|Cap. 4|

501 26 0
                                    

O sol que se deita ainda consegue banhar de alaranjado meu rosto. Respirar depois das afrontas passadas nos aposentos de Mirha ou das descaradas propostas feitas pelo Senhor da casa me trazem um delicioso momento de paz. Pensar sobre minha vinda para essas terras altas, sobre o significado de tudo isso à minha volta fazem rebuliços dentro de mim. Minha cabeça dói por não saber a resposta, dói por tantas coisas sempre incompreendidas. Dói pelos homens que acham que nós mulheres somos menos, somos frágeis e não saberemos como lidar. Meu espirito pesa ao relembrar os olhos assustados de Mirha, e ao saber que algum passado tão obscuro já se apossou dos olhos daqueles que eu mais amo. Meu coração se vê apertado pelo destino dos meus irmãos, pelo destino traçado para cada um deles, pelo sofrimento entregue para almas que merecem apenas amor.

–– O que acontece, Princesa? Seus olhos são como os de uma jovem desafortunada.

–– São olhos de alguém que apenas não entende o motivo de o destino ser tão cruel com quem não parece merecer. –– meus lábios conseguem desprender as palavras que tanto rasgaram meu coração quando reconheço a voz estranhamente suave do homem ao meu lado. –– Mas e você, meu senhor, o que faz aqui? Não havia coisas importantes que necessitavam toda sua atenção?

–– Gosto de estar dentro da minha casa ao por do sol e poder desfrutar adequadamente de um bom jantar com amigos e uma boa noite de sono. Para a senhorita esses sejam odiosos momentos, já que está tão acostumada com a vida na alta sociedade. Mas para mim, aquilo que agrada aos ricos e nobres é sempre insuportável.

–– Você e André são como bichos do mato, sempre desaparecendo perante qualquer contato social. Sempre buscando uma senhorita disposta para suas tão agradáveis "noites de sono".

–– Creio que seu irmão seja um homem do mar, um verdadeiro pirata abrindo caminho constante em águas salgadas. Eu, por outro lado, sou apenas um rico fazendeiro que gosta de silêncio e descanso. Mas sobre destinos cruéis, talvez eu possa ficar do seu lado nesta perspectiva. A vida parece ser sempre mais dura para aqueles mais puros, porém, ela só recai sobre os ombros dos mais fortes. –– sua voz é firme, me levando a tentar acreditar em cada uma de suas palavras. Me levando a enxergar a força no espírito da família que amo e me deixando mais aliviada com a memória do passado que sempre se estende perante meus olhos e me fazem ver o quão tola, patética e livre pude ser durante os meus tempos de ouro. Ouro que foi como o mais quente e escuro inferno vivido por André e Mikhail.

–– Senhor, devo crer em suas palavras ou está apenas tentando acalentar o pobre coração desta delicada e bonita dama? –– tento um gracejo perante o tempo tão nublado que havia se formado. Meus olhos buscam ganhar a mesma verdade que tão facilmente se estenderam por minha boca e, olhando para o enorme e atraente homem ao meu lado, busco, também, desfazer a vontade latente e triste que seus olhos desprendem ao tentar acreditar nas próprias palavras.

–– Não ousaria mentir para tão adorável dama. –– diz ao entrar na brincadeira.

–– Mas o senhor parece ser alguém que tem facilidade em mentir quando se trata de enganar o fiel coração de uma jovem. –– provoco coquete.

–– Jovens não são fieis, elas são como aves de rapina em sua velocidade assustadora para um belo ataque e sua sedutora inclinação para os mais frágeis e desatentos homens.

–– Jovens, meu caro senhor, se posso lhe dizer com base na experiência, são os seres frágeis explorados pela sociedade e sempre pelas mãos de algum homem. Jovens. Velhas. Mulheres. Todas nós somos vítimas. Vocês são apenas aqueles que a fortuna talvez não permitiu tão bem decidir, nós somos quem nunca teve se quer o vislumbre desta possibilidade.

–– Por Deus, Helena! Estava apenas brincando. –– diz ao me encarar profundamente. –– Mas se acredita ter tão poucas escolhas, como consegue explicar o fato de ter trinta anos e não ser casada?

–– Não está fazendo perguntas um tanto quanto inapropriadas, Bjornar?! –– pergunto ousada ao me apropriar de seus primeiro nome, me permitindo uma intimidade audaz e não me recuando em nada quando seus olhos me fitam ainda mais quentes e ainda mais divertidos com toda a situação.

–– Em Londres ou Moscou este seria um assunto nunca comentado, mas aqui as regras não são validas e as relações intimas podem ser melhor e amplamente desenvolvidas. –– seus olhos piscam e suas lábios se levantam em um sorriso provocante perante as audácias que sempre seguem presentes em nossas conversas. –– Não que lugares tão finos e educados tenham contido minha língua atrevida. Em realidade, apenas quando a uso para outros fins é que paro de declarar meus selvagens sentimentos em voz alta.

–– Oh! Você é inacreditável! –– digo envergonhada por suas palavras. –– Mas, por favor, por que veio até aqui? Estamos conversando sobre assuntos tão dispersos durante todo esse tempo. Há algo que queria comunicar ou perguntar?

–– Sendo tão direta assim não posso negar lhe responder, princesa. –– seu riso cristalino e nada envergonhado retumba a nossa volta. –– Pretendo sair pelos próximos dois dias em uma cavalgada pelas terras ao norte, verificar as provisões de comida e reformas que precisam ser feitas antes do inverno, assim deixarei que Boghie lhe faça companhia enquanto não estou presente.

–– Mas tão logo?! Não pode esperar para que tenha um pouco mais de contato com a casa e seus moradores? Sei que faz uns pares de dias que estou vivendo aqui, mas não me foi dada muitas oportunidades de conhecer seus costumes e nem mesmo saber sobre o trabalho que realmente devo fazer. –– o confronto numa mistura de desespero e certa raiva que segue brotando em meu interior.

–– Não se preocupe, Helena, deixarei ordens com os empregados da casa e meu homem de confiança estará sempre presente. Sobre Mirha, espere meu retorno e eu prometo que teremos uma conversa séria e longa sobre o tema. Por hora, apenas fique com saudades de seus belo cavalheiro.

–– Não me faça rir, Viking! –– o provoco em um suspiro enquanto agilmente corro para dentro da casa. Meus pés batem no chão num pedido de mais agilidade e meu coração descompassa ao mesmo tempo que um riso frouxo toma conta de minha boca. Provocá-lo me dá um prazer sempre crescente.

☆ Gostou do capítulo? CURTA E COMENTE, sua participação é muito bem vinda!☆

Desejo VikingOnde histórias criam vida. Descubra agora