Te dou uma carona

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Às 18h30, meu joelho começa a tremer.

– Vai se atrasar? – Aqueles pares de olhos me observavam

– Não é da sua conta. – Reviro os olhos

Droga! Será que Simone nunca mais vai embora? Ela já trabalhou onze horas hoje e ainda tem o frescor de uma rosa. Já eu, tudo o que quero é me jogar de cara na cama.

– Você não disse que era às 19h? Como vai pra lá?

– Táxi.

– Eu também vou para lá. Dou uma carona para você. Faço questão.

O rosto de Simone deixa claro que ela está se divertindo muito durante essa nossa interlocução. Ela espera que eu confesse que estava mentindo. É bom ter Pacheco como uma carta na manga.

– Tudo bem. Pode ser.

Minha fúria por ela ter roubado a atividade de formação de equipe já ficou para trás, deixando apenas uma leve camada de raiva.

Tudo está pouco a pouco saindo do controle.

Vou ao banheiro feminino e levo minha nécessaire de maquiagem. Meus passos ecoam pelo corredor vazio. Faz muito tempo que não vou a um encontro romântico. Ando ocupada demais. Entre o trabalho, odiar Simone Tebet e dormir, me resta pouco tempo para qualquer outra atividade.

Simone não consegue acreditar que alguém possa gostar de passar algum tempo em minha companhia. Para ela, sou uma viborazinha repugnante.

Cuidadosamente aplico o lápis de olho, traçando um olho de gato. Tiro o batom até ele estar praticamente todo desbotado.

Passo perfume no sutiã e dou a mim mesma uma piscadela, pronunciando algumas palavras de encorajamento.

Tenho um par de brincos longos no bolso lateral da nécessaire e os coloco nas orelhas. Do escritório para a noite, como dizem aqueles artigos de revistas.

Estou ajeitando o sutiã quando trombo com Simone, na saída do banheiro. Ele traz o meu casaco e a minha bolsa. O choque pelo contato com seu corpo é um golpe.

Ela me olha com estranheza e pega minha bolsa e meu casaco que caíram no chão.

– Para que se arrumou tanto assim? – Diz como se desaprovasse

– Nossa, obrigada. – Estendo a mão e pego a bolsa.

Ela continua segurando meu casaco e aperta o botão do elevador.

– Então hoje terei a oportunidade de ver seu carro? – digo para tentar quebrar o silêncio.

Esse pensamento é mais desesperador do que encontrar Pacheco. O carro é um espaço bem pequeno e fechado.

Simone e eu alguma vez nos sentamos uma ao lado da outra antes? Duvido.

– Faz muito tempo que tento imaginar como é seu carro. Creio que seja um fusca. Um fusca branco e enferrujado, como o Herbie.

– É melhor repensar.

– Mini Cooper do começo dos anos 1980. Verde-limoso. Não tem como empurrar o banco para trás, então os joelhos ficam cada um de um lado do volante.

– Sua imaginação é muito vívida. Você dirige um Honda Accord 2003. Prata. Uma bagunça enorme no interior. Problema crônico no câmbio. Se fosse um cavalo, você já o teria matado.

O elevador chega e eu entro com cuidado.

– Você de fato é uma stalker muito melhor do que eu. – digo

Sinto uma pontada de medo quando vejo seu polegar apertar o botão da garagem. Ela me observa com olhos sombrios e intensos. Está claramente planejando algo.

Talvez pretenda me matar ali mesmo, no subsolo. Vou acabar morta em uma caçamba de lixo. Os investigadores vão ver minha meia arrastão e maquiagem pesada e pensar que sou uma prostituta. Perseguirão todas as pistas erradas. Enquanto isso, Simone estará calmamente limpando meu DNA de seus scarpins pretos e preparando um sanduíche.

– Olhos de assassino em série. – Eu queria não soar tão amedrontada. Ela observa seu reflexo na parede espelhada do elevador.

– Entendi o que quis dizer. E você está com aqueles olhos de quem não se aguenta de tesão. – Ela disse, meu Deus como essa mulher me tira do sério.

Ela leva dramaticamente o dedo na direção do painel de botões do elevador.

– Não, esse também é meu olhar de assassina em série. – Rebato

Simone deixa uma respiração pesada escapar e aperta o botão de emergência, forçando o elevador a parar bruscamente.

– Por favor, não me mate. Deve ter câmeras aqui. – Assustada, dou um passo para trás.

Jogo do amor - ÓdioOnde histórias criam vida. Descubra agora