Letter to her

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Se passaram entorno de duas horas desde que tranquei a porta do quarto. A princípio fiquei apenas lamentando pelo meu destino de morte quase inevitável, porém depois de um tempo derramando lágrimas comecei a entrar num processo de aceitação. Percebi que se o relógio está contado, o mais pertinente é não desperdiçar as últimas horas.

Escrevi uma carta para Clarice, desabafando tudo que eu senti e sinto pela morte dela. Meu propósito seria esclarecer os pensamentos intrusivos que afligem minha mente dia após dia, assim quem sabe eu consiga aliviar o sentimento de culpa antes de morrer.

Foi difícil escrever, já que Louis ficou me desconcentrando ao bater na porta a cada instante. Deixei claro que não iria abrir, mas ele não desistiu, apesar das batidas terem diminuído. Quando finalmente terminei a carta saí do quarto com receio, até porque eu sabia que levaria sermão.

— Até que enfim.— Louis disse numa mistura de alívio e cansaço.— Me diz, S/n.— Pediu sério.— O que tá acontecendo?— Perguntou menos agressivo do que o normal. Ele provavelmente ouviu o meu choro, deve ser por isso que está maneirando na sua forma de falar.

— Nada demais.— Menti percorrendo o corredor, fingindo tranquilidade.

— Nada demais?— Repetiu inconformado.— Você ficou em transe no meio do corredor, disse que ia morrer, passou um tempão trancada no quarto chorando e agora vem me dizer que é "nada demais"?— Narrou perdendo a paciência.— Eu tenho cara de otário?— Indagou ironizando ignorante.

— Quer mesmo que eu responda?— Perguntei sentando no sofá ao colocar a carta dentro de um envelope.

— S/n, eu não tô de brincadeira.— Esclareceu entrando num estágio de raiva.— Conta que porra tá acontecendo.— Insistiu usando tom de ameaça.

— Você não entenderia.— Afirmei decidida em não contar.— Mas preciso de um favor.— Falei me preparando para fazer um pedido inusitado.— Ou melhor, dois.— Corrigi emborcando meu corpo para pegar o walkie talkie derrubado no chão.

— Ah, claro.— Concordou debochando.— Acha que vou fazer o que você quer depois de ter passado duas horas plantado aqui fora?— Relembrou expressando rancor.

— É caso de vida ou morte.— Assumi sincera, porém esperando que ele entendesse de modo figurado.— Preciso que me leve num cemitério.— Revelei sabendo que ele teria uma reação duvidosa. Clarice foi enterrada em Hawkins e eu nunca visitei seu túmulo. Nascemos em Indianápolis, moramos lá até minha irmã morrer e nossos pais se separarem, que foi quando eu, mamãe e Elliot nos mudamos pra Califórnia. Não lembro direito o motivo de terem preferido enterrá-la numa cidade do interior que nunca sequer tínhamos ido, mas não me surpreenderia se fosse uma forma de tentar esquecer.

— Pra eu te enterrar logo?— Supôs utilizando de um humor ácido para expressar sua insatisfação.

— É sério, Louis.— Adverti exausta.— Não era você que não tava de brincadeira?— Questionei me aproveitando de suas palavras anteriores.— Me leva, por favor.— Implorei olhando no fundo dos seus olhos castanhos. Senti um certo desconforto com aquela troca de olhares tão direta, parecia que ele conseguia ler todos os pensamentos que rodeavam minha mente, descobrindo facilmente meus segredos mais obscuros.

— Qual é a outra coisa?— Indagou como se tivesse aceitado o primeiro favor. Soltei um ar que nem sabia que estava segurando.

— Tá vendo esse botão?— Mostrei o walkie talkie tentando repassar a mesma orientação que Dustin me deu.— Você vai ter que apertar nele e dizer "alerta vermelho" se eu ficar daquele jeito de novo.— Expliquei me precavendo.— Tipo... Como você disse, em transe.— Detalhei para melhor entendimento.

𝐒𝐭𝐫𝐚𝐧𝐠𝐞𝐫 𝐛𝐫𝐨𝐭𝐡𝐞𝐫- 𝘓𝘰𝘶𝘪𝘴 𝘗𝘢𝘳𝘵𝘳𝘪𝘥𝘨𝘦Onde histórias criam vida. Descubra agora