Capítulo 64

132 17 6
                                    

Não entendi nada do que estava acontecendo, gradativamente o céu clareava e as pessoas estavam saindo de suas casas para seguirem juntas na direção dos portos, e até mesmo do andar de cima posso ouvir seus diversos comentários eufóricos reverberando nas ruas da cidade.

Prontamente segui até o quarto onde era pra eu ter dormido, e peguei minhas duas espadas em mãos. Sem a paciência e o tempo para me meter no meio de tanta gente, resolvi atravessar até as montanhas, até Aedon, pois ao menos teria uma visão privilegiada dos portos se avançasse um pouco mais ao norte. Em segundos estava diante da dragoa, que despertou assim que me aproximei.

Apressada, recostei a mão no seu focinho por alguns segundos, sentindo o desenho de suas escamas sob minha pele, o calor que compartilhamos através da ligação, e permiti que nossos corações se sincronizassem perfeitamente. Ouvi-lo batendo, e sentir como se minha alma tivesse companhia, foram combustíveis o suficiente para prosseguir sem hesitar mais.

O solo coberto por neve que me leva até a direção norte se eleva como um pequeno morro por alguns metros, com altitude crescente. Sem muita cerimônia, apenas escalei a parte do trajeto que faltava para chegar ao fim desse pequeno monte, e ter a visão privilegiada do mar.

Cheguei em um determinado ponto do solo após três minutos de uma escalada breve, que se tornou constante, e mesmo sem chegar a beira da ladeira, pude ver uma longa extensão no mar coberta por incontáveis navios. Meu coração disparou em inquietação, confusão e euforia.

São navios Edunos com a bandeira do floco de neve de gelo maciço mantido a qualquer temperatura por magia, e logo quando os vi assumi posição de ataque pronta para atravessar até lá embaixo, mas ao observar mais por alguns segundos percebi que entre esses também há navios de terras do continente portando seus emblemas, vários deles de diferentes regiões, e ainda há aqueles que pertencem às demais cortes de Prythian, espalhados sobre as águas e se perdendo no horizonte, se aproximando cada vez mais.

Confusa diante da diversidade de navios, deixei que a espada caísse ao sentir fraqueza proveniente da carga absurda de adrenalina, e a lâmina perfurou a neve, se equilibrando de pé entre o elemento fofo.

Não é um ataque, poderia ser caso não houvessem navios da própria ilha, e os Illyrianos e as valquirias já estivessem nos céus, mas acima não há uma única alma por perto, e lá embaixo na beira do porto há inúmeros cidadãos de Velaris, atrás dos Grão-Senhores, esperando pela chegada dos muitos navios de queixo erguido e peito aberto.

Talvez se trate da chegada de aliados do continente, mas isso não explica de maneira alguma os navios congelados de Eduna. Apertei os olhos na tentativa de identificar quem vem dentro deles, mas são tantos que não fui capaz de fazê-lo.

Aedon grunhiu atrás de mim, inquieta por conta da minha euforia intensa, alimentada pela minha falta de informações. Na tentativa de acalma-la sem perder um único detalhe dessa chegada sem sentido de diferentes povos sem relação direta uns com os outros, me virei parcialmente a ela acariciando seu focinho, mas mantive os olhos no oceano.

A chama dançante, travessa e eufórica da noite passada não parou de correr e saltar por um único segundo, e eu tinha plena certeza de que não poderia crescer mais, mas estava enganada. De um minuto a outro, senti a chama desinibida se exaltar tanto que tive de parar o meu movimento, percebendo cada parte do meu corpo arrepiada, absolutamente tomada por adrenalina inebriante e rara. Talvez seja até mesmo inédita, não me lembro da última vez que me senti tão viva quanto agora, mesmo sem saber exatamente do que essa chegada se trata.

Mantive os olhos no horizonte por bastante tempo, e não ganhei nenhuma pista nova dessa novidade estranha por generosos segundos além da movimentação natural dos navios,  até que ele apareceu. Voando rapidamente feito o próprio vento selvagem bagunçando as nuvens, em manobras tão ágeis e rápidas que me fizeram suspirar involuntariamente sob completa admiração repentina e implícita, e quando dei conta de mim mesma, estava sorrindo abertamente.

Sobre CortesOnde histórias criam vida. Descubra agora