Capítulo 48

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* Aviso de possível gatilho: Contém maltrato de menor, porém sem agressão física. Não leia, se não se sentir à vontade.        

          Danielle parte 3

      — Danielle?! — a expressão de assombro recém  surgida no rosto do Laerte me revolveu por dentro. Eu estava a ponto de perder o ar.

      — Vai dizer que não lembra? — desafiei-o. — Não tá me reconhecendo? Eu sou a menina órfã que você e a Suki jogaram na estrada pra morrer de frio. 

      — Não! — ele se levantou como um raio, pálido como uma estátua de basalto, enrolando todas as miçangas, brincos e pulseiras como um rocambole — Você tá louca, garota! Eu não sei do que você tá falando… Eu não conheço nenhuma Danielle.

      Me apressei em segurar o braço dele ao ver que se preparava para sair correndo. Puxando-o com uma força que não sei de onde tirei, o fiz me olhar.

      — Vai fugir que nem um covarde? Eu tenho muita coisa pra te dizer e você vai me escutar.

      Sustentei meu olhar no dele, que entreabriu a boca. Que decadência. Aquele cara, por quem meu ressentimento adormecido agora despertava com tudo, não era nem sombra do homem elegante e refinado que um dia foi.

      Não sei que caminhos sua vida seguiu depois que me abandonou, imagino que deve ter passado por muita coisa.

      — Danny…! — ele balbuciou, meneando a cabeça.

      Num átimo, ele se soltou da minha pegada e sai em seu encalço quando ele se infiltrou entre os transeuntes da feira. Eu era rápida, mas ele conseguiu se camuflar e fugiu.

      — Bosta! — gritei, levando as mãos à cabeça.

      Andei de volta ao começo da feira, meus olhos marejados e minha respiração ofegando. Um súbito mal estar se apossou de mim acompanhado de uma vontade incontrolável de cair de joelhos e chorar.

      Não podia estar acontecendo.

      Minhas mãos se cruzaram sobre meu peito na vã tentativa de abafar as batidas furiosas do meu coração, todo o meu corpo perdia vigor quando outras lembranças tristes se infiltravam na minha mente.

      Flashback on:

      — O que vocês pensam que estão fazendo? — perguntei furiosa ao ver o Laerte e a inútil da Suki “se pegando” no sofá da sala da casa que pertencia a minha mãe. — Não estão vendo que tem uma criança aqui?

      Laerte saiu de cima da minha madrasta, me olhando com um semblante envergonhado, porque acabou percebendo a indecência de seu comportamento com a companheira. A reação corporal da Suki foi bem diferente da dele. Seus olhos tinham maldade, me fuzilaram com uma voltagem de cinismo ácido que me deixou mais brava. Ela debochava. 

      Fazia dois meses que eles estavam juntos e quatro que minha mãe havia morrido, e eu ainda sofria com o vazio que ela deixou, e que até hoje não está totalmente preenchido.

      — Sossega, sardentinha — Suki veio até mim, afagou com um falso carinho minha cabeça pelada.

      — Não me chame de sardentinha! Eu não te dei intimidade pra isso! — repeli sua mão pra longe.

      — Mas sua mãe te chamava assim.

      — Mas tu não é a minha mãe e eu não aceito que tu me chames por um apelido que só ela podia me chamar! Tu nunca vai ocupar o lugar dela, Suki! Nunca!

      — Danny — Laerte se interferiu —, não seja grossa com a Suki.

      — E tu, Laerte? Como pôde trazer essa mulher pra dentro da casa que foi da minha mãe?

      — Você disse bem — sua voz agora tinha energia. — Foi da sua mãe. Mas ela não está mais aqui, ela se foi. Eu sou o viúvo dela, fomos casados em comunhão de bens, e eu tenho direito sobre esta casa. Logo, trago quem quiser para morar comigo. E eu sou seu pai legal.

      — Cale a boca! — explodi. — Não encha essa boca pra falar que é pai, porque tu não é! Tu só é o cara que se casou com a minha mãe e virou meu padrasto! O Daniel é o meu pai!

      — Chega, Danielle Raluca!

      — Do mesmo jeito que nenhuma mulher vai tomar o lugar da minha mãe, tu nunca vai tomar o lugar do meu pai! Nunca! Nunca!

      — Olha aqui garota, eu… — o cara que me privou de viver com meu pai avançou ameacadoramente em minha direção

      — Vai me bater? — eu o desafiei, projetando meu queixo pra frente.

DanielleWo Geschichten leben. Entdecke jetzt