Capítulo 54

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Se todas as manhãs eu me acordasse como hoje, seria uma bênção. Deixei meu material organizado dias antes e comprei uma jaqueta para me esquentar durante o anoitecer. Já estava me prevenindo antes que algo acontecesse. Mesmo com tudo pronto, ao sair do ônibus senti falta do meu óculos de grau.

Minha aula era no térreo, no prédio três. Fiquei satisfeita por não ter que subir escadas, facilitando para mim com meu sedentarismo.

Havia tantas pessoas que parecia estar em uma dimensão diferente. Música ecoava pelo corredor, dando uma emoção maior ao momento. Armários estavam estendidos ao longo do corredor. Olhei para minha sala, caminhando devagar, pensando em tudo que mudaria a partir daquele momento.

- Aiii - uma moça reclama enquanto esbarramos ao passar pela porta estreita.

- Me desculpe, eu não te vi... - acabei rindo, pois era verdade.

Ela cruzou os braços, me olhando de um jeito assustador, mas suas bochechas grandes não a favoreciam. Sua calça jeans era dobrada nas canelas e sua camiseta ultrapassava a cintura.

- Claro, você é grande demais para me ver - ela mesma faz uma piada e continua andando para dentro da sala. Gostei dela.

- Emmanuela - digo ao sentar ao seu lado. Ela sorri e estende a mão.

- Gisele.

Olho em volta da sala, analisando os outros alunos que pareciam mais perdidos do que eu. Sorri quando uma garota ruiva me olhou; ela retribuiu o sorriso.

A sala não era muito grande, mas suficiente para uma turma de Literatura. Enormes janelas de vidro davam uma bela visão para um jardim cheio de flores e árvores, que inspirariam vários poemas.

- Então, você é daqui da cidade? - Gisele pergunta, olhando para minha carteira do ônibus.

- Ah, sim, moro perto da Starbucks.

- Ah, você tem sorte então - ela ri. Bem, não diria que tinha sorte...

- E você, onde mora?

- Moro a três quarteirões daqui - ela sorri.

Um homem de meia-idade entra na sala com um notebook na mão. Dois alunos, que pareciam perdidos, entram logo depois.

- Richard, o que você está fazendo aqui? - o homem pergunta para o cara espantado. Ele sorri de um jeito encantador.

- Troquei de curso, professor Marcos.

Ele dizia enquanto se ajeitava em frente à Gisele, ficando na minha diagonal. Eles estavam na fileira da parede; Gisele estava virada para frente e Richard sentou virado para o meu lado.

- Bom dia, pessoal - o professor Marcos falou, indo para frente da mesa. - Semestre novo, turma nova, para mim matéria velha e para vocês uma novidade.

Rimos.

- Bem, vamos começar com algo muito formal. Que tal uma poesia ou poema para iniciarmos essa nova caminhada? - ele vai até o quadro e escreve algumas informações.

- Vocês têm duas horas para fazer o que vier à cabeça. Enquanto isso, vou atrás da chamada da turma - ele sai da sala, deixando a porta fechada.

- Então, Emmanuela, né? O que você vai fazer? - Gisele pergunta para mim. Vejo dois olhos verdes fixados em mim.

- Acho que vou começar pensando. Não estou decidida, vou começar e classificar no final.

- Acho que vou fazer uma poesia, adoro rimas - ela abre seu caderno e começa a escrever.

Richard sorri para mim, devolvo o sorriso e volto minha atenção para o caderno.

Escrever parece uma tarefa simples comparado à matemática ou química. Escrever vai muito além do conhecimento físico, é mais do que o esperado. Escrever é dar vida às palavras, expressar emoções e devoções, compreender, entender e palpitar. Muito mais que uma simples fórmula. Escrever é cativar, pensar e querer impressionar.

Não iria falar sobre romance, sobre como a vida é patética, nem mesmo sobre a natureza ou as pessoas. Queria apenas mostrar que se pode fazer poema ou poesia de qualquer maneira.

- E aí, como ficou o de vocês? - Richard pergunta, parecendo atrapalhado.

- Eu nem comecei... - Gisele fala, olhando pela janela.

Eu li o meu poema enquanto ele me olhava admirado.

- Bem, acho que sobrou para mim escrever sobre o amor - Richard fala.

- Então...? - incentivo ele a ler.

- Quem diria que agora estaria olhando para trás, nem pensaria que o tempo me ajudou a continuar. Ficaria devastado se de novo eu te encontrar. Seu sorriso permanece nas minhas lembranças, cravado nos meus pensamentos, só que neste momento não é ele que anseio mais. Lamento o decorrido, mas agora somos bons amigos que nem se falam mais.

Aquele sorriso que me dava calafrios invadiu meus pensamentos. Eu precisava deixar tudo isso para trás. Não devia pensar nele. Eu evitava o tempo inteiro, mas era doloroso demais fingir que nesses últimos meses eu não fui afetada.

Querida BabáOnde histórias criam vida. Descubra agora