Eu sei, mas planejo vingança

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– É a menina mais doce do mundo. Simaria certamente tem algum complexo de inferioridade. Quer que todos se sintam por baixo para ela se sentir por cima. Complexo de Napoleão. Complexo de Hitler. Tem algo errado com essa garota.

Ele vai elencando as possibilidades e contando-as nos dedos.

– Todas as anteriores, pai. Coloque um post-it na tela para a mãe não conseguir se ver. Ela não está olhando para mim.

– Talvez ela esteja loucamente apaixonado por ela – minha mãe arrisca com otimismo enquanto olha pela primeira vez direto para a câmera.

Sinto meu estômago cair no chão.

Vejo meu próprio rosto. Sou uma estátua de argila de um rosto horrorizado e surpreso.

Meu pai não para de bufar.

– É uma maneira ridícula de demonstrar, não acham? Ela transformou aquele lugar em um inferno para nossa Aya. Eu já disse, se eu conhecê-la, você teria que cavar a cova. Está me ouvindo, Soraya? Diga a essa garota para tomar jeito ou então seu pai vai embarcar em um avião para trocar algumas palavrinhas com essa daí.

Imaginá-los um de frente para o outro é estranho.

– Eu não perderia tempo com isso, pai.

E minha mãe ouve justamente o que precisava ouvir.

– Por falar em aviões, podemos depositar um dinheiro para você comprar uma passagem e vir nos visitar? Faz tanto tempo que não nos vemos. Faz bastante tempo, não faz, So?

– O problema não é o dinheiro, é conseguir tempo – tento explicar, mas os dois começam a falar por cima da minha voz ao mesmo tempo, em uma combinação ininteligível de apelos, pedidos e justificativas.

– Vou assim que conseguir um tempinho, mas pode ser que demore um pouco. Se eu for promovida, vou ficar superocupada. Se não...

Estudo o teclado do computador.

– E aí? – A voz do meu pai é dura.

– Vou ter que procurar outro emprego – admito.

Ergo o olhar.

– É claro que sim. Você jamais trabalharia para aquela idiota da Simaria.

Em seguida, diz para a minha mãe:

– Mas seria bom tê-la por aqui. Os livros não estão ajudando, precisamos de mais uma cabeça pensante.

Percebo que minha mãe ainda está surtando com a minha situação profissional. Ela é muito mão de vaca e vive há tanto tempo na fazenda que, em sua cabeça, a capital é uma metrópole com um custo de vida extremamente caro.

Bem, ela não está tão distante da realidade.

Tenho um bom salário, mas, depois que o banco suga o valor do aluguel, tenho que me esforçar para viver com o que resta. A ideia de dividir a casa com alguém me faz sentir um medo enorme.

– Como é que ela vai...?

Meu pai pede para ela se calar e acena para afastar o pensamento do fracasso.

– Vai dar certo. É Simaria quem vai ficar desempregado e morando debaixo da ponte, e não ela.

– Isso jamais vai acontecer com ela! – minha mãe exclama alarmada.

– Você fez as pazes com aquela sua amiga, aquela que trabalhava com você? Vanda, não é?

– Não pergunte, esse assunto a chateia – minha mãe o censura com uma carranca.

Jogo do amor - ÓdioOnde histórias criam vida. Descubra agora