Discussion

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Chegamos na sala de estar e nos deparamos com algo que fez meu corpo estremecer. Era um relógio de pêndulo, parecido com o que eu havia desenhado na noite anterior. Considero um artefato bonito, entretanto aquele em específico estava claramente velho.

— Gostaram?— Mamãe indagou esperançosa. Minha vontade é pedir para que levem o mais longe de mim possível, porém não tenho toda essa coragem.

— Foi por isso que saíram ontem?— Louis questionou desacreditado ao dar uma ênfase exagerada no "isso". Realmente... Que motivo inútil para terem passado tanto tempo fora de casa.

— Na verdade tivemos que ir para Indianápolis de última hora. Achamos perigoso pegar a estrada durante a noite e decidimos voltar apenas hoje.— Explicou fingindo não perceber a intonação do garoto. Então eles foram pra capital, onde tem a sede da rede de empresas que minha mãe trabalha.

— E como conseguiram esse relógio?— Perguntei sem achar uma relação entre o objeto e a viajem.

— Vimos em um bazar antigo.— Contou mostrando estar satisfeita com a compra. Elliot provavelmente foi coagido a aceitar a aquisição, visto que não aparenta ânimo como ela.

— É... Eu ainda estou com dor. Vou descansar no meu quarto.— Falei querendo sair de perto daquilo. Nem sei porque estou tão assustada, é apenas um relógio. Eu tê-lo desenhado acidentalmente não o torna algo temível.

— Tudo bem, querida. Qualquer coisa pode me chamar.— Disse prestativa. Assenti começando a sair do ambiente.

— Ei, precisamos conversar.— Escutei Elliot comunicar de maneira rígida. Inclinei minha cabeça e vi que a fala tinha sido para Louis. Acelerei os passos na tentativa de chegar no meu quarto antes que eles entrassem no corredor. Consegui ser rápida o suficiente e entrei no cômodo.

— Dentro do seu quarto.— Ouvi por ainda estar próxima da porta. O negócio deve ser sério, até porque o diálogo será a sós. Deitei na cama curiosa. O que Elliot teria de tão importante para dizer? Enfim, não é da minha conta. Persisti em descansar deitada por alguns minutos.

— Eu sou homem e entendo dessas coisas!— A voz alta de Elliot deu para ser ouvida do meu quarto. Eles estavam discutindo, agora o motivo eu já não sei.

— Se eu perceber outra vez você vai se ver comigo!— Concluiu batendo a porta estupidamente. Levantei da posição confusa. Louis aparentemente não tinha feito nada desde que eles chegaram... Me faço acreditar que foi alguma discussão pendente de outro dia.

— Querida?— Escutei minha mãe dizer ao abrir a porta do quarto. Ela parecia nervosa, provavelmente pelo cenário de briga.

— Oi, mãe.— Cumprimentei num estado semelhante.

— Trouxe um remédio.— Disse mostrando uma pílula sobre a palma de sua mão, e na outra segurava um copo de água. A mesma se aproximou entregando ambos, os peguei educada e engoli o remédio com auxílio da água.

— Obrigada.— Agradeci entregando o copo vazio. Mamãe o colocou encima da cabeceira e sentou ao meu lado apreensiva.

— O que foi dessa vez?— Questionei me referindo a gritaria de instantes anteriores.

— Não sei, coisa deles.— Falou como se não fosse problema nosso. Estou farta dessas discussões, toda semana é uma diferente. No geral, as outras são mais banais do dia a dia, geradas pela rebeldia de Louis. Contudo, hoje foi mais grave. Elliot até nos poupou de escutar, ou pelo menos tentou.

— Queria que eles se dessem bem, mas também entendo que manter uma relação saudável com Louis é uma tarefa quase impossível.— Assumi deitando novamente na cama.

— Não fale assim, querida. Louis gosta muito de você. Viu como ele foi prestativo e te ajudou enquanto você estava doente?— Disse mostrando o lado positivo. Vi? Não. A única coisa que ele fez foi me trazer como um saco de batata e me jogar na cama. Sei que o desgraçado ficou no meu quarto supostamente "cuidando" de mim, mas ele apenas fez aquilo pensando no castigo que levaria de Elliot se não fizesse.

— Não gosto de mentir pra você, mãe. Ele é um grosso comigo na maior parte do tempo.— Contei sendo sincera. Quer dizer, não totalmente, suavizei demais em dizer que é na maior parte do tempo. É literalmente, o tempo inteiro.

— É o jeito dele... Louis é um menino traumatizado por conta da separação dos pais. Acredite, no fundo ele se importa muito com você.— Disse passando pano pra ele como de costume. O pior é saber que essas palavras não são formas de consolo, ela realmente acha que isso é verdade. A ilusão está tão alta que nem vou tentar contrariar, o que eu falar não vai mudar seu pensamento.

— Tá. Pode sair, quero recuperar minhas energias para ir à escola amanhã.— Pedi seca. Me sinto mal em tratá-la desse modo, mas não suporto escutar mentiras.

— Tudo bem, boa noite. Ops... Boa tarde.— Iniciou a fala de cara fechada e terminou se corrigindo descontraída. Agora deve ser o horário que estaríamos voltando da escola. Dei um sorriso falso e a fitei saindo do quarto.

𝐒𝐭𝐫𝐚𝐧𝐠𝐞𝐫 𝐛𝐫𝐨𝐭𝐡𝐞𝐫- 𝘓𝘰𝘶𝘪𝘴 𝘗𝘢𝘳𝘵𝘳𝘪𝘥𝘨𝘦Onde histórias criam vida. Descubra agora