Capítulo XIX

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                            (Heitor)

   — Que é isso vovó? —. Perguntei assim que a vi guardando uma erva nos seus potes de chá.

   — É um chá que o Adamastor gosta, ele vai vir aqui hoje —. Eu já estava me sentindo incomodado com a persistente presença daquele velhote aqui por casa.

  — Vó, não acha que está dando atenção demais a ele? —. Era cedo de manhã, eu já está saindo para ir para o batalhão.

  — Por que? —. Me encarou bem seria. Como se quisesse dizer que ela quem cuidava de sua vida.

  — Não sei, mas a senhora é uma mulher de idade e não acho adequado... —.

  — Olha Heitor, acho bom você me respeitar, eu que te criei, não inverta os papéis —. Ela disse calma, porém claramente aborrecida.

  — Não estou lhe faltando o respeito, só acho que não deveria dar atenção àquele cara —.

  — Por que? —.

  — Porque acho que a senhora esqueceu do meu avô —.

  — Heitor, isso não é da sua conta, e mais... —. Ela não conseguiu terminar o que diria, e então saiu para o jardim, onde ficou debaixo de uma árvore, de braços cruzados.

  Agora pronto, ele estava chorando e era por minha causa, na verdade por conta do velhote.

  — Não chora, sabe que odeio ver você triste —.

  — Você pensa que esqueci ele? Pensa? — Sua voz estava já melosa, por conta do choro que caía abundante — Não se passa um dia que não me lembro dele —.

  — Eu também sinto a falta dele, por isso quero que tudo permaneça da maneira como ele deixou —.

  — Vai trabalhar Heitor, me deixa sozinha —. Falou, em seguida caminhou um pouco mais a frente.

  — Eu te amo vó —. Digo antes de ir embora, agora pronto, meu dia estaria estragado. Não sei por que, mas eu não gostava do Adamastor, ele deixava bem claro que queria substituir o lugar do meu avô. Mas nunca isso aconteceria, porque eu não deixaria de maneira alguma.

  Olhei para trás, e vi ela com uma margarida nas mãos, ela amava aquela flor, pois foi a primeira que meu avô lhe deu, quando eles se conheceram no colégio há muito tempo.

  A dona Olga era uma senhora bastante sensível, e também emotiva. Gostava demais de se preocupar com quem amava, por isso me protegia bastante, com medo que eu morresse também. Eu nunca quero deixá-la sozinha, quero estar ao seu lado, até... Prefiro não dizer até quando.

   Já eu Heitor, era uma pessoa que defendiam quem eu amava com unhas e dentes, de qualquer um que nos ameaçar. Agora éramos apenas nós dois contra um mundo inteiro. E não havia razão para mudar isso.

   Hoje no trabalho, ajudei nas buscas por desaparecidos em um desabamento, foi tudo tão complicado, cansativo, e mesmo assim não encontrei nada além de muitos escombros.

  Nem fui para a academia, porque estava muito cansado, eu até que queria ver o Renan, mas isso eu não conseguiria. Então deixei para a próxima semana.

  Quando cheguei em casa, esbarrei com Adamastor sentado na mesa do jardim, minha vó estava com o álbum da família em mãos, lhe mostrando cada foto. Confesso que me deu certa raiva daquilo.

  — Então esse era seu marido jovem? —.

  — Sim, ele era muito bonito, essa foto foi quando ele começou a trabalhar em uma fábrica de sapatos —.

  — Ele me lembra seu neto, muitos parecidos, ambos fortes, acho que agora seu de onde puxou —. Apenas fui para meu quarto em silêncio, fui para minha cama. Peguei minha foto com meu avô e fiquei olhando por um bom tempo, relembrando tudo o que vivemos, eu sentia tanta saudade. Que nem cabia no meu peito.

                             (Renan)

   Eu procurava pelo bombeiro na academia, o esperei por bastante tempo, até mesmo depois de passar meu horário, mas ele não apareceu. Fiquei pensando sobre o que aconteceu ontem.
Será que ele quer sumir da minha vida? Assim, depois de termos feito amor?

  Fui para casa pensativo, todo mundo que passava na rua eu olhava bem o rosto na esperança que fosse ele. Mas não, nenhum deles era.

  Quando cheguei em casa, me deitei no sofá e fiquei olhando o teto, até que tive a ideia de ficar vigiando quem passava na esperança de vê-lo, mas não, ele simplesmente virou fumaça.

   Não entendo como isso aconteceu, talvez fosse apenas coisa da minha cabeça, mas mesmo assim não vê-lo depois de tudo que aconteceu ontem era extremamente agonizante.

  Foi então que percebi o quão envolvido eu estava nessa história, talvez esse fosse o sinal para que eu caia fora, e me dedique apenas ao ballet. Já que é ele que me dará um futuro.

  Olhei mil vezes a foto em que ele estava vestido para a apresentação, naquele terno azul escuro  e com aquela gravata vermelha. Ele parecia demais um duque, ou alguém de classe. Seu olhar tinha um coisa muito bonita, um brilho anormal, como um diamante exposto a um raio de sol.

  Daqui a três semanas eu iria a Manaus, para a apresentação, e para isso eu teria que me dedicar inteiramente ao ballet. Eu já me imaginava dançando naquele palco, com aquele teto sob minha cabeça.

  Espero vê-lo na próxima semana, pois acho que isso é algo que eu realmente preciso para minha vida, pelo menos para que eu possa continuar com paz na  minha mente.

   Naquela mesma noite, me sentei na varanda, e li um pouco mais sobre amor, o engraçado é que muitas coisas eram iguais na nossa conturbada e recente relação.

 
CONTINUA NO PRÓXIMO CAPÍTULO
 

 

 

 

  

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