Capítulo 54

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          Danielle

      Enquanto eu olhava para o semblante sereno e alegre do bailarino, meu rosto se aquecia e se ruborizava, como sempre acontecia quando estávamos juntos. Era uma sensação gostosa, indefinível, muito mais carnal que afetiva, mas também com sentimento.

      O jeito carinhoso que ele pôs uma colherada de bolo na minha boca, lembrando um pai que faz com uma filha pequena, foi bem engraçada.

      Até o momento do beijo.

      Não queria pensar em sexo logo cedo, afinal, minha cabeça precisava se focar cem por cento no ensaio do Pas de Quatre. Deus me livre fazer uma aula cagada como ontem.

      — Está tudo bem?

      Pisquei balançando a cabeça, terminando de acordar do sonho. Essa é a melhor sensação que achei para o beijo. Um sonho. Um sonho lindo, de adolescente boba, mas que precisava se desvanecer pra dar lugar às realidade.

      — Tô bem — sorri. — Vamos para a aula?

      — Falta uma hora ainda — Vítor Hugo objetou.

      — Mas eu quero fazer alguns minutos de alongamento. Hoje de manhã não fiz, já que meu pai voltou pra São Paulo.

      — Ah! — ele fez com surpresa. — Pensei que ele fôsse ficar pra assistir o espetáculo — o desapontamento dele virou euforia rapidamente. — Então, você vai dormir de novo no alojamento?

      — Não. Vou dormir num quarto duplo feminino.

      Vitor Hugo fez uma careta de desgosto profundo, muito divertida. Eu imaginei porque ele queria que eu voltasse para junto dos meus colegas, e pra ser sincera, também queria. Cada minuto ao lado dele, apreciando sua companhia tão agradável, me proporcionava sensações gostosas. Tínhamos um elo muito forte, que eu não sabia explicar.

      — Por que essa cara? — perguntei rindo.

      — Tenho que falar? — ele apoiou o cotovelo na mesa e descansou o queixo no punho fechado, me fitando.

      — A gente se vê todo dia. 

      — Mas eu queria ficar mais tempo com você.

      Eu tinha medo de me machucar. Se eu me quebrasse em pedaços, quem além de mim me juntaria de novo?

      Semicerrei os lábios, minhas bochechas ainda sentindo o calor provocado pelo beijo, e segurando o queixo do bailarino, dei um beijo em retribuição ao seu gesto atrevido de um minuto atrás.

      Sempre acabavámos assim, quando não tínhamos mais palavras; acabou virando uma coisa rotineira. 

      Assumi o risco e me joguei no brilho que os olhos dele emitiam, e tudo o que vi foi mais do que suficiente para mostrar o quão fútil e egoísta eu era, por não me dar a chance de ser feliz com um cara que gostava de mim de verdade. Ele era tudo. Meu vício. O toque do corpo dele era como uma droga da qual eu não podia me abster por muito tempo, e eu sabia que eu também era como uma droga para ele.

      Por quê?

      — O que foi? — ele arqueou a sobrancelha esquerda de uma forma irritantemente sensual.

      Expeli o ar, olhando para o lado e passando os dedos no cabelo, tentando esconder meu desconforto. Mas acho que ele sabia, porque o sorriso se expandiu em triunfo. 

      Garotos são tão convencidos.

      — Não é certo mexer com as emoções de uma garota logo de manhã e com tanta gente olhando, Vítor Hugo — respondi com ironia.

      — Que culpa tenho de ser irresistível? — ele devolveu.

      — Você se acha, cara.

      — Mas bem que você gosta.

      — Gosto.

      Os dedos dele passearam delicadamente pelas maçãs do meu rosto e o toque fez meu coração acelerar o compasso. Sob minha camiseta larga da Promoarte, senti meus mamilos ficarem duros e antes que minha calcinha molhasse, me levantei.

      — É melhor a gente ir para a aula.

      De repente ele segurou meu punho e o olhei assustada.

      — Posso te pedir uma coisa? — o bailarino me fitou.

      Semiabri os lábios, minha respiração ficando tensa.

      — O que…?

      Dependendo do que fôsse, achei que eu não estivesse em condições de negar.

DanielleDonde viven las historias. Descúbrelo ahora