Capítulo 49

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  - Gabriel, o que... - comecei, mas ele me cortou.

  - Quando você me deu, senti que faltava alguma coisa nele.  E havia espaço sobrando, então, decidi colocar nele o que faltava na minha vida real. - ele me encarou com uma tentativa de sorriso. Estava sem graça.

  - Eu adorei, ficou perfeito - falei sem tirar os olhos do desenho - Mas o que vai fazer com ele?

Ele se levantou da cama e o colou na parede, bem ao lado de sua guitarra vermelha.

  - Assim está bom? - ele perguntou.

  - Sim - falei, sorrindo.

Quando eu estava prestes a me perguntar se o meu dia poderia melhorar, minha mente engatilhou e eu tomei um soco no estômago com muita força quando as lembranças do que Renato havia me falado no começo da semana voltaram para a minha cabeça de uma vez só.

Isso me fez perceber que eu havia me esquecido delas. Ontem, na festa - meu deus, tanta coisa aconteceu, a festa havia sido ontem? Pareciam dias atrás - eu não me lembrei mais delas, em razão de todos os acontecimentos que se seguiram.

Senti o meu rosto endurecer e percebi que Gabriel notou.

  - Há algo errado, Melissa? - ele me perguntou.

Umedeci os lábios e suspirei, pensando se contava ou não. Se eu contasse, ele poderia fazer coisas horríveis com Renato, mas se eu não dissesse nada, como eu poderia saber a verdade?

Eu me conhecia o suficiente para saber que enquanto eu não tirasse essa história a limpo, eu não iria sossegar, então, decidi falar sem pensar muito, para não correr o risco de desistir:

  - Gabriel, eu...  - suspirei e olhei para baixo, para minhas mãos - Ouvi coisas. Coisas ruins. Sobre você.

  - Não devia estar surpresa. - ele deu de ombros.

  - Gabriel, coisas muito ruins - eu aumentei levemente o tom de voz e olhei para ele, séria.

Em um primeiro momento, ele me olhou sem entender do que eu estava falando e o motivo pelo qual aquela conversa havia surgido do nada. Entretanto, eu o ouvi respirar fundo e vi seu olhar congelando.

Ele entendeu.

  - O quê exatamente? - ele perguntou devagar.

Como eu poderia repetir tudo aquilo?

  - Coisas sobre seu passado, coisas que... Eu realmente não gostaria de ouvir.

  - Sobre? - ele chegou mais perto.

  - Sobre tudo - falei - Sobre drogas, sobre ficar atirado na calçada, bêbado aos 16 anos, sobre se meter em briga com todos, sobre se cortar, sobre... Uma garota. - meu coração deu um salto quando eu soltei aquela parte.

Percebi que Gabriel parara de respirar.

Seu olhar para mim era de puro terror e eu podia jurar que seus olhos estavam começando marejar.

  - Melissa, não... - ele tentou se aproximar, mas eu me afastei.

  - Gabriel, não fala nada. Por favor. Só... Me diz se é verdade. Me diz se tudo isso que eu ouvi, e não foi pouca coisa, é verdade. Porque eu não consigo mais passar um segundo pensando nisso e tendo essa dúvida aqui na minha cabeça. Se não for verdade, podemos conversar a respeito, podemos... Sei lá, eu te deixaria explicar.

Ele não disse nada por alguns segundos.

  - E se for? - ele me olhou - Você não colocou essa opção. E se for verdade?

  - Talvez seja porque eu não faço ideia do que faria.

Ele escondeu os olhos com a mão, e meu coração bateu mais rápido.

  - Gabriel... É verdade?

Ele não respondeu de imediato. Não me encarou, apenas olhou para as mãos e pareceu pensar. Sua expressão estava vazia, então minha esperança de achar qualquer vestígio de resposta em seu rosto sumira.

  - Sim, Melissa. É verdade.

Minhas mãos começaram a tremer, eu sentia que começara a suar frio e, de repente, o barulho dos ponteiros do relógio sobre a mesinha de cabeceira do outro lado do quarto se tornou irritantemente forte para mim. O cachorro da vizinha latiu uma, duas, três vezes, e esse som foi abafado pelo telefone que tocava na casa da mesma.

  - Melissa? - a voz de Gabriel soou como um eco na minha cabeça.

Eu não conseguia ouvir nada direito, parecia que eu estava embaixo d'água.

A familiar ardência que precede o choro se instalou em minha garganta e quando dei por mim, eu estava ligada no automático. Passei por ele, como um míssil e saí do quarto. Em seguida me vi na porta de saída da casa. Uma mão agarrou meu braço. Houve gritos e mais gritos, provavelmente lágrimas saíam do meu rosto, mas eu estava atordoada demais para saber.

Quando vi, eu estava no meio da rua, correndo o mais rápido que podia em direção à minha casa, sem me importar se era lomge da sua, sem me importar que estava com roupas inadequadas, e sem olhar para trás para checar se Gabriel estava parado em frente à porta, me vendo partir.

Mas eu não precisava olhar para saber que ele estava.

Os Opostos se Atraem? - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora