Capítulo 45

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          Vítor Hugo

      O que aconteceu horas depois foi o desfecho perfeito para um homem perverso que destruiu muitas jovens vidas e a redenção de um garoto ingênuo que durante um ano sofreu abuso e dominação psicológica do mesmo.

      A Polícia invadiu o hotel onde Beto Corrêa estava hospedado lhe dando voz de prisão e o tirou dali algemado. Em seu notebook apreendido, foram encontradas fotos e vídeos de garotos contra os quais cometeu abuso. O mais triste é que dois desses ex-bailarinos estavam internados em clínicas, com problemas emocionais e para sempre afastados dosu palcos. Como eu temia, vídeos íntimos das minhas transas com ele estavam lá.

      O pedido de habeas corpus feito pelo advogado do manager da Alliance foi negado e Beto iria pagar caro por tantos sonhos que destruiu, tantos jovens bailarinos que interromperam brilhantes carreiras artísticas por causa de seus ardis.

      Nunca mais ele iria perverter um jovem. Ele estava acabado. Minha parte estava feita.

      Assim que a Danny e eu saímos da cozinha da escola (obviamente depois de limparmos o chão), meu celular tocou várias vezes. Eram Agatha, Micaela, meus colegas de balé de Jundiaí, todos querendo saber como eu estava. No fundo, queriam saber quais foram os motivos que me levaram a aceitar ser abusado pelo Beto e porque eu não contara a ninguém.

      Danielle e eu saímos apressados para um parque cheio de árvores, com quiosques no meio dele, e ela sentiu meu estado emocional. Enganchou seu braço ao meu e seus olhos amorosos me deram o apoio que eu precisava pra não cair.

      — Eu tô aqui. Não vou te deixar sozinho.

      — Desculpa…! — desviei meu olhar do dela, para ela não me ver chorar.

      Me puxando pelo queixo, ela selou meus lábios acarinhando meu rosto, e esse gesto me devolveu o chão. Compreendi de novo que eu era dependente dela e que por mais que eu tentasse, não seria fácil ter que ir embora sem ela.

      — Não é vergonha nenhuma chorar — ela sorriu. — As lágrimas limpam a gente por dentro.

      — Eu queria ser forte como você, Danielle.

      — Não sou tão forte assim. Também sou emotiva.

      — Nada te derruba. Não importa o que aconteça, você está sempre em pé, sempre sorrindo, sempre vendo uma possibilidade boa em tudo. Eu queria ser assim.

      — Mas você pode.

      — Não.

      Abaixei a cabeça, a escondendo entre meus joelhos e pondo as mãos na nuca.

      — Eu não tenho essa tua força, esse teu otimismo — admiti. — Eu não sei nem o que fazer assim que meus pais souberem. Não sei o que dizer. Não sei... — balancei a cabeça de um lado para o outro. Um nó na garganta dificultava minha respiração.

      O toque da mão da Danielle nas minhas costas me fez ficar ereto de novo. Seus olhos puros e doces se prenderam aos meus, um sorriso pendia de seus lábios carnudos.

      — Não tenha medo. Abra seu coração pra eles. Tudo vai ficar bem.

      A loura segurou minha mão com força e a beijou, e passou o indicador na maçã do meu rosto.

      — O pior já passou, Vítor. Agora é seguir em frente. Claro que não vai ser fácil, vai ser um caminho difícil, mas você tem pessoas que te amam e vão estar com você sempre.

      — Eu vou ficar do seu lado. Como uma amiga — ela prometeu solenemente.

      Respondi à declaração de apoio da garota com um meio sorriso. Era bom saber que eu tinha uma amiga com quem contar, embora amizade fôsse pouco pra mim. Eu queria mais do que ser um amigo. Queria ser alguém especial de verdade pra ela.

      Mas naquele momento, em que eu estava desestabilizado, sem saber pra onde ir ou o que fazer pra enfrentar as consequências, essas palavras me deram conforto. Vencido pela emoção, aceitei seu braço e pousei meu queixo em seu ombro.

                                   …

      Meus pais chegaram a Ribeirão Preto na manhã do dia seguinte. A conversa que tive com eles na noite passada por vídeo chamada provocou momentos de tensão, vi pela tela suas expressões indecifráveis e meu pai soltou vários palavrões quando contei que o homem que jantou na nossa casa duas vezes era quem abusava de mim. Minha mãe levou as mãos diante da boca e começou a chorar, me levando a um pranto convulsivo.

      — Como isso foi acontecer, garoto? — meu pai quis saber, elevando a voz em uma oitava ao se recobrar do choque.

      Naquela altura, não tive presença de espírito ou equilíbrio para explicar. 

DanielleTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang