Nós dias seguintes, todos os alunos foram mobilizados pra treinarem e discutirem suas funções nos planos pra ajudar os profissionais.
Então eram uma cinco da manhã quando eu me reuni com Hitoshi pra treinar antes da reunião com a turma toda. Segundo ele, o Curso de Serviços Gerais tinha feito uma espécie de cronograma e, como ele não estava oficialmente no curso de heróis, ele usava o espaço o mais cedo possível. Eu também não estava no cronograma então eu o segui até a floresta, armada até os dentes com meu novo traje.
Shizuka realmente tinha se empenhado tanto nele que a mudança no meu visual era estrondosa. Ela substituira o meu macacão roxo por um colã azul escuro no qual estavam acopladas asas mecânicas feitas de um polímero azul claro e muito resistente, imitando as asas de uma abelha. O traje também acompanha um cinto no qual eu posso acoplar o chicote ou outras armas, um par de óculos escuros tranlucidos com uma abertura no olho direito, além de um par de botas de cano alto que pra alguém baixinha como eu não parecia muito lógico, mas que me deixavam mais alta e passando menos frio, apesar de ela me explicar que a versão de inverno tinha uma calça.
Eu tinha particularmente adorado o novo estilo, mas tinha que admitir que eu realmente parecia diferente. Então quando eu cheguei à área de treinamento e o Hitoshi me viu, suas mãos largaram a fita de captura em que estava pendurado e ele caiu no chão.
- Oi- digo com uma risadinha nervosa e estendendo uma mão pra ele- Você está bem?
Ele se desenrola da fita e se levanta. Me encara em silêncio por uns instantes antes de levar a mão à nuca e dar um sorrisinho tímido.
- Uau. Você está incrível.
Encolho os ombros e baixo o olhar. Ainda não estava acostumada com os elogios.
- Vamos, nós temos quatro horas antes de irmos- digo e ele assente. Alguns alunos seriam transferidos em segredo pra um abrigo fora da escola, chamado Troia. E, além da classe 1-A, isso incluia o Shinsou e alguns alunos da turma B.
- Sabe eu venho me aprimorando bastante, mas eu tô particularmente preocupado com você- ele diz e toca meu rosto levemente, logo abaixo do meu olho de vidro.
Sorrio largamente pra ele e aciono as asas em minhas costas apertando um botão. Plano a alguns centímetros do chão e viro seu rosto pra cima pra olhar pra mim.
- Eu estou perfeitamente encaminhada, mas um passarinho me contou que você precisava de um parceiro de mente forte.
Ele ergue uma sobrancelha. O professor Aizawa tinha lhe explicado o plano e solicitado que ele usasse a lavagem cerebral pra uma etapa importante. E como os poderes dele só funcionavam parcialmente em mim, eu era a cobaia perfeita pra ele testar seu aprimoramento.
- Toshi, aprimorar seus poderes em poucos meses é algo realmente grandioso- digo e puxo sua fita de captura - Mas como você ainda não tá no curso de heróis, eu ainda sou sua mentora, acima de tudo.
Ele me encara boquiaberto e depois estreita os olhos pra mim.
- O vigilantismo te mudou, hein?
Arrasto a fita com força pra frente e ele rodopia conforme ela se desenrola de seu pescoço e se estica entre nós.
- Me aperfeiçoou. Agora me mostra o que conseguiu.
Ele corre até onde a ponta da fita está e a puxa com força, me arrastando até ele pelo ar. Quando estou próxima o suficiente, uso as asas pra me impulsionar com força e o chutar no peito. Ele caiu no chão com um baque surdo, minha bota esquerda ainda o pressionando contra o chão.
- Eu não esperava que você fosse fazer isso- ele me diz, ofegante.
Dou de ombros.
- Eu não vou pegar leve com você.
Então Hitoshi sorri e eu já sei o que está por vir. Assim que ele abre a boca minha visão fica turva e eu perco o controle do meu corpo, cedendo à lavagem cerebral.
- Me diz, o que te fez não voltar pra U.A E virar vigilante, afinal?
Minha parte ainda consciente me dizia pra manter a boca fechada. O motivo real pra eu ter entrado no vigilantismo não cabia à ele e eu também não queria que ele se preocupasse a toa.
Mas minha boca não obedeceu. Incoscientemente, meu cérebro processou uma resposta e mandou minhas cordas vocais traduzirem aquilo.
- Meus pais foram mortos pelos vilões. Eu não tinha pra onde ir. Então eu virei vigilante, prra continuar ajudando as pessoas. Voltar pra escola só me fazia lembrar que eu podia perder também as outras pessoas que eu amava.
Ele pisca os olhos, surpreso.
- Deixa eu me levantar- ordena e meus músculos me fazem sentar de frente pra ele. Sinto uma lágrima involuntária escorrer por meu rosto sem que eu quisesse- Porque não me contou isso antes?
Isso eu consegui me forçar a não responder. Hitoshi suspira e baixa o olhar.
- Diz que não foi porque não queria preocupar ninguém?
- Não foi pra preocupar ninguém- repeti sem que eu entendesse o que aconteceu. Ele não podia fazer as pessoas responderem à perguntas ou repetirem o que ele queria contra sua vontade. Aquilo me encheu de orgulho por dentro.
Ele balança a cabeça e da uma risadinha nervosa. Então me empurra de leve pra trás e eu saio do transe.
- Foi isso não foi?- ele pergunta é eu faço que sim com a cabeça. Toshi passa a mão pelo cabelo e então me olha nos olhos- Você é sempre tão teimosa.
- E você agora consegue fazer as pessoas falarem- digo impressionada- Isso é realmente incrível.
Ele inclina a cabeça e analisa meu rosto por um instante antes de continuar.
- E você Annie? Você vai estar na minha de frente?
Agora é a minha vez de desviar o olhar. Pego uma mexa do meu cabelo e começo a enrrola-la nervosa.
- Bom... mais ou menos...
Então, como um gongo salvador, uma voz soou atrás de nós.
- Ei! Shirakumo! Você tem um minuto?
Ambos nos viramos pra ver o Monoma da turma B atravessando o campo apressado.
- Você é perturbado pra acordar a essa hora e já sair gritando menino?- falo me levantando e cruzando os braços.
Ele dá de ombros teatralmente.
- As circunstâncias pedem uma melhora na autoestima, Shirakumo- ele se vira pra Hitoshi e acena- Bom ver você, aliás.
Shinsou olha pra mim e depois pra ele. Me encara novamente.
- Você foi posta pra trabalhar com ele?
Suspiro e faço que sim com a cabeça.
- O Monoma vem treinando copiar o poder de portal do Kuroguiri e eu venho ajudando ele a estudar o corpo do meu irmão- explico e gesticulo pro Monoma - Mas ele tá achando que já somos melhores amigos por isso.
O garoto loiro da de ombros novamente e sorri de orelha a orelha.
- Ela não vai admitir, mas é a mais pura verdade!
Dou um tapa na cara dele e ele se cala. Ouço Hitoshi dar uma risadinha.
- Mas eu vou seguir nisso sozinho- Monoma explica, a marca vermelha da minha mão em seu rosto pálido desaparecendo aos poucos- Ela só tá me ajudando a entender a individualidade do portal, já que ela pode conversar com o espírito dentro daquela coisa e tals.
- O espírito dentro "daquela coisa" é o irmão dela- diz Hitoshi gesticulando as aspas no ar e depois se virando pra mim- Então você vai estar aonde?
O tom dele era ao mesmo tempo curioso e preocupado.
Maneio a cabeça. Se eu contasse ele iria fazer questão de me seguir e a ideia era eu ficar isolada.
Nós íamos separar os vilões. Mas ainda assim precisaríamos de esforços que pudessem ser contatados em segundos. Então o plano pra mim era convocar heróis falecidos e fazê-los usar suas individualidades pra nos ajudar.
Eu tinha passado os meus dias de vigilante treinando e aprimorando minha invocação e agora eu podia trazer cerca de 50 fantasmas de uma vez, monitorando-os e lhe dando instruções do que fazer.
Pra fazer isso agora, eu só precisava sentar em um canto e literalmente ficar prestando atenção pra ajudar as batalhas isoladas que programamos. Mas pra isso eu teria que me afastar ou ficar presa em um lugar que não levantasse suspeitas.
Era um processo muito longo pra eu explicar então eu só coloquei uma mão em seu rosto, lhe dei um beijo breve e sorri despreocupada.
- Você vai ver- respondo. Em seguida me volto pro Monama- Aliás o que você queria?
A expressão zombeteira e orgulhosa dele derreteu.
- Estão chamando todo mundo. É hora de irmos.
Respiro fundo e fecho os punhos. Faço que sim com a cabeça e começo a seguir pros dormitórios pra termos uma ultima reunião antes de eu ir reunir minhas coisas e deixar a U.A mais uma vez.- Ah eu vou sim com vocês- disse Yugoo colocando a mochila nas costas e encostando no batente da minha porta.
- Yugoo, eu sei que você quer lutar, mas você é necessário aqui!- digo puxando minha mala de rodinhas pro chão. Desde a primeira vez que eu a trouxe ela parecia muito mais leve. Talvez porque eu tinha deixado a maioria das minhas roupas na casa do Koichi- Além disso, a comissão de segurança não vai te deixar lutar sem uma licença.
- E o seu namorado tem licença?
- Não...- suspiro- Mas eles deram uma concessão pro Shinsou. Você é diferente.
- E desde quando eu precisei de licença?- Ele sorri de lado- Sério, você se importa com a lei assim desde quando?
Semicerro os olhos e aponto um dedo pra ele.
- Desde que ela me permite te botar na cadeia se me der na telha.
Ele ergue as mãos em sinal de redenção e me deixa passar pro corredor. Ele vai me seguindo até o elevador.
- Você vai mesmo assim né?- pergunto quando as portas do elevador se abrem e nós entramos.
- É claro.
Rolo os olhos. Porque eu tinha amigos tão teimosos assim?
A sala de estar está uma verdadeira comoção de pessoas indo pra lá e pra cá. As famílias de todos estão ali, se despedindo dos seus filhos.
Engoli em seco, atravessando a multidão até as portas. Me doia lembrar que eu não tinha mais ninguém de quem me despedir. Eu não tinha mais meus pais pra se preocuparem comigo e toda a família que me restava estava prestes a se lancar na batalha junto comigo. Bom, pelo menos grande parte dela...
Sinto uma mão em meu ombro assim que alcanço as portas e me viro. Atrás de mim está o Present Mic seguido do Monoma.
Pisco surpresa pra eles.
- Pois não?
- Anami eu sei que isso vem sendo particularmente difícil pra você- disse o professor com um olhar de profunda tristeza. Afinal, eu era o único resquício vivo e consciente de seu amigo de escola- Então pensamos que você gostaria de falar com eles antes de irmos...
Arregalo os olhos. Eu não esperava isso. E incosncientemente eu sabia a quem ele se referia.
- Mas eles não estão aqui...- balanço a cabeça, tentando em vão controlar a minha voz que sai aguda demais- como eu...?
- Eu abri um portal ue- disse Monoma orgulhoso- Você me ajudou muito, era o mínimo que eu podia fazer.
Meu coração começou a bater mais forte. Fiquei nas pontas dos pés pra olhar pra além deles e depois de um momento de procura que pareceu demorar uma eternidade, eu encontrei os cabelos cor de rosa que me viraram tão familiares.
Sem perceber que estava fazendo isso, eu saí correndo até minha amiga e mentora me envolver em um abraço.
- Annie! - Kazuho diz me apertando com força- É tão bom ver que você está bem!
Ela se afasta e eu só consigo fazer que sim sem parar com a cabeça. Koichi está atrás dela, com as mãos nos bolsos, sorrindo pra mim orgulhoso.
- Eu tô tão feliz em ve-los- digo e não consigo deixar de abraçar os dois novamente- Mas porque vieram mesmo sabendo que eu...
- Que você ia embora?- disse Koichi e mandou a cabeça- Bom nós queríamos te desejar boa sorte- Então ele se inclina e baixa a voz- Você também achou que nós não iríamos te deixar sozinha nessa, achou?
Sorri e balançei a cabeça. É claro que eles fariam isso.
- Sabem que agora é o confronto definitivo e que as coisas vão ficar bem feias, né?
- Eu já fui queimado de dentro pra fora- Koichi argumenta e da uma risadinha nervosa- O All for One não me assusta mais.
Pisquei, confusa.
- Como você sabe dele?
Ele abre a boca e a fecha novamente. Morde o lábio e olha de um lado pro outro.
- O Shigaraki não é o primeiro discípulo dele que a gente vê- responde baixo o suficiente pra somente eu e Kaz ouvirmos- Mas a gente achou que depois do confronto com o All Migth cinco anos atrás ele já era.
- Sério?- pergunto sarcasticamente- É sério mesmo?
Ele suspira e da de ombros.
- Não tinha muito o que podíamos fazer como vigilantes.
Kaz pigarreou e deu um tapinha nele, indicando pra parar de falar. Fiz uma anotação mental pra conversar com eles sobre isso depois.
Olhei pra sala ao redor e percebi que meus amigos já começavam a se dispersar. Respiro fundo e encaro meus amigos e mestres. Minha família. Sorrio.
- Bom eu tenho que ir. A gente se vê mais tarde.
Ambos seguram minhas mãos e a apertam.
- A gente se vê mais tarde.
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Rainha Fantasma
FanfictionAnami é uma estudante do primeiro ano do curso de heróis da famosa U.A. E enquanto ela tenta se tornar uma grande heroína, ela não percebe a sombra que se agiganta sobre todos. Mau ela sabe que grande parte dessa sombra, foi ela mesma quem construiu.