu já alcanço vocês.
Ao ver a Jiro, o Kaminari, a Momo e o Tovoyami ali eu primeiro pensei que o Bakugo devia estar desmontando a bateria em outro lugar. Mas aí eu vi que a Luna também não estava ali, então eu decidi ir atrás deles e dar uma de penetra pela terceira vez. Eu não sabia, realmente, como aqueles dois ainda não tinham me matado.
Como eu imaginei ouvi o som de duas pessoas cantando vindo do quarto da Luna, e consegui identificar a voz dos dois mesmo com a porta fechada.
Sorri comigo mesma. Pra mim era óbvio que havia algo entre os dois, mas que nenhum deles ia admitir isso tão cedo.
Me aproximei e dessa vez decidi bater na porta. Assim que eles me ouviram, as vozes pararam e ouve um momento de silêncio seguido por um baque antes da Luna abrir a porta do quarto.
- Anami!- ela exclamou surpresa e meio assustada. Então ela franziu a testa e sua voz ficou irritada - Anami!! O que você está...?!
- Já estão todos no ginásio eu só vim chamar vocês...- inclino a cabeça pra ver dentro do quarto e enxergar o Bakugo em baixo da cama dela. Segurei uma risadinha e continuei a frase- ...vocês dois.
Então eu virei a cadeira de rodas e agradeci silenciosamente a velocidade que aquilo me conferia pra sair dali e evitar conversar com os dois.

Eu acabei ficando atrás da cortina o show inteiro, porque a plateia iria me engolir e eu não queria subir no palco por não precisar e simplesmente porque minha timidez me dizia que era uma má ideia.
Senti uma onda de orgulho me invadir quando minha amiga começou a tocar. Todos eles estavam ótimos, mas esse talento era algo que a Luna não gostava de contar pra muita gente. E agora ela estava brilhando como uma estrela.
Também me enchi de emoção ao localizar a Eri na plateia, apoiada nos ombros do Mirio, sorrindo e encarando tudo com os olhos brilhando, encantada com cada som, brilho e nota que a alcançava.
Então eu fiquei ali me divertindo e assistindo aos meus amigos fazerem uma coisa que era simplesmente incrível sem ser lutar contra vilões. Afinal, nós éramos heróis, mas ainda continuávamos sendo humanos.

Quando o show acabou e estávamos limpando tudo, eu insisti em ficar um pouco mais pra ajudar antes de ir pra casa assombrada da classe C.
Mas assim que o Kirishima me viu trabalhando, ele pegou a caixa que eu estava carregando e sorriu pra mim.
- Pode deixar isso com a gente Annie! Você ainda não está totalmente recuperada, então vai relaxar um pouco no festival você também.
- Mas, Ejiro...- começo a dizer mas então o Midorya me interrompe.
- Ele tem razão. De todos nós você é a que está  em estado pior.
- Vai dar uma volta por aí - completou Kaminari chegando por trás de mim e virando minha cadeira de rodas na outra direção- Esse é o nosso agradecimento por você ter conseguido organizar todos nós mesmo estando ferida.
Olhei pra eles três, que sorriam pra mim e continuavam a me instigar a ir com o olhar. Por fim eu dei risada e cedi.
- Tá legal, vejo vocês mais tarde.
Então eu fui até o stand by da casa mal assombrada, onde três alunas da classe C me esperavam com um vestido roxo e um monte de pó branco e sangue falso.
- Você chegou! Por um instante eu pensei que o Shinsou tivesse nos enganado- disse uma delas começando a arrumar meu cabelo assim que eu cheguei.
- Deixa ela. Ela já está nos fazendo um favor e eu não fazia ideia que...- outra começou a dizer e me olhou de cima a baixo preocupada.
Eu sorri pra elas.
- Tudo bem. Me desculpe ter atrasado- peguei o vestido e comecei a me trocar meio desajeitada - Não precisam se preocupar comigo eu estou bem.
Depois de uns quinze minutos me arrumando eu estava igualzinha eu tinha planejado: uma garota fantasma num vestido de baile.
A turma C construiu um salão de jantar que só podia ser acessado pelo camarim, mas que podia ser visto de uma sacada no segundo andar da casa. Assim que eu cheguei lá, fechei os olhos e chamei os espíritos que eu já tinha planejado chamar. Eram todos falecidos de um baile de máscaras em um ataque de gás na segunda guerra mundial, então eram todos jovens animados, mas com os rostos deformados e esqueléticos. Sempre que eu os chamava pra pedir ajuda, eles me perguntavam se poderiam dançar em um salão uma última vez, então eu tomei aquele momento pra dar essa recompensa a eles por terem me ajudado antes.
Um garoto da classe C tocava um órgão do outro lado da sala, e os espíritos rodopiavam espalhados em pares pelo ar. Alguns até mesmo dançavam no teto e eu autorizei que convidassem aqueles que entrassem na casa pra dançar de uma forma meio macabra.
Eu estava vestida apenas pra não distoar do cenário, mas eu fiquei apenas os observando e os mantendo visíveis a maior parte do tempo.
Então eu senti uma mão sólida em meu ombro e me virei pra ver o Shinsou sorrindo atrás de mim. Ele usava um smoking preto manchado de sangue falso e tinha várias cicatrizes pintadas no rosto pálido. O cabelo roxo estava arrepiado mais que o normal o que conferia a ele um visual de fantasma de musical.
- Quando você pediu um salão eu não imaginava que fosse pra isso - ele ficou observando quando uma garota de um grito assustado e seguiu correndo pelos corredores da casa quando um fantasma veio falar com ela. Hitoshi deu uma risada- Ficou esplêndido.
- Não tem de que- respondo e então me volto pra ele - Você não tem medo disso?
Ele da de ombros.
- Não. Porque sei que todos te obedecem. E eu confio em você.
Eu faço que sim com a cabeça e sorrio comigo mesma. Ficamos ali por uns instantes observando o baile fantasmagórico se desenrolar até que ele me pergunta:
- Quer dançar?
Me viro novamente pra ver ele em uma reverência estender a mão pra mim. Eu seguro em sua mão, mas apenas sorrio tristemente.
- Eu adoraria, mas ainda não consigo me mover muito bem.
Ele só sorri gentilmente pra mim e usa sua outra mão pra me erguer da cadeira com cuidado pelas costas. Eu segui o movimento e acabei de pé, fracamente sustentada pelas minhas pernas.
- Se apoie em mim- ele diz suavemente e eu passo os braços ao redor do seu pescoço.
Hitoshi envolve o meu quadril com os braços cuidadosamente, e começa a me guiar girando lentamente pro centro do salão.
- Ei! Cris!- ele gritou pro cara que tocava o órgão, que o respondeu com um "E aí?". Então a música parou e a cabeça dele pensei um pouco pro lado - Toca uma música mais lenta.
E foi exatamente isso que ele fez em seguida, mecanicamente, os olhos ainda meio perdido.
- Achei que você não usasse a lavagem cerebral nos seus amigos - Eu disse pra ele virando o rosto pra encara-lo.
Ele me retribuiu com um sorriso.
- Ah, na verdade eu uso sim, se necessário. Você é a única exceção.
Dou risada e me sinto corar um pouco, sem nem entender o porquê. A proximidade pra com ele era reconfortante, assim como o som da sua voz. Eu não entendia esse meu súbito sentimento de vergonha.
- Obrigado por fazer isso por mim- ele me diz em determinado momento, encostando a testa na minha por um segundo.
- É isso que amigos fazem, não?- respondo, mas eu sabia, bem no fundo, que talvez eu não acreditasse tanto assim na frase que eu acabara de dizer.
Sinto Hitoshi sorrir de encontro a minha bochecha.
- É, acho que sim.
E continuamos a girar em silêncio no centro da sala cheia de fantasmas, como se não existisse mais nada no mundo além daquele momento.

Rainha FantasmaOnde histórias criam vida. Descubra agora