99) Fogo

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Aquela era uma casa cheia de fantasmas e memórias atormentadas. Nas paredes ainda havia resquícios de sangue póstumos que tiveram o desprazer de não sair com água. Assim como os rastros dessa mesma coloração vermelha pelo carpete.

Jumpol mantinha a luz desligada, da mesma forma que estava na noite do incidente. Ele encarou fixamente o tapete manchado, por alguns instantes, e não disse nada ao soar de alguns segundos. Foi quando que em um lapso, suas mãos agarraram o tecido e o enrolaram com avidez, arrastando para os fundos da casa. De seu bolso tirou o isqueiro que agora alimentava seu vício pela nicotina, e ao ascende-lo atirou contra o tapete, observando a decoração transformar-se em uma grande fogueira.

Quanto mais o fogo ardia, mais alto ele subia, e o queixo de Jumpol o acompanhava. Em seus olhos o acalento da chama refletia em uma alma atormentada, revivendo memórias que tentou esquecer.

— Sangue nas paredes... sangue no carpete. Talvez eu devesse ensina-los como a chama pode esconder muita coisa. - Foi a última coisa que disse, antes que em passos lentos voltasse para dentro, sem preocupar-se com o que sua vizinhança pensaria do fogo alto. Após isso ele se ajoelhou frente a parede em que viu seus pais o abandonarem permanentemente.

Jumpol encarou suas próprias mãos, podia jurar vê-las manchadas de sangue enquanto sua visão ficava turva, consumida por lágrimas de vidro, que nunca escorriam de seus olhos.

— Vai ficar encarando essa folha por quando tempo? - A voz de Tay sempre alegre e atenciosa, atravessou os ouvidos de Adulkittiporn, que levantou a cabeça para encara-lo.

Era uma manhã nublada de terça-feira, em suas mãos um envelope amarelo, ao seu lado um café quente e na sua frente. Não houve resposta da sua parte, então Tawan continuou:

— Então a sua mãe apareceu do nada pra te entregar esse laudo e dizer que isso é hereditário e você provavelmente é igual ao seu pai? Que maldosa.

— Ela não é a minha mãe. - Corrigiu com apatia, encarando o laudo enquanto suas mãos frias apertavam a folha cada vez mais: - Ela me abandonou, me deixou nos braços de outra mulher. Hana é a minha mãe... mas talvez ela esteja certa.

— Ah, qual é, cara... eu não te acho um maluco sociopata se isso serve de consolo.

Jumpol o encarou, respirando fundo e deixando o documento sobre a mesa, esfregando o próprio rosto.

— Você não pode ficar assim agora, vamos partir em missão amanhã.

Off riu:
— É por isso que está me consolando? Não é nada empático da sua parte.

— Bom... pelo menos eu não sou diagnosticado com transtorno antissocial. - Tay riu, e Off abaixou a cabeça: - Ah, vamos lá... esse diagnóstico é do seu pai, não seu, você não é um psicopata... nem o seu pai é. Ele só é doido, pessoas malucas também são gente sabia?

— Diz por experiência própria?

— Não, espera aí. - Tay levantou as mãos para cima em rendição: - Não é pra tanto também, seu pai é mais maluco do que eu.

— Eu vou mostrar isso à Hana, talvez ela desista desse casamento.

— Eu acho que não, ela parece ser uma mulher apaixonada e muito insistente. Quando se ama alguém a gente não se importa com esse tipo de coisa. - Tay deu de ombros: - É o que dizem pelo menos. Eu não deixaria de te amar se você fosse maluco.

— Que fofo. - Disse em tom sarcástico.

— Eu sei que sou. Mas não mais que o meu amigo, ei, Gun! - Tay se levantou acenando, e Off olhou para trás, onde avistou o pequeno agente levando uma caixa de registros nos braços, para o que Jumpol apostou ser a sala de arquivos confidenciais.

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