The sign

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O silêncio dominou o cômodo desde que Louis disse aquilo. Eu não consegui dizer absolutamente nada, já faz bem meia hora que estamos calados esperando o sinal. Descobrir que Louis, a pessoa que eu sempre acreditei carregar um ódio mortal, está arriscando tudo por mim é inédito.

Sei que a partir do cemitério as coisas foram ficando diferentes, eu lembro dele falando que não queria me perder, mas logo depois ele voltou a agir como se nada tivesse acontecido. Isso se aplica também ao que houve na porra do banheiro. Quando nos encontramos na loja de armas parecia que nada tinha mudado entre nós, ainda éramos os irmãos postiços que não se suportam.

Em parte foi bom, eu não estava preparada para encará-lo de outra forma, porém ao mesmo tempo não queria que fosse daquele jeito. As vezes fica difícil entender o que eu realmente quero, minha consciência e meus sentimentos nunca entram em consenso.

Durante essa última meia hora ficamos sentados, tendo apenas uma lanterna azulada iluminando o ambiente. A encontrei dentro da mochila que Nancy deu, então achei melhor usá-la do que ficarmos dependendo de Eleven e sua lanterna exclusiva.

Fiquei escutando Kate Bush enquanto rabiscava num caderninho de papel, do qual também encontrei dentro da mochila, só que no bolso da frente. Louis encarava o chão pensativo, provavelmente receando o momento em que o sinal fosse dado.

Vê-lo naquele estado me trouxe a sensação de culpa, querendo ou não eu sou a causa dele estar se entregando dessa maneira. Arranquei a folha do rabisco e amassei jogando a bolinha no chão, o que atraiu a atenção do garoto. Comecei a escrever uma frase que eu não teria coragem de dizer em voz alta, mas que algo dentro de mim me mandava dizê-la de alguma forma.

"Obrigada por ter vindo."— Virei a folha do caderno mostrando para Louis. Ele não teve reação facial, somente pegou o caderno e a caneta, logo começando a escrever em outra folha.

"É o que irmãos fazem."— Mostrou após finalizar a escrita, assim como eu havia feito antes. Estranhei pegando o caderno de volta para escrever novamente.

"Eu sou sua irmã agora?"— Questionei erguendo a folha com o cenho franzido. Louis repetiu o processo e demorou um pouco na hora de usar a caneta.

"Você sabe que nunca seremos isso."— Respondeu se contradizendo ao me encarar fixamente, formando uma onda de nervosismo em mim. Recuperei os objetos temendo minha próxima grafia.

"Então por que você veio?"— Mostrei o caderno, porém mudei de ideia de imediato, ele já havia respondido isso há meia hora atrás. Troquei de folha refazendo a pergunta.

"Por que você não quer me perder?"— Fui mais direta sentindo meu coração acelerar. Louis pegou o caderno e lhe entreguei a caneta, o mesmo oscilava o olhar entre eu e a folha.

"Talvez eu goste de você."— Revelou enrugando a cara de modo descontraído, certamente para aliviar a tensão. Arregalei os olhos de leve e ele voltou a escrever mais uma coisa.

"Bem lá no fundo."— Acrescentou minimizando a afirmação. Dei um riso fraco e Louis retribuiu dando um risada nasal. Passei um instante pensativa depois de ter o caderno em mãos de novo.

"Eu também."— Declarei em apenas duas palavras, mal reconhecendo o que eu escrevi. Nosso contato visual se intensificou, o garoto aparentava estar satisfeito com o que tinha lido.

— O sinal.— Eleven interrompeu apontando em direção à janela. Tirei o fone desligando a música e desviei o olhar avistando uma luz de lanterna branca vindo da floresta. Meu Deus, é agora.

— O que a gente faz?— Perguntei me levantando agitada, um tanto desesperada. Louis imitou minha ação em seguida.

— Eu preciso de uma venda.— Eleven afirmou como se fosse algo de suma importância. Agi no impulso rasgando a bainha da roupa vestida pela garota, que me fitou assustada. A roupa é minha mesmo.

— Pronto.— Simplifiquei entregando o pedaço de tecido rasgado.— O que mais?— Indaguei apressada, visando a praticidade.

— Primeiro ele tem que entrar em transe.— Orientou se referindo a Louis, portanto o olhei meio em pânico. S/n, não surta.

— E como eu faço isso?— Perguntou sereno, no entanto eu sei que por dentro ele estava nervoso. Quem não ficaria numa situação dessas?

— Chame o Vecna.— Afirmou de maneira curta.— É bom você se sentar.— Aconselhou indicando o chão do centro do porão. Louis engoliu seco e deu o primeiro passo naquela direção, contudo o impedi.

— Espera aí.— Pedi tampando a passagem com o braço.— Tem que ter uma música por segurança.— Avisei tirando duas fitas do meu bolso esquerdo.

— Eu não devo gostar do seu estilo de música.— Louis opinou demonstrando achar um fato óbvio.

— Qual é a sua música preferida?— Questionei esperançosa. É improvável ser justo uma das que eu tenho, mas não custa tentar.

— É...— Murmurou refletindo ao escolher mentalmente.— Mary on a cross.— Disse me deixando extremamente aliviada. Quase não acreditei, é a uma das poucas música sem ser da Kate Bush que eu escuto.— Da banda Grost.— Especificou enquanto eu erguia a fita. Eu tinha ela e "Babooshka" em mãos.

— Sabe que essa música é problemática em vários sentidos, né?— Alertei entregando a fita e o fone, logo retirando a de "Running Up That Hill" do maquinário.

— Então por que você tem?— Indagou querendo acusar ser um posicionando hipócrita da minha parte.

— Eu sou meio problemática.— Assumi simples. Louis deu de ombros voltando a se aproximar da área indicada por Eleven, o mesmo sentou no chão pondo o fone no pescoço.— Eu ligo se precisar.— Garanti sobre a música ao me aproximar. Naquele instante Eleven também sentava no chão com a "venda" no colo, entretanto mantendo uma certa distância.

— Eu estou aqui, seu merdinha.— Louis alegou autoritário após ficarmos em silêncio na expectativa.— Tá esperando o que?!— Desafiou elevando seu volume vocal.

— Não assim.— Eleven negou orientando.— Tente persuadir.— Instruiu o caminho correto. Louis reagiu revirando os olhos impaciente, contudo retomando seu foco. Nos calamos de novo esperando que ele tomasse outra atitude.

— Eu pensei no que você me disse.— Iniciou neutralizando sua expressão.— Achei que você só quisesse me atormentar, me irritar.— Continuou na linha de raciocínio.— Mas não era o caso, né?— Presumiu em forma de questionamento.— Você só falou a verdade, principalmente sobre ele.— Deu ênfase a alguém. Consigo prever quem seja.— Meu pai fez da minha vida um inferno, ainda mais a da minha mãe.— Relatou amargurado com as lembranças.— Quando ele batia nela e eu escutava... Eu torcia pra algo acontecer com ele, algo horrível.— Assumiu sincero, seus olhos pareciam até querer lacrimejar.

— Eu sabia que ele dirigia rápido demais, então eu o imaginava... Batendo o carro, morrendo naquele carro idiota.— Especificou transmitindo repulsa.— Eu só... Queria ele fora da minha vida, queria que ele desaparecesse.— Explicou evidenciando seu lado.— Por quatro anos eu consegui isso.— Mencionou como conquista.— Aí depois tive que voltar a morar com o desgraçado, a ver a cara dele todos os dias.— Constatou em pleno desgosto.

— Eu tentei me acostumar, mas não dá.— Alegou expressando exaustão.— Então agora... Na hora que eu me deito à noite... Eu torço pra que algo aconteça comigo.— Revelou fazendo uma pausa por receio.— Pra que algo horrível aconteça comigo.— Repetiu adicionando o horrível.— É por isso que estou aqui.— Concluiu decidido.— Porque... Só quero que me leve embora. E quero... Que me faça desaparecer.— Esclareceu a desistência. Seu discurso me deixou extremamente aflita, eu já sabia o que ele tinha passado, porém escutar ele mesmo contar sua versão foi mil vezes mais impactante. Sei que a última fala deve ter sido apenas para atrair o Vecna, contudo me atingiu inevitavelmente.

— Você foi bem.— Sussurrei desejando acalmá-lo, mas ele não disse nada. Reparei mais no seu olho e percebi o globo ocular esbranquiçado.— Louis?— O chamei de frente. Merda, o transe.— Louis!— Exclamei me arrependendo de imediato.

— Shiu.— Eleven reclamou colocando a venda sob os olhos. Respirei fundo tentando me convencer de que tudo não passava de um plano articulado e infalível. Vai dar certo, tem que dar.

𝐒𝐭𝐫𝐚𝐧𝐠𝐞𝐫 𝐛𝐫𝐨𝐭𝐡𝐞𝐫- 𝘓𝘰𝘶𝘪𝘴 𝘗𝘢𝘳𝘵𝘳𝘪𝘥𝘨𝘦Onde histórias criam vida. Descubra agora