Capítulo 14

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~Gabriel~

Eu entreguei o meu caderno de desenhos de propósito para Melissa, sabia que ela os veria. Mas a parte da tarefa de inglês realmente estar nele foi apenas uma coincidência porque eu não o usava para fazer as merdas da escola só que ele era o único por perto quando fiz o texto de inglês.

Na verdade, nem eu sabia o motivo de ter desenhado tudo aquilo. O esboço do corpo escultural eu fiz na primeira vez que nos vimos porque se eu não tirasse aquela imagem da cabeça, ia acabar caçando Melissa até fazer com que ela fosse minha.

Era ela bela e isso não era objeto de discussão.

Os outros esboços foram construídos em casa e nas aulas insuportáveis que temos naquela maldita escola. Eu a observava, mesmo de longe, e estava preocupado com ela. Fui percebendo que seu rosto estava mudando, e mudando muito, desde o dia do acontecido. Seus olhos, antes brilhantes e curiosos, estavam opacos, secos e vazios. Antes, se eu olhasse dentro deles, era como se visse sua alma, uma luz. Agora, quando faço isso, tudo o que vejo é uma casca oca e poeira.

Saber que eu não podia fazer nada para mudar isso me irritava profundamente.

Alguns chamariam isso de peso na consciência, mas eu não.

Sempre que a minha mente me levava de volta para aquela noite, eu me pegava pensando que queria ser algo a mais do que só um humano para poder entrar na cabeça dela e fazê-la viver novamente, sem essa lembrança.

Há mais de um mês, observo o seu corpo e sei que ele se tornou sua pior prisão. Seu rosto, agora melancólico, mostrava explícito a ausência de uma alma e o meu maior desejo é fazer ela voltar a ser como era antes: com sua curiosidade à flor da pele, suas perguntas irritantes, uma garota feliz, alegre e brincalhona. E não como está agora.

Eu sabia que não podia mudar isso, mas eu podia fazer algo para que ela mesma decidisse mudar e, quem sabe, voltasse a ser quem era.

Era isso que eu iria fazer. Eu iria trazer a luz aos seus olhos novamente, prometi a mim mesmo. E iria começar a fazer isso a partir de amanhã.

~Melissa~

Não pude deixar de imaginar que aquilo pudesse ser para mim. A ilusão tomou conta quando me peguei pensando nisso. Ele tem motivos para gostar de mim? Para pensar em mim?

Primeiro os desenhos. Os meus desenhos. Depois, esse poema. Deve ter algo errado, talvez esse caderno não seja dele.

Mas de quem mais seria?

Olhei novamente para as páginas. Fitei os desenhos, todos eles. Todos os detalhes do meu rosto estavam ali. Por que ele me observava tanto? Como pôde guardar cada célula do meu rosto e do meu corpo assim?

De acordo com as datas, os desenhos foram perdendo o brilho de uma forma definida a partir daquela festa, naquele período de um mês que ele ficou sem falar comigo, coisa que, aliás, eu não sabia o motivo até hoje. Ele só havia dito que não estava bem.

Ele talvez não teve forças para falar com alguém que sofreu quase a mesma coisa que sua irmã falecida. Gabriel mostra essa pose de durão, mas ele é mais do que só frágil por dentro. E falar comigo de novo logo depois do acontecido pode ter sido difícil para ele.

Me permiti ficar um bom tempo observando inúmeras vezes aquele caderno, de trás para frente e me obriguei a voltar para as minhas obrigações.

Depois de copiar o texto, trocando algumas palavras, li o poema pelo menos mais umas 5 vezes.

"Faz-me amar, amor que nunca se viu"

Essa parte nunca saiu da minha cabeça. O imaginei escrevendo cada palavra deste poema e pensando em mim (?) enquanto o fazia. Era surreal pensar nisso, mas era uma possibilidade, certo?

Os Opostos se Atraem? - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora