Capítulo 61

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Kenna

Quando adentramos a casa da cidade, em silêncio sem nos revelarmos, vimos Nesta sentada no sofá com os pés cruzados e apoiados na mesa de centro, bebericando um chá e lendo um livro, enquanto Nyx monta um quebra-cabeças sobre o espaço restante com as bochechas transbordando de tantos cookies dentro dela.

O riso fraco e divertido escapou involuntariamente. Nyx é tão fofo, que sinto vontade de apertá-lo. É uma criança muito preciosa realmente, e diante do brilho incessante nos olhos inocentes e puros, merece ser protegido de todo mal, a qualquer custo.

— Estamos de volta. — Anunciou Cassian quando finalmente saímos do Hall de entrada.

Apenas as iris de sua parceira se mexeram, subindo imediatamente até os olhos do macho que tanto ama, em uma aura suave sim, mas naturalmente predatória e observadora.
Nyx por sua vez assumiu feição surpresa, e entusiasmado, pegou em mãos uma tigela de porcelana azul clara com alguns biscoitos dentro, vindo até mim com tanto pressa que tropeçou nos próprios pés.

Cassian foi até a parceira no exato momento em que chegou, longe demais pra impedir que o pequeno caísse de cara no carpete, mas antes que pudesse acontecer, fui rápida o suficiente para segurá-lo com as palmas das mãos, suportando seu pequeno tronco.

— Calma garotinho. — Alertei, descontraída — Pode se machucar.

Talvez não pelo tropeço, quedas na infância são até mesmo necessárias pra que as crianças aprendam a se levantar, mas o pequeno está com uma tigela de porcelana em mãos, e se caísse, provavelmente sofreria um corte doloroso e desnecessário. O faria chorar em consequência da dor, e me cortaria o coração.

— Olha. — Elevou a tigela, ofegante — Eu cumpri nosso acordo, guardei biscoitos pra você. — Abriu um sorriso orgulhoso de si mesmo.

Chamas amigáveis e encantadas incendiaram meu peito, me trazendo plena sensação de conforto. De repente todos os meus monstros haviam se escondidos, sem força o suficiente pra vencer uma criança.

— Cumpriu sua missão direitinho. — Parabenizei, em tom de voz também orgulhoso — Muito obrigada. — Peguei a tigela em mãos ao passo que o pequeno se equilibrou e desvencilhou-se de minhas mãos.

Foi só por isso que percebi o quão hesitante fiquei ao pegar o cookie em mãos. Estava tão ansiosa pra provar mais uma vez, é saboroso o suficiente pra competir com os doces de Vênetos, mas quando finalmente peguei em mãos, não pude trazê-lo a boca.

Levei minha total atenção até o doce, sem notar a mínima diferença daqueles que eu comi quando Azriel deixou a bandeja na porta do quarto onde estou dormindo. Normalmente não relutaria tanto em comê-lo, ainda mais quando tem um sabor tão apaixonante, mas o biscoito me fez lembrar do espião, e um tipo de tensão apreensiva me acometeu.

Me lembrei da maneira como seu olhar se apagou ao ouvir minhas palavras cortantes, e o quanto isso não fez com que eu me sentisse melhor. Como não foi capaz de me encarar durante meu surto, da maneira que eu queria sentir raiva por isso mas não consegui, ao menos não totalmente. Principalmente o quanto se sentiu mal ao saber dos detalhes, ao ponto de oferecer trégua em um gesto significativo demais, apenas por bondade. Ele não tinha a obrigação, mas o fez mesmo assim, pela maneira pesada que fiz ele se sentir. Ao me lembrar da aura golpeada que seus olhos assumiram conforme descontava minha dor nele, coloquei o biscoito dentro da tigela, ciente de que não sou digna de uma satisfação como essa se o aterrorizei, quando nada do que aconteceu comigo foi sua culpa.

— Você não vai comer? — Perguntou o pequeno príncipe, curioso.

Intrigada com sua espontaneidade, entre abri a boca na menção de respondê-lo, mas perdi as palavras, sabendo que ele é esperto demais pra engolir qualquer desculpa.

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