Capítulo 1

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— Emma — a senhora carinhosa me chama pela segunda vez.

— Sim, senhora McVay — eu respondo, já sabendo o que ela iria me pedir.

Ela havia me dito para ter calma, e por sorte, eu tinha de sobra. Eu tinha acabado de chegar em um casarão de três andares, onde havia duas empregadas muito simpáticas. Os pais de um grandalhão iriam viajar para vender a empresa e me chamaram para ser companhia dele. Eu aceitei sem hesitar, afinal, não é todo dia que oferecem 60 mil dólares para cuidar de um marmanjo por dois meses. A senhora McVay havia me explicado que ele apenas precisava de companhia, já que prometera ficar com a mãe, mas ela tinha uma viagem de negócios com o marido.

Estávamos jantando quando os patrões vieram se despedir. Eu lhes disse que não precisavam se preocupar, que o filho deles estaria em boas mãos. Eles ficaram aliviados com meu esforço. Judith, a empregada mais velha, os acompanhou até o carro, enquanto Jasmim ficava me fazendo companhia. Ela tinha o cabelo curto, a pele morena, e seus lábios pareciam inchados.

— Ele ainda não saiu do quarto? — perguntei, curiosa pelo fato de ele não ter descido para se despedir dos pais. Fiquei ainda mais intrigada quando Jasmim fez uma expressão de desaprovação.

— Ele nunca sai de lá. Geralmente, vem às onze da noite para comer — ela comentou. Eu tinha tantas perguntas, mas sabia que estava quase na hora de ela ir embora. — Você precisa saber de algo — continuou falando.

— O quê? — fiquei assustada, pensando se ele seria algum tipo de assassino em série.

— Ele pode parecer bonzinho, mas não se engane — ela me avisou, mas Judith apareceu, e Jasmim rapidamente mudou de assunto. Logo, as duas foram embora. Tranquei a porta e subi para meu novo quarto.

Meu quarto era ao lado do do marmanjo. Não havia nenhum som vindo de lá; talvez ele nem estivesse em casa. Pensei em ir para a sala ver televisão. Fui para a cozinha, peguei a pipoca que havia comprado e coloquei para estourar no micro-ondas. Voltei para a sala, onde estava passando "Sr. e Sra. Smith". O filme é tão empolgante que, às vezes, eu até soltava uns gritinhos. Quando foi para o intervalo, ouvi alguém entrando na cozinha. Estava tudo escuro, mas havia barulhos. Fui andando pé ante pé, acendi a luz e revelei um homem — não um grandalhão, mas um homem, que, aliás, estava somente de calção.

— Desculpe, pensei que eu estivesse sozinha com o filho dos McVay — tentei me explicar. Mas ele me deu um olhar muito amedrontador. Não pude deixar de notar seus olhos; eram tão profundos que, por alguns segundos, fiquei perdida.

— O que fazes aqui? — ele perguntou, de forma rude, com uma voz grave que me deu arrepios.

— Estou aqui para cuidar do filho dos McVay...

— Poupe-me dessa explicação. Quero saber o que fazes aqui na sala. Deverias ir para o quarto. Você é uma empregada, não uma visita — essa eu não esperava; que patético.

— Tudo bem. Se você vir o filho deles, diga-lhe que, se precisar de algo, é só me chamar — disse, colocando o pote de pipoca na pia. O homem abriu a geladeira e tirou uma garrafa de água.

— Pelo menos você sabe onde estão meus remédios? — sua voz mudou para um tom totalmente simpático. Então, ele era o tal Matthew... Fiquei um pouco tensa por ele aparentar ser mais velho que eu.

— Estão aqui — respondi, abrindo o armário que ficava ao lado do balcão. Retirei os dois remédios enquanto ele esperava. Ele os pegou de minhas mãos, sendo um pouco rude.

— Obrigado, agora pode ir ao seu aposento — a rigidez voltou à sua voz. Eu não pensei duas vezes antes de deixar a cozinha. Desliguei a TV na sala e subi para o quarto.

Talvez seja só dar os remédios; não preciso me preocupar. Aquele homem me intimidou. Se ele não fosse tão estúpido, eu poderia achá-lo bonito, mas o jeito que me tratou fez com que eu não gostasse nem um pouco dele.

Durante a noite, não consigo dormir direito; o barulho do quarto dele é insuportável. Havia uma música de rock muito alta. Coloquei os travesseiros sobre meu rosto para abafar o som, mas não adiantou. O ritmo era insuportável. Como alguém consegue ouvir algo tão alto assim a essa hora?

Depois de umas quatro horas, rezando para que ele diminuísse a maldita música, me revolto e resolvo ir até o quarto dele. Bato na porta várias vezes, ele não abre e ainda aumenta o volume. Começo a chutar a porta com muito mais força. Ela é aberta, revelando um homem furioso.

— Você poderia, por favor, abaixar o volume da música? Preciso acordar amanhã de manhã! — quase grito, por causa daquele som irritante.

— Está lhe incomodando? — ele sorri diabolicamente. Meu estômago cria sensações que eu não deveria estar sentindo. Seria medo?

— Eu preciso dormir; se puder pelo menos abaixar...

— Os incomodados que se retirem — ele bate a porta na minha cara, literalmente.

Vou ao banheiro, olho-me no espelho e vejo uma marca roxa na minha testa. Eu não podia desistir; 60 mil dólares estavam em jogo. Pego meu travesseiro e edredom, vou para o sofá e acabo dormindo ali mesmo, como no quarto daquele idiota.

Querida BabáOnde histórias criam vida. Descubra agora