Por que não doutora Tebet?

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Solto meu corpo na perfeição macia do sofá. Vou transformar meu iglu em uma fortaleza segura e calorosa como este lugar.

Preciso de luminárias, tapetes, mais prateleiras e um quadro da Toscana. Preciso de baldes de tinta e um quarto azul-claro.

Roupa de cama branca e uma samambaia.

– Onde você comprou esse sofá? Eu quero um igual.

– Ele é único na face da Terra – responde com uma voz seca que me chega da cozinha.

– Quer me vender?

– Não.

– E essa almofada?

– Essa é mais fácil de achar.

– Acho que já entendi a sua estratégia.

Assisto a um pouco de TV e Simone me entrega um prato e um garfo. Então

prossigo:

– Quando estou aqui, eu me sinto uma duquesa.

Empurro meus sapatos para debaixo da mesinha de centro.

– Existem monstros horríveis que adoram mimar pequenas duquesas.

Deveríamos tentar um cessar-fogo de duas horas? Começando agora?

– Claro, vamos fazer isso. Nossa, a aparência está ótima!

Sinto o cheiro de manjericão fresco. Como essa mulher ainda está solteira?

Assistimos ao jornal e ela recolhe meu prato vazio. Depois, traz para mim uma taça de sorvete de baunilha, mas ela mesma não come.

– Por que você perde tempo guardando sorvete no congelador?

– Para o caso de eu receber visitas inesperadas que gostem de doces.

Só consigo rir dessa ideia.

– Uma colheradinha não vai estragar esse abdômen. Tem proteína, não tem?

Ela olha para a taça e suspira. Pega a colher da minha mão e rouba um bocado enorme de sorvete.

– Santo Deus!

Suas pálpebras se fecham.

– Você deveria se presentear com algum docinho toda noite. Não há motivo para ser tão cruel consigo mesma.

– Algum docinho, é? – E olha diretamente para mim. – Está bem.

Tomo mais um pouquinho de sorvete. A colher desliza em minha boca e a intimidade desse gesto chega a ser obscena.

A língua dela, a minha língua. Dou uma lambida e ela me observa, peito se abrindo, respiração escapando desesperada.

Ela abre um cobertor cinza e macio sobre o meu corpo e eu me ajeito ali como uma criança mimada. Simone senta na outra ponta do sofá, perto dos meus pés, e eu observo seu perfil enquanto ela inclina o corpo para a frente e pega um livro médico.

– Você parece triste.

– Eu estou... feliz. – Sua expressão se transforma, e agora Simone parece surpresa. – Estranho.

– Por que você ainda guarda todos esses livros? Este aqui tem muitos desenhos de vaginas.

– Eu planejava seguir a carreira da família. Não consegui me desligar desses livros ainda, acho. E muitos deles são da minha mãe. São bem antigos, mas ela quis que eu ficasse com eles.

Ela abre na folha de rosto e desliza o dedo pelo nome dela escrito à mão. Quero perguntar sobre seus pais, mas, se conheço Simons, ela está prestes a desabar.

Jogo do amor - ÓdioOnde histórias criam vida. Descubra agora