Capítulo 01

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Laís ❤️‍🔥

Acordei em um pulo, ouvindo os barulhos de tiros do lado de fora do meu apartamento. Não eram tão próximos, mas o suficiente pra me fazer estremecer embaixo do cobertor cor de rosa. Respirei fundo, tentando manter a calma e busquei o controle da televisão pra procurar entender o que estava acontecendo.

O relóginho no canto da televisão informava que era 05:43 da manhã, e a repórter dizia que os tiros estavam acontecendo na região do PPG, mas ainda não se tinha a informação exata de em qual das três favelas a polícia estava invadindo. Covardia pura, papo reto. Hora que muito trabalhador estava levantando pra ir em busca do pão de cada dia e a polícia decide invadir assim.

Peguei meu celular na cabeceira da minha cama, tirando do carregador e logo tratei de mandar uma mensagem pro Vitor, meu irmão, querendo garantia de que ele e o meu pai estavam bem. Mas a  mensagem nem chegou, me fazendo ficar nervosa. Involuntariamente coloquei o polegar na boca, mordendo minha unha, enquanto rolava pelos contatos do meu WhatsApp. Entrei no contato do Flávio, o traste do meu ex, mas ele também não estava on-line e não podia me dar as informações que eu queria.

A história era tão longa que se eu precisasse explicar não ia nem saber por onde começar.

Tudo o que eu tinha na minha vida era meu Pai, Douglas ou DG, como todo mundo o chamava, o meu irmão Vitor Hugo, ou VH. Minha mãe não aguentou a barra do parto e se matou cerca de algumas semanas depois que eu nasci, porque sofreu de depressão. Nós morávamos no morro do Pavãozinho, e meu pai trabalhava como servente de pedreiro e minha mãe como professora. Até acontecer todo o lance com ela e o meu pai ficar oficialmente sozinho com dois filhos pequenos pra criar... e pra piorar, quando eu estava perto de completar um ano de idade, fui internada às pressas com problemas pulmonares.

Até hoje sofria com essas coisas, mas eu sei que se meu pai não tivesse feito o que fez, eu não estaria aqui pra contar a minha história. Na verdade, nem foi ele que me contou toda ela. Quem sempre falava era o fofoqueiro do meu irmão, que já entendia um pouco da vida quando eu nasci.

Meu pai se envolveu com o tráfico do morro do Pavãozinho, porque era amigão de infância do chefe da época, e porque precisava bancar os custos do hospital e dos remédios pra me manter viva.

E depois que começou, ele só cresceu. Quem entra nessa vida, raramente consegue sair. Ele assumiu o comando quando o antigo chefe morreu, eu tinha por volta dos meus dez anos de idade, e como ele era o braço direito do cara, a responsabilidade caiu no colo dele.

Eu não gostava muito disso, mas não falava tão abertamente porque sabia que era uma coisa que chateava o meu velhinho, e chateava também o meu irmão, que seguia o mesmo passo. Não queria ser ingrata por todo o esforço que eles fizeram e fazem por mim, então eu preferia ficar na minha, bem quietinha.

Quando fiz quatorze anos conheci o Flávio, o famoso Neguinho. Ele era só um menino do morro do Cantagalo, que faz parte do PPG, junto com o morro do Pavão e Pavãozinho. Não deu outra, me apaixonei de cara no menino, e engravidei do meu primeiro filho com quinze anos.

Meu pai quis matar o Flávio, e chegou a ameaçar mesmo, mas ele prometeu que ia ser alguém e ia honrar o filho e a mulher dele. Eu tinha vontade de vomitar só de lembrar. O Flávio realmente me amou, eu acreditava mesmo nisso, mas ficou tão fissurado nessa história de "honrar" que entrou pro crime e nem percebeu quando já estava assumindo o comando do morro do Cantagalo.

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