Vejo a porta do senhor Bolsonaro se fechar enquanto avanço rumo à de Leila e derrapo até parar, fechando a porta com a lateral do corpo.
– O que significa isso?
– Você seria a chefe da Mone, se é isso que quer saber.
Uma sensação de pura alegria toma conta de mim. Chefe de Simone. Ela teria de fazer tudo o que eu mando, inclusive me tratar com respeito. Neste exato momento, corro o risco de molhar a calcinha.
– A vaga é um desastre enorme, mas quero que você fique com ela.
– Desastre? – Afundo o corpo na cadeira. – Por quê?
– Você e Mone não trabalham bem juntas. Água e óleo. Acrescente poder a uma dinâmica desse tipo... – Ela raspa a garganta, incerta.
– Mas eu posso fazer o trabalho.
– É claro que sim, querida. Quero que você fique com a vaga.
Minha animação só faz aumentar enquanto conversamos sobre esse trabalho. Outra reestruturação está por vir, mas, dessa vez, eu participaria diretamente dela. Poderia salvar funcionários em vez de cortá-los. A responsabilidade é maior e o aumento do salário também é substancial. Eu poderia ir para a casa dos meus pais com mais frequência. E trocar de carro.
– Mas, como você já deve imaginar, Jair também quer que Mone fique com a vaga. Nós dois tivemos uma briga enorme por causa disso.
– Se Simone se tornar minha chefe, serei forçada a pedir demissão.
As palavras saem sem controle por minha boca. É o que alguém diria em um filme.
– Mais um motivo para conquistarmos essa vaga, querida. Se dependesse exclusivamente de mim, teríamos acabado de anunciar sua promoção. Mordisco o polegar.
– Mas como esse processo vai ser justo? Simone e o senhor Bolsonaro vão me sabotar.
– Eu pensei a respeito. Um painel independente de recrutamento, composto por conselheiros, deve realizar as entrevistas. Vocês vão competir em posições iguais. Também haverá candidatos de fora da L&S. Provavelmente candidatos muito fortes. Quero que esteja preparada.
– Vou estar.
Assim espero.
– E parte da entrevista é uma apresentação. Você tem que começar a se preparar. Eles querem saber o que você pensa sobre a direção futura da empresa.
Estou morrendo de vontade de voltar para a minha mesa. Preciso atualizar meu currículo.
– Você se importa se eu trabalhar na minha candidatura durante os meus intervalos de almoço?
– Querida, não me importo se você passar o dia todo trabalhando nela durante os próximos dias. Soraya Thronicke, diretora de operações, Leitura & Saraiva. Parece interessante, não?
Um sorriso se espalha por meu rosto.
– A vaga é sua. Estou sentindo. – Leila faz um gesto como se fechasse um zíper em seus lábios. – Agora vá. Conquiste esse cargo.
Sento-me à minha mesa e desbloqueio o computador para abrir meu currículo terrivelmente desatualizado. Estou animadíssima com a nova oportunidade.
Tudo o que aconteceu hoje ficou para trás.
Bem, quase tudo.
Depois de passar vários minutos editando o currículo, percebo uma sombra pairando sobre mim. Respiro. Cedro e especiarias. A fivela de seu cinto pisca na minha direção. Não paro de digitar.
– Essa vaga é minha, Moranguinho – anuncia a voz de Simone.
Para me conter e não levantar para socar seu estômago, conto um, dois, três, quatro...
– Que curioso, foi isso que Leila acabou de me dizer.
Na superfície reluzente da minha mesa, vejo sua bunda indo embora e juro que Simone Tebet vai perder o jogo mais importante que já jogamos.
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Jogo do amor - Ódio
RomanceSoraya e Simone são completamente opostas, mas obrigadas a trabalharem juntas elas aprendem a conviver na base do jogo do amor ou ódio... Uma convivência que leva ambas a descobrirem sentimentos que antes não eram sequer possíveis e que transforma a...