Crumpled paper

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Faz quase meia hora que mamãe e Elliot estão trancados no quarto discutindo, sei pois ouvi gritos sem contexto. A briga começou desde o momento em que ela atendeu a porta e o recebeu dentro de casa. Não sei exatamente o que desencadeou a discussão, mas aposto que tenha haver com o sumiço dele.

Me encontro sentada no sofá da sala, Deus me livre dividir o mesmo espaço que Louis agora. Aproveitei esse tempo sozinha para refletir melhor sobre minha crise de raiva repentina. Uma parte de mim sabe o motivo, mas eu simplesmente não aceito, talvez eu nunca vá aceitar.

— S/n!— Escutei a voz da minha mãe se aproximando da sala. Pelo seu tom não é coisa boa, capaz de sobrar pra mim.— Você vai se afastar daqueles meninos, está entendido?!— Ordenou inesperadamente, como se estivesse estressada demais para introduzir o assunto com calma.— Filha minha não anda com assassino.— Garantiu grosseira.— Você pode não ser filha do Elliot e ele te largar aqui como bem entender, mas minha filha você é!— Disse elevando o volume de voz, certamente para que Elliot escutasse.

— Mãe, não me envolva na briga de vocês.— Pedi revirando os olhos insatisfeita.— Se você quer dizer algo diga diretamente, é só chamar ele aqui.— Sugeri agindo cínica.— Não desconte sua raiva em mim.— Solicitei acusando com propriedade.

— Ele estaria aqui se cuidasse de você, se ficasse preocupado com você, com quem você anda e o risco que essas pessoas podem lhe proporcionar.— Relatou demonstrando indignação.— Mas ele nem pisa em casa quando eu preciso estar fora, quem dirá isso.— Debochou relembrando o ocorrido.

— Vou repetir.— Anunciei me controlando.— Diga pra ele diretamente, não desconte em mim.— Insisti na minha fala anterior, que foi de certa forma ignorada.

— Eu não estou descontando em você, eu estou me preocupando com você, coisa que ele não faz.— Se explicou sem desistir das alfinetadas.— Apesar de eu me preocupar demais com o filho dele, até mais do que ele mesmo.— Constatou julgando convicta.

— Arg, desisto.— Grunhi a deixando sozinha na sala, indo em direção ao quarto de Louis. Era único cômodo disponível sem ninguém, o único lugar que eu poderia estar livre de ouvir um desorientado falando merda e de enfrentar minha mãe em estado de histeria.

— S/n, volte aqui!— Escutei seu grito de longe enquanto eu entrava no quarto. Fechei a porta e avistei uma tremenda desorganização, a cama estava desforrada e haviam bitucas de cigarro pelo chão, além de outras coisas que prefiro não comentar.

— Imundo.— Insultei automaticamente, mesmo sabendo que não valeria de nada. Decidi me sentar na cadeira do seu birô de estudo, do qual nem deve ser usado. Analisei a superfície do móvel e notei a presença de um papel amaçado.— Olha, pelo menos ele tenta estudar.— Pensei alto surpresa com o feito. A curiosidade bateu, então abri o papel para ver do que se tratava. Fiquei em choque quando vi a caligrafia furiosa e arrogante de Louis por toda página, e principalmente o que havia escrito. S/n, diz o texto, cada execução odiosa do meu nome como um soco na barriga. Ele apertou a ponta da caneta com tanta força que o papel rasgou em alguns pontos.

— S/n!— Dei um pulo da cadeira ao escutar o barulho da porta se abrindo, juntamente com o grito da minha mãe.— Eu disse pra não ir!— Persistiu inquieta. Guardei o papel dentro do meu bolso e me virei receosa.— Quem já se viu me deixar falando sozinha?!— Falou achando um absurdo.— Eu sou sua mãe e mereço respeito.— Afirmou ofendida.

— O que você quer mais que eu fale?— Questionei bufando esgotada daquilo.

— Que vai se afastar daqueles meninos fora da lei.— Lançou objetiva.— Além de um pedido de desculpas pela forma como me tratou, é o mínimo.— Adicionou cruzando os braços e batendo o pé no chão ansiosa.

— Tá, desculpa.— Aceitei querendo me livrar logo.— Eu vou me afastar deles, ok?— Menti dizendo o que ela queria ouvir. Sua face foi relaxando aos poucos.

— Por que está aqui?— Perguntou se ligando que eu estava no quarto de Louis.

— Ah...— Murmurei formulando alguma desculpa.— Eu não queria entrar no meu quarto estressada e acabar assustando a Jane.— Falei a primeira coisa que veio na minha cabeça.

— Que horas ela vai embora?— Indagou querendo mostrar ser tarde, afinal estamos na noite de um domingo. Tinha me desligado desse detalhe, preciso pedir pra ela dormir aqui hoje.

— Sobre isso...— Iniciei insegura, tendo noção de que não seria o melhor momento para pedir algo.— Os pais dela ainda não voltaram de viagem, então pensei nela dormir aqui e ir pra aula comigo amanhã.— Propus sem manter contato visual.

— S/n, você sabe que estou contente com a amizade de vocês, mas não estamos organizados para ter uma visita em casa.— Se opôs como o esperado.

— É que ela mora numa região afastada da cidade, aí não vai ter quem a deixe na escola.— Expliquei criando outro cenário.— Inclusive vocês teriam que levar ela pra casa se fosse o caso dela voltar.— Acrescentei querendo deixá-la sem saída.

— Como ela veio aqui então?— Questionou desconfiada. Merda, eu sabia que tinha um fio solto.

— É... Eu e Louis fomos buscar ela.— Gaguejei decidindo a milésima mentira, já dá pra eu virar atriz.— Isso foi antes dele se machucar no jogo.— Especifiquei interligando os "fatos".

— Vocês assistiram o jogo?— Indagou interessada em saber de tudo.

— Sim.— Assenti de imediato. Mamãe não retrucou e fez uma feição reflexiva.— Então... Ela pode ficar?— Me arrisquei a perguntar.

— Fazer o que.— Consentiu se dando por vencida. Comemorei fechando minha mão atrás das costas.— Chame ela pra jantar, vocês podem esquentar a comida que tem na geladeira.— Sugeriu prática.— Eu até cozinharia, mas não estou cabeça pra isso.— Contou pressionando a testa.

— Tudo bem.— Concordei a tranquilizando, porém na real não estava nada bem. Eu não queria ter que rever Louis para chamar Eleven, especialmente depois de achar aquela bendita folha.

— Boa noite.— Se despediu como se nada tivesse acontecido. Passei alguns segundos parada após ela sair, digerindo a ideia de que eu teria que ir até meu quarto de novo. Finalmente tomei coragem e entrei no cômodo vizinho devagar.

— Ele dormiu?— Questionei sussurrando para Eleven ao ver que Louis estava virado pro outro lado da cama. A garota mexeu a cabeça me aliviando pela confirmação.— Ufa.— Não contive um suspiro.— Vem, vamos jantar.— Chamei baixo com medo de acordá-lo. Lá fomos nós duas pra cozinha sem demora, a agilidade de Eleven deve ter sido por conta da fome, contudo eu tinha outro motivo plausível para querer sair daquele quarto.

𝐒𝐭𝐫𝐚𝐧𝐠𝐞𝐫 𝐛𝐫𝐨𝐭𝐡𝐞𝐫- 𝘓𝘰𝘶𝘪𝘴 𝘗𝘢𝘳𝘵𝘳𝘪𝘥𝘨𝘦Onde histórias criam vida. Descubra agora