Capítulo 5

569 114 1.7K
                                    


           Vítor Hugo

      — Você tem muito jeito com crianças — observei, e a loura de sardas corou no mesmo instante. Eu já estava me acostumando a vê-la ficar assim.

      — Eu gosto de ajudar — ela sorriu. — Também tive a idade dessas meninas, e sei o que é ficar meio perdida antes de uma apresentação. Procuro sempre tranquilizá-las, brincar com elas e conversar.

      — E também gostou delas, né?

      — Olha essas meninas lindas, não dá vontade de levar pra casa? — Danny respondeu, com uma expressão terna e brincalhona.

      — São muito fofas, sim.

      — Quando as aulas voltarem, eu vou dar aula para alunas de primeiro grau às terças e quintas, e de baby class aos sábados.

      — Nossa, que legal. Você vai ser professora das pequenas, então. É bom, porque assim elas vão ter uma ótima referência, uma professora que dança bem.

      — Sem falar que vou ganhar meu próprio dinheiro. Tô super ansiosa para que fevereiro chegue logo, já tenho todo o material teórico e prático que vou usar nas aulas.

      — Mande pra mim um vídeo de você dando aula, tá?

      Danielle fez um “jóinha”.

      Me ocorreu então que não trocamos telefone. Soltei uma risada, e ela pareceu entender o motivo. Riu também, passando os dedos no cabelo.

      — Passe seu telefone.

      Desbloqueei a tela e entreguei meu Samsung J2 para a garota. Enquanto ela teclava no meu aparelho, reparei melhor em seus olhos azuis claros, vikings. Azuis como um céu limpo em começo de manhã, com contornos pretos.

      Danielle podia ter o namorado que quisesse. Não era linda só por fora. A beleza dela vinha de dentro.

      O celular da bailarina tocou, era a Canção da Fada Açucarada. Devolveu meu aparelho e abriu seu iPhone para salvar meu número.

      — Salva meu contato. Depois te mando meu Instagram. Facebook já não posso adicionar mais ninguém, atingi o número limite de amigos.

      — Huummm... Moça popular, né?

      — Até que sou. Ah, eu também tenho um canal no YouTube, onde ensino passos de balé. Se quiser, acompanhe meus vídeos e dá um jóinha, tá? Quer dizer..., não que você precise…, mas só pra dar uma ajuda pro canal crescer.

      Revirei os olhos e assenti, sorrindo. Como numa repetição de cenas de seriados adolescentes, ficamos como dois bobos olhando um para o outro, num impasse chato. 

      Por alguma razão, comecei a ter uma vontade muito grande de ser bem mais que um amigo dela, e que eu não sabia explicar. E essa vontade não tinha origem só na beleza dela, mas em sua bondade, sorriso e vontade de sempre ajudar. Ela parecia não pertencer àquele mundo tão cheio de rivalidades e coisas muitas vezes desleais.

      Eu não sabia como continuar a conversa com a garota sem que eu dissesse algo idiota sem querer.

      — Tia Danny, vem dar aquecimento pra gente? — uma garotinha com collant vermelho puxou a garota loura pela mão.

      Respirei aliviado. Salvo pelas “alunas/fãs” da sardentinha.

      — Claro, vou sim.

       Ela se sentou no chão ladeada por três pequenas bailarinas de cada lado, com as pernas bem esticadas.

      — Vamos esticar os pezinhos alternadamente. Mãos na cintura. Cabeça reta, aquele fiozinho puxando  nossa cabeça pra cima.

      Era tão singelo ver a Danny ensinando as pequenas… Ela tinha paciência e era simpática. Seria uma ótima professora.

       — Pés em flex. A gente vira a cabeça para a esquerda, com as mãos na cintura, e vai esticar o pé direito. Assim — Danny exemplificou, esticando seu pé direito. E era um pé absurdamente alongado, porque os dedos tocaram o chão como se fossem de borracha. — Passa pelo metatarso e estica. Volta. E faz com o esquerdo.

      As pequenas assentiram, risonhas.

       — Flex. Meia ponta. Dedos estica. Meia ponta. Flex.

      Danielle dizia “dedos estica” num tom agudo, quase cantando.

      Pena eu não poder ficar pra ver até o final.

      Faltava cinco minutos para o início da segunda noite do festival e eu tinha que me vestir para minha apresentação especial.

      Dei cinco passos e dei de cara com a Micaela, já caracterizada como Esmeralda, a variação que iria dançar. Seu olhar era pura maldade, que não combinava com seu rosto tão bonito.

DanielleWhere stories live. Discover now