* Aviso de gatilho. A última parte deste capítulo contém a descrição crua de um acidente. Um segundo aviso em negrito recomendará para pular adiante, caso não se sinta a vontade para prosseguir. Grato.
Vítor Hugo
— O senhor tá maluco, tio? — gritei, enquanto acima de nós, numa sacada com grades de um terraço, um velhinho de bochechas rechonchudas segurava um balde. Duas crianças pequenas abraçavam suas pernas.
— Cale a boca e vão embora! — o velho explodiu. — Antes era só a cachorrada que acasalava aqui! Eu quase tive um infarto quando meu netinho de quatro anos contou que tinha um homem e uma mulher se agarrando debaixo da minha janela! Se querem fazer sem vergonhíce, vão pra outro lugar!
Eu mostrei o dedo do meio e já ia responder com alguns impropérios, mas Danny me puxou pela mão.
— Que velho babaca! — puxei a camisa com os dedos, e a água escorreu para baixo.
— Não acredito que isso esteja acontecendo comigo. Que ódio! — Danny fez cara de choro, fechando os punhos e pisoteando a calçada.
Nós dois estávamos ensopados.
Merda! Não era o desfecho que eu esperava para o beijo que eu roubei da bailarina. Eu queria que tivesse terminado bom pra nós dois, e não numa ducha fria.
— Dá tempo de voltar à escola e pegar outra muda de roupa — sugeri.
— É claro que vou vestir outra roupa. Acha que vou assim para o teatro? Que ódiooooooo! Ele molhou meu cabelo…!
— Ô garota, sem drama, está bem? Foi só um banho, e está calor. Relaxa.
Em resposta ao meu sorriso irônico, Danielle parou e me fuzilou com um par de olhos furiosos. Escrevi uma nota mental a fim de não esquecer: meninas odeiam que molhem seu cabelo.
— A culpa é sua — a loura me deu vários socos no peito, trincando os dentes. — Me agarrando, me beijando desse jeito, como se eu fosse uma qualquer.
— Menos — segurei-lhe os punhos— Você gostou.
— Gostei, ô… — ela se soltou e continuou me socando sem dó até se cansar. — Olha em que estado fiquei. Toda molhada.
— Danny…
Ela pôs o indicador nos lábios, me pedindo silêncio.
— Chega, tá? Deu pra ti.
E saiu andando apressadamente. Mantive uma distância de três metros atrás, para não perdê-la de vista.
— Puxa, Danny, estávamos nos dando tão bem. Não acredito que tu vai ficar com raiva de mim por causa de um velho ranzinza que não beija mais.
Danielle estacou no lugar como se uma corda a tivesse enlaçado pela cintura, e também parei, assim que ela se virou. Seus olhos eram de absoluta descrença.
— Eu não sei qual é o teu problema, Vítor Hugo. Você complica tudo, mistura as coisas, faz tudo errado.
— O que eu tô confundindo? — o teor cortante das palavras dela me intrigou.
Mas ela não respondeu.
Minha boca esboçou um sorriso com uma pitada de ironia e desdém. Que nada a ver! Eu não estava confundindo nada. Será que aquela garota achava que eu estava me iludindo com algo mais sério com ela? Desde quando para um cara beijar uma garota é preciso haver tanto sentimento? Eu queria um beijo e consegui, e mesmo que a loura de sardas estivesse puta comigo pelo banho que tomamos, ela gostou.
— Eu não te entendo — meneei a cabeça.
— Não é pra entender. Só fica longe de mim por hoje.
— Eu vou com você, espera — pedi, ao vê-la andar um passo.
— Não precisa — ela se virou para mim com os punhos fechados —, eu conheço o caminho.
— Danny...
— Me deixa — ela se virou pra mim com os punhos fechados.
Vendo-a andando torcendo a barra da camiseta para a água escoar, cruzei os braços e ri.
🎼
Minha coreografia contemporânea foi assinada por um artista uruguaio, amigo da Agatha, e com ela ganhei vários prêmios. A primeira parte da marcação de palco foi reservado para os alunos do núcleo infantil, a segunda para os bailarinos da categoria sênior, e a terceira, para os da júnior.
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Danielle
RomancePara Danielle, nada é mais importante do que o balé. Seu sonho é dançar nos maiores palcos do mundo e superar sua mãe, a lendária Françoise Shushunova, o Cisne Branco, um mito da dança clássica. Durante uma competição de dança em Ribeirão Preto...