Vítor Hugo
Sempre que eu não me sentia à vontade pra puxar um assunto sério com alguém, recorria a qualquer artifício, como olhar para o céu, o horizonte, qualquer coisa. Minha garganta tinha um tipo de embargo, um aperto, e as palavras martelavam na minha cabeça, pedindo pra serem postas pra fora.
Danielle tinha a mesma serenidade de sempre, mas eu podia sentir um pouco de impaciência em seus olhos. Ela me pedia através deles que eu fôsse direto ao assunto. Eu precisava abrir a boca, pedir uma resposta definitiva dela, e assim, decidir o que eu faria dali pra frente.
Nas quase duas semanas que passamos juntos, tive a chance de conhecer a Danielle por trás da filha do Cisne Branco, a Danielle que como eu perseguia um ideal de vida, que sempre renascia das cinzas como uma fênix chamejante e nunca desistia. Aprendi muitas lições de vida. Também aprendi a me conhecer. Enxerguei melhor minhas fraquezas, evolui, tomei decisões importantes.
Eu devia muita coisa a ela. Aquela moça de olhos azuis e sorriso triste, de coração generoso e bom, que amava dançar e não tinha medo de encarar desafios, era como uma droga pra mim, um vício, e não importava o que Duda tinha contado a respeito dela: pra mim não mudava nada.
Ela não queria um compromisso sério com ninguém, somente casualidades. E eu não queria mais isso. Saber que ela e a Duda já fizeram sexo, e também com a Nicole, saber que ela encarava a vida como diversão, me obrigou a exigir de mim mesmo uma decisão.
Várias vezes ela falou com todas as letras que não queria, que tinha muito o que dançar, muito o que viver, e no fundo eu entendia que eu também devia querer isso, mas era tão difícil aceitar uma negativa. Por que as coisas tinham que ser complicadas entre nós?
O rosto dela me transmitia uma paz e uma quietude que me desconcertavam. Por um momento pensei em não dizer nada. Deixar o assunto morrer e só falar aleatoriedades, como sempre fazíamos para entrar num campo delicado.
Sentado ao lado dela num banco de concreto de uma pracinha perto do hostel, soltei um suspiro, a olhei, sendo retribuído com um meio sorriso.
— O que foi? — ela perguntou.
— O curso de verão está terminando e vamos nos despedir — respondi.
— Duas semanas passaram voando, não é? Parece que foi ontem que chegamos.
— Ainda bem que temos mais uma semana — lembrei.
Danny concordou com um aceno.
— Daqui a alguns dias vou dançar na Suíça, e depois vou estudar na Inglaterra — continuei. — E a Europa vai ser minha casa pelos próximos anos.
— Eu tô feliz por você — ela sorriu segurando minha mão. — Vou sentir sua falta. Vou torcer pra que você realize seu sonho.
Assenti com um meio sorriso.
— Queria realizar esse sonho ao lado da pessoa que eu amo — esperei ela responder, e como ela se calou, continuei. — Queria que você estivesse comigo lá e que fôssemos um casal.
— Já falamos sobre isso…
— Sim, falamos. Você falou que é muito nova pra namorar, que só quer sexo casual. Eu entendi bem.
— E que não acredito em namoro virtual. Que duas pessoas precisam se tocar, se abraçar, fazer amor pra que uma relação vá pra frente.
— Sim. Me lembro. Mas é isso mesmo que você quer? Que a gente não tenha uma chance?
— Como assim?
— Do que você tem medo, Danny?
— Medo?
— O que eu preciso fazer pra você me deixar viver aqui? — ao dizer isso, toquei o seio esquerdo dela com o indicador.
A bailarina virou o rosto para a direção contrária, ligeiramente pra baixo. Toquei com minha mão o queixo dela, o puxando pra mim e vi um olhar confuso, aflito.
— Por quê, Danny? — insisti. — Por que não podemos namorar?
— Eu já disse...
— Por causa da distância? Eu não vou, então.
— O que está dizendo?
— Eu não vou para Londres. Eu fico. Londres foi mesmo ideia da Agatha, ela que achou que o Royal Theatre se encaixava ao meu perfil e tal, mas eu não vou conseguir tomar chá ao invés de café. Eu desisto de Londres pra ficar com você.
Segurei as mãos de Danielle por entre as minhas e prestei atenção a cada movimento de seu corpo.
— Não pode estar falando sério, Vítor Hugo — Danielle balançou a cabeça negativamente.
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Danielle
RomancePara Danielle, nada é mais importante do que o balé. Seu sonho é dançar nos maiores palcos do mundo e superar sua mãe, a lendária Françoise Shushunova, o Cisne Branco, um mito da dança clássica. Durante uma competição de dança em Ribeirão Preto...