Caminhos Cruzados

Capítulo 38 - Apoio inesperado.

KIRAZ
Eu estou perplexa com os últimos acontecimentos... Fui do céu ao inferno em segundos.
Eu estava bastante preocupada com o problema da licença. Não sei de onde veio essa denúncia em meu nome. Quem poderia ter feito algo assim? Com qual objetivo? Por que?
Tentei falar com Yalin, mas ele pareceu não me escutar, ficou inerte, como se estivesse em choque. Na verdade, todos estavam em choque...
O Senhor Carlo vendo a situação, me tirou dali e se ofereceu para me levar para casa. Em boa parte do trajeto, permanecemos calados, as lágrimas fluíam pelo meu rosto livremente. Ele me olhava, mas não dizia nada, parecia querer respeitar o meu tempo... Fui eu quem quebrou o silêncio.
K: O senhor sabe que eu não seria capaz de algo assim, não?! - Ele respirou fundo e com um sorriso benevolente, falou:
C: Kiraz, depois de uma certa idade, dificilmente nos enganamos a respeito de uma pessoa, por mais ardilosa e sedutora, que ela seja. Podemos nos enganar por um tempo, mas não o tempo todo e nem para sempre. Eu conheço seus pais, estou conhecendo você e sei da retidão de caráter deles e dos valores arraigados, que eles trazem e devem ter transmitido a vocês... É claro que os filhos tem livre arbítrio e podem fazer escolhas erradas, mas eu sou muito observador e costumo ter uma boa capacidade de julgamento. Posso ver, que algo assim, que atribuíram a você hoje, jamais partiria de alguém como  você...
K: Muito obrigada por acreditar em mim...
C: Não me agradeça, minha filha. Eu vejo, que além da sua criação, a sua postura não condiz, com esse tipo de atitude. Mas, principalmente, que esse tipo de atitude não lhe traria nenhum benefício, por mais ardilosa e mal caráter, que você fosse.
K: Sim, se eu fosse mal intencionada, ou quisesse obter alguma vantagem, qual benefício eu teria, fazendo essa denúncia? - Suspirei. - Mas, quem faria isso e por que? Porque não me pareceu algo vindo dos ativistas e ambientalistas, ou de pessoas focadas em derrubar o projeto... Olhando friamente parece algo plantado e, por pessoas muito próximas e conhecedoras de todos trâmites...
C: Exatamente, mas eu vou mais longe. Pareceu algo arquitetado para derrubar você! Para te desmoralizar... - Falou pensativo. -   Você tem algum inimigo? - Eu fiquei pensando e neguei.
K: Que eu saiba não! - Suspirei. - Eu estou muito grata pelo seu voto de confiança. Mas, muito chateada, por Yalin cogitar, que eu poderia agir assim...
C: Filha, foi tudo muito repentino e de certa forma convincente, porque veio de uma declaração do agente de um órgão do governo, que tem uma credibilidade... Mas, quem me garante, que qualquer pessoa não poderia fazer tal denúncia, usando o seu nome?!
Fiquei refletindo sobre isso e ele continuou...
C: O Yalin é um homem correto e muito rígido, nessa questão de valores.... Mas, não se trata apenas disso, ele é um homem quebrado. Você deve conhecer a história dele e da traição da ex namorada. Ela não o traiu apenas, ela foi cruel, pisou na auto estima dele. E ele, quando foi embora, não se distanciou apenas dela, mas também de nós, de sua casa, de tudo que ele amava... Foi sem olhar para trás e se reinventou, sabe-se lá como e, nunca mais (falou com ênfase), se envolveu com ninguém. - Falou com pesar. - Você, que já o conhece razoavelmente bem, consegue imaginar esse cara amoroso, sincero e carinhoso, sozinho em um país estranho, com cultura e valores, completamente diversos dos nossos, sem se envolver com absolutamente ninguém nos últimos 10 anos? Onde ele esteve escondido, como ele canalizou essa essência? De onde ele conseguiu tirar essa frieza? Eu que sou o pai dele, não consegui entender até hoje!
K: Eu compreendo senhor Carlo... Ele nunca entrou em detalhes, mas percebo o quanto ele deve ter sofrido... Mas, eu não sei como agir. Como fazê-lo acreditar? A confiança é crucial num relacionamento. Se ele não confiar em mim... - Ele me interrompeu.
C: Eu entendo você, perfeitamente... Mas, conheço meu filho o suficiente, para constatar o quanto ele ficou desnorteado. E foi por isso, que eu te tirei de lá. Para que ele não tivesse tempo de agir de forma impensada e se arrependesse depois. Porque quando ele cair em si e conseguir pensar com clareza, tenho certeza que irá juntar os pontos, concluindo o quanto as coisas estão fora de sintonia.
K: Eu não sei o que dizer, ou o que fazer... Mas, garanto ao senhor, que eu não fiz essa denúncia. Mesmo, que vocês estivessem errados, que eu discordasse de tudo, eu jamais o faria. Além disso, eu não trabalharia em algo que eu não acreditasse, ou que fosse contra os meus princípios.
C: Eu lembro o quanto você foi resistente e criteriosa, antes de aceitar esse trabalho... E tudo estava caminhando maravilhosamente bem, até então! Nós chegamos a conversar em família, sobre o quanto você é determinada e coerente com seus valores. Mesmo não sendo da sua alçada e desconhecendo as questões comerciais, você conseguiu transitar muito bem nas negociações, com a empresa de publicidade, por exemplo, sem perder de vista a parte técnica, ambiental e possíveis melindres, esperados nessa seara. - Eu sorri amargamente e respirei fundo.
Chegamos em casa, ele estacionou o carro e olhou para mim, esboçando um sorriso. Eu virei para ele e completei.
K: Confesso ao senhor, que eu jamais faria algo, que pudesse magoar o seu filho... Eu sofri muito, quando terminei com o meu ex noivo e não infringiria isso, nem ao meu pior inimigo, que dirá a ele... Eu sei que estamos juntos há pouco tempo, mas ele é muito importante para mim e eu não gostaria de perdê-lo. Eu o amo! - Ele sorriu e acariciou minha bochecha.
C: Filha, eu posso sentir o amor que existe entre vocês. Eu sei que ele também te ama, mesmo que ainda não consiga admitir isso... Tenha certeza de que eu e Sögull estaremos ao lado de vocês e faremos todo o possível, para esclarecer e desfazer esse mal entendido. Mas, eu te peço, conceda um tempo para ele digerir isso... Ele é cabeça dura, mas também é muito justo.
Nós nos abraçamos e eu saí do carro, com o coração apertado, apesar do apoio e das sábias palavras do meu sogro.