Capítulo 50

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Não seria novidade falar que meu celular se encheu de mensagens e chamadas. Não dezenas, mas centenas delas em poucos segundos. Textos e mais textos enormes chegavam e eu via pela barra de notificações, mas não lia nenhum. Só entrei no WhatsApp para bloquea-lo da minha lista de contatos de vez, coisa que eu deveria ter feito semana passada.

Cheguei em casa suando, cansada, esbaforida e ainda chorando horrores, o que fez com que minha mãe viesse correndo atrás de mim quando fui para o meu quarto e fechei a porta.

- Melissa, tá tudo bem? - ela perguntou com a voz abafada do outro lado da porta.

- Mãe, me deixa sozinha! - gritei enquanto secava as lágrimas teimosas com as costas da mão.

- Melissa, aconteceu alguma coisa naquela festa com aquele garoto?

- Com ele não - rolei os olhos.

Ela ficou calada por um instante.

- Olha... Ontem, quando você saiu, um garoto apareceu aqui. Ele perguntou por você, e eu falei que você tinha ido para a festa com os seus amigos Acho que ele foi atrás de você. Foi ele?

- Como era o nome dele? - perguntei de olhos fechados, já sabendo a resposta, mas só querendo ouvir o nome dele de novo.

- Gabriel.

E foi como um tiro.

- Mãe... Só... Me deixa sozinha, ok?

- Se ele fez algo com você...

- Mãe! - falei mais alto.

- Tudo bem. - ela disse - Só me promete que vai me contar se precisar de ajuda, ok?

- Prometo... - falei.

Ouvi passos dela pelo corredor, e soube que ela havia ido para a cozinha.

Eu simplesmente não sabia o que fazer. Não sabia se simplesmente ficava deitada na cama chorando, se saía gritando ou se, simplesmente, não fazia nada e agia como morta, porque era como eu me sentia por dentro.

Passei o restante do fim de semana trancada em casa e boa parte disso dentro do meu quarto. Minha mãe queria saber se ela poderia me ajudar com algo, mas como poderia? Como eu poderia contar isso a ela, como poderia contar isso a qualquer um?

Na segunda, apesar da minha vontade de faltar da escola, meu pai me levou para lá percebendo que havia algo errado, mas não perguntou. Apenas me encarava às vezes com seus olhos castanhos, os quais eu havia herdado.

Ele era bem mais discreto nesse quesito. Se eu quisesse contar algo a ele, eu contava por vontade própria, porque ele nunca perguntava.

Não me entendam mal, eu gostava que a minha mãe fosse uma pessoa preocupada comigo, e meu pai também se preocupava, ao seu modo, mas, nesse momento, eu preferia a preocupação silenciosa dele do que a dela, afinal, eu não queria falar, eu não ia falar.

Ele me deixou na escola e eu entrei depois de respirar fundo o máximo que eu consegui. Não olhei para os lados, não procurei ninguém. Apenas fui para onde sei que as meninas ficam. Fazia algumas semanas que não falava com todas simultaneamente, e sentia uma certa saudade disso.

- Hey - falei ao me aproximar.

- E ela está viva - disse Ju ao me abraçar.

- Oi, Mel! - disse Laura.

- Mel! - Carol me abraçou - Nós víamos você naquele corredor da escola, parecia ter uma conversa intensa com Gabriel. Nem atrapalhamos - ela riu

Eu soltei um sorriso fraco.

Ficamos conversando um pouco sobre a vida amorosa da Ju, que estava uma bagunça, e quando o sinal bateu, rezei para não acha-lo no corredor, nem na sala, nem na escola, e nem em lugar nenhum.

E foi o que aconteceu. Ele não foi na segunda. Nem terça. Nem quarta. Nem quinta. Nem sexta. Faltou às aulas que teríamos à tarde, não entregou trabalhos, não fez as provas, não deu sinal de vida.

Na sexta à tarde, eu havia saído da escola e resolvi ir a pé para casa. Como conhecia um caminho mais curto, fui por ele. A única diferença entre ele e o caminho normal era que esse era quase deserto, por passar em bairros mais quietos. Apesar de passar por fora do centro, era de dia, então não tinha problema. O índice de crimes à luz do dia nessa cidade era menor do que o de tubarões atropelando pessoas na Avenida.

Meu celular apitou e eu o tirei da bolsa. Era uma mensagem da Carol.

"Mel, onde exatamente você está?"

"No bairro perto da igreja matriz. Algumas quadras depois da escola. Cortei caminho por aqui. Por quê?"

Ela não respondeu. Minutos depois, sinto meu braço ser puxado para trás e meus olhos e minha boca foram tapados com uma mão grande antes que eu pudesse gritar. Meus olhos foram vendados e me colocaram dentro de um carro. Eu me debatia, mas não ouvi uma voz sequer de quem quer que estaria fazendo aquilo.

Eu entrei em choque. Podia ouvir com detalhes cada batida do meu coração desesperado por não saber o que viria a seguir.

Calei a minha mente com pensamenfos imbecis e tentei me concentrar em todos os sons e ruídos que eu pudesse ouvir, então, não gritei e nem fiz escândalo. Eu precisava ficar calma.

A porta do outro lado foi aberta e eu escutei algo sendo colocado no banco ao meu lado. Barulho de cadernos... Devem ser os meus, quando os deixei cair.

Mas que tipo de assaltante se preocuparia com os meus cadernos?

A pessoa entrou no carro e deu partida. Algo ali me era familiar, mas eu não sabia o que era. Talvez o banco ou o cheiro do carro... ou o cheiro dele.

Tentei contar mentalmente em quantas ruas ele virou para a esquerda e quantas para a direita, mas perdi a conta logo depois. Isso não daria certo e não adiantaria nada.

Antes que eu pudesse terminar meu raciocínio, ouvi barulho de portões e o carro entrou no que pude perceber ser uma garagem. Novamente, mais barulho de portões e momentos depois, o carro parou. Ouvi uma porta se abrir e a pessoa desceu, me tirando de dentro do carro com uma certa delicadeza. Ele respirou fundo, mas não falou.

Não ousei dizer nada.

Portas foram abertas e ele foi me conduzindo até me fazer sentar em algo macio.

Um sofá.

A raiva me invadiu de repente. Que merda estava acontecendo ali? Já não bastava toda a merda que havia acontecido comigo durante o ano todo, agora eu também estava sendo sequestrada? Que bela palhaçada.

E que sequestrador de araque era esse que se importava em pegar os meus cadernos? Ele nem se preocupou em tapar a minha boca com alguma mordaça, correndo o risco de eu dar um escândalo no meio da rua.

E agora me deixa em um sofá? Em uma merda de um sofá? Completamente solta, apenas de olhos vendados? Que raio de brincadeira era aquela?

- Vai arrancar esse troço dos meus olhos ou vai me esperar gritar? - perguntei.

Eu sabia que estava correndo o risco de apanhar ou de tomar um tiro bem no meio da testa, mas algo dentro de mim se agitava e sabia que isso não ia acontecer.

E eu estava com raiva. Com raiva por toda a merda que havia acontecido comigo. Com raiva por não ter um segundo de paz. Com raiva de tudo e de todos, com raiva de mim.

Se fosse para acontecer algo, que seja, eu não me importo.

Ouvi passos se aproximando de mim e ele tirou a venda dos meus olhos devagar. Precisei de alguns segundos para me ajustar à claridade depois de tanto tempo no escuro.

Olhei ao redor e depois olhei para ele.

- Agora você vai me escutar. - disse Gabriel

Os Opostos se Atraem? - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora