Capítulo 28

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Claro que não dormi. Acordei de 5 em 5 minutos, preocupada com Gabriel, e o olhava para ter certeza de que estava bem. Ele não mudou de posição uma só vez; sempre deitado de costas, com a expressão serena. Eu percebia que ele dormia profundamente, e demoraria a acordar. No relógio marcavam 5:30 da manhã, sexta feira. Era o único dia da semana que minha mãe não me acordava de manhã para ir para a escola porque ela acordava mais tarde. Ou seja, ela não tinha como saber que eu não estava em casa.

Mandei uma mensagem para ela quando o relógio bateu 07h30 e disse que peguei o carro porque estava atrasada para a escola e tinha prova, mas que era para ela ficar tranquila porque eu estava bem e que isso não aconteceria de novo.

Obciamente, hoje eu não iria na escola, estava exausta e só havia dormido duas horas durante a noite, mas eu sabia que eu não conseguiria pregar o olho mais.

Fitei o rosto de Gabriel mais uma vez, me concentrando nos traços principais. Maxilar, nariz e maçãs do rosto. Todos fortes, proporcionais. Lábios entreabertos, rubros, cabelos ainda bagunçados e os músculos visíveis sob a regata que usava.

No quarto de Mirella, me lembrei, havia uma escrivaninha com alguns lápis  e folhas A3, as que eu mais gostava de usar. Me levantei da cama devagar e fui até o quarto de Mirella. Demorei para achar um lápis no meio de tudo aquilo; Gabriel havia feito uma bela bagunça.

Sentei-me na escrivaninha e comecei a desenhar. O desenho tomou dimensões enormes, maiores do que o primeiro, que estava destruído.

Corri a mão pela folha várias vezes deixando traços e mais traços de um esboço definido, que  formavam o rosto do garoto mais instável que eu já havia conhecido na vida. Passei horas o fazendo, sombreando as partes que não estavam expostas à luz imaginária.

Só vi que já estava tarde quando senti alguém tocar meu ombro. Me virei.

  - Bom dia. - disse Gabriel.

  - Bom dia. - respondi - Está melhor?

  - Sim - ele disse com a voz de sono, rouca, o que me fez querer abraçá-lo.

Gabriel fitou o desenho que ainda estava em cima da escrivaninha. Algo havia acontecido, pois o desenho pegou apenas metade da folha. A outra metade  estava em branco, ou seja, cabia mais um desenho ali. Mais um rosto.

Me diverti pensando que algum dia eu podia desenhar o meu rosto ao lado do dele.

  - Ainda não acabei - falei. 

  - Você conseguiu. Está parecido. - ele sorriu - Mas este está melhor.

  - Obrigada - falei claramente com vergonha - Comecei logo que amanheceu.

  - Não dormiu? - ele perguntou, agora com a expressão preocupada.

  - Não consegui. Acordei o tempo todo.

Ele fitou o chão.

  - Me desculpe por isso. É culpa minha porque te pedi para ficar comigo aqui. E você ficou, mesmo depois do que eu fiz com você. Não me admira que você não tenha conseguido dormir.

Eu dei de ombros devagar

  - Melissa, por que veio? - ele falou cauteloso - Como sabia que eu não estava... bem?

Eu suspirei e encarei seus olhos azuis, que não desgrudavam dos meus.

  - Eu sabia que você tinha visto o beijo que Renato me deu. Você saiu sem que eu pudesse ao menos falar com você. Deixou as flores e o bilhete lá, caídos na calçada, e eu fiquei me sentindo a pior pessoa do mundo depois que li. Tentei te ligar, mas você não atendeu as mais de 20 vezes que liguei. Então imaginei ter algo errado.

Parei de falar e encarei o chão, eu nunca consegui olhá-lo nos olhos por muito tempo.

  - E como entrou aqui?

  - Pulei o portão - falei e olhei meu braço machucado. Estava roxo - E caí.

Ele abriu um pequeno sorriso.

  - Tinha que ser você para cair.

Eu sorri fraco, me lembrando de que assim que entrei, Gabriel quase acertou algo de vidro em mim. Meu sorriso se desfez.

  - O que foi? - ele perguntou.

  - Nada... - forcei um sorriso.

Ele tirou o desenho e se sentou em cima da escrivaninha, na minha frente.

  - Pode começar. - ele falou. - Anda. Fala.

Suspirei. Merda.

  - Eu fiquei com medo de você ontem, Gabriel.

Os Opostos se Atraem? - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora