Capítulo 27

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- Vou tirá-los daqui.

Todo aquele fogo misturado em sentimentos de raiva e ódio, sensações de dor que me impediam de conseguir dormir, que poderiam explodir o mundo, queimá-lo até seu núcleo, até a última partícula viva, ganhou mais uma faísca para acompanhá-lo. A primeira que remete a algo bom de verdade: Esperança.

Lutar mesmo sabendo que tudo irá ruir é dever de um soldado, todos os outros no campo de batalha podem largar suas espadas e correr de volta para suas famílias mas um soldado que se compromete entende o seu destino seja ele qual for, e marcha.
Mas existem momentos em que todos os fatores da batalha te contam um final devastador, e há um acontecimento que muda tudo, isso acende a chama no coração de qualquer ser vivo: a esperança.
Um combustível bem mais forte do que os demais.

Senti as mãos firmes de Erone encostarem nos discos espinhosos de gelo, e toda a minha alma se contorceu. Trinquei os dentes para não grunhir em dor, para que ele não ousasse impedir o processo.

- E como irá fazer isso? - Obriguei minha mente maltratada a focar em outra coisa.

- Khorse não pode enfrentar dragões.

- Sim, ela pode.

Assim como Edan.

- Mas não irá. - Insistiu, rompendo os discos de uma vez por todas.

Meus pulsos reclamaram em dor extrema e eu não pude evitar gritar. O gelo preenchia aquele espaço com frio impiedoso e competia para congelar o fogo dentro de mim, cada segundo os sentindo me machucar junto as demais dores foi pior que devastador.
Quando os inúmeros espinhos abandonaram as feridas vazias por todo o meu pulso dolorido, pude sentir compacta a atmosfera do local dançando dentro dos meus cortes e mais uma vez, todo o meu corpo estremeceu junto.

Quis gritar, externalizar o nível tenebroso da dor, mas não poderia, eu teria de ser forte, me manter firme até o último segundo, porque sei que eu e Erone somos as únicas esperanças desses feéricos agora.

Estava despencando até o chão novamente, pesando toneladas, sentindo meu sangue quente escorrendo pelos meus braços e mãos, mas os músculos do herdeiro interceptaram a longa queda e a tornaram curta quando esse me segurou. - Se apoie em mim.

Sou orgulhosa demais para dizer a ele que não tenho forças, então terei de arrancá-las do buraco escuro em que estivessem.

- E quanto a eles? - Ainda que doa muito pensar em qualquer coisa, seria mais gratificante do que me entregar a agonia física sem fim.

- Precisamos ser rápidos. - O primeiro passo objetivo que deu fez meu corpo todo vibrar, os ferimentos pareceram sorrir quando uma área maior de sua periferia que não ardia antes começou a me torturar igualmente aos cortes originais.

Ouvi Erone grunhir, parecendo enjoado.

- Nada mal o que fez com meus conselhos. - Ironia pra descontrair, acho que ele entendeu a minha intenção.

Nem mesmo fiquei em seu caminho, e no fim ele acabou aparecendo para oferecer ajuda.

- Seus conselhos me trouxeram até aqui. - Quase rosnei com dificuldade ao falar, quando respirar era um ato de enorme esforço - Tem que salvar seu povo.

- Eu vou. - Senti a palma de suas mãos frias contra o meu rosto quando ele colocou meus pés no chão, ainda me segurando para que eu não caísse - Tudo que tem de se preocupar agora, é abrir os olhos.

Em um evento inesperado, a temperatura mórbida da verdadeira morte se aqueceu evidentemente, o suficiente para me fazer agradecer e segundos depois, gelo explodiu para todos os lados, emitindo um som verdadeiramente glorioso. Que com certeza chamaria muita atenção.

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