Esse jogo eu venci

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São 7h30 do Dia da Camisa Creme. O reflexo na porta do elevador confirma que meu casaco é mais longo do que o meu vestido minúsculo, então pareço uma garota da classe alta a caminho da suíte-máster de um hotel e usando só lingerie por baixo.

Hoje, tive que vir de ônibus. Mal consegui subir a escada sem mostrar a minha roupa íntima e, quando as portas se fecharam, eu me dei conta de que esse vestido foi um catastrófico lapso de julgamento.

A buzina entusiasmada de um caminhão enquanto eu andava do ponto de ônibus à L&S confirmou essa hipótese.

Se as lojas de departamento já estivessem abertas, eu entraria para comprar uma calça.

Mas eu dou conta de enfrentar essa situação. Vou ter que passar o dia inteiro sentada.

As portas do elevador se abrem e, é claro, Simone está em sua mesa. Por que ela sempre tem que chegar tão cedo ao escritório? Aliás, será que essa mulher vai para casa? Ou dorme em uma gaveta em algum necrotério escondido por aqui? Acho que ela poderia perguntar a mesma coisa a meu respeito.

Eu esperava ter um ou dois minutos sozinha aqui no escritório para me preparar para o longo dia em que terei de permanecer sentada. Mas lá está ela. Eu me escondo atrás do cabide de casacos e finjo procurar alguma coisa na bolsa para tentar ganhar tempo.

Se me concentrar no vestido como meu principal problema, posso ignorar os flashbacks do sonho de ontem à noite.

Ela ergue o olhar, deixando para trás a agenda, mantendo o lápis na mão. E me encara até eu começar a abrir o cinto do casaco, mas não consigo continuar. Seus olhos levemente puxados e escuros é ainda mais vívido do que em meu sonho.

Ela me estuda como se estivesse ocupada lendo a minha mente.

– Está frio aqui, não está? – Diz com a boca franzida em sinal de irritação, ela acena com a mão em círculos como quem quer dizer "Acabe logo com isso".

Respirando fundo para ganhar força, tiro o casaco e o dependuro em um cabide especial, acolchoado. Sinto a fricção dos fios da meia arrastão entre as minhas coxas enquanto ando até minha mesa. Estou praticamente usando um maiô.

Observo seus olhos voltarem-se à agenda, os cílios escuros derramando sombras em formato de meia-lua em suas bochechas.

Ela parece uma garotinha fofa, até erguer o rosto e mostrar que tem os olhos duros e especulativos de uma mulher. Meu tornozelo quase cede.

– Uau! – exclama com uma voz arrastada. Observo seu lápis para ver se fará algum tipo de anotação. – Tem um encontro ardente hoje, Moranguinho?

– Sim – minto automaticamente, e Simone prende o lápis atrás da orelha, toda cínica.

– Conte-me mais.

Tento apoiar a bunda despreocupadamente na beirada da minha mesa. O vidro é frio contra a parte de trás das minhas coxas. É um erro terrível, mas não posso ficar em pé agora, pois vou parecer uma idiota. Nós duas olhamos para as minhas pernas.

Observo meus sapatos vermelhos e lustrosos e chego a ver o vestido refletido ali, de tanto que brilham. Deixo meus cabelos caírem sobre os olhos. Se eu me concentrar nesse vestido ridículo, vou acabar esquecendo que meu cérebro quer que ela me lamba, me morda, me arranque a roupa.

– O que foi? – Dessa vez, sua voz soa formal.

– O que aconteceu? Deslizo o dedo por um dos diamantes formados pelas linhas da minha meia arrastão.

O sonho certamente aparece estampado em meu rosto. Minhas bochechas estão esquentando. Ela usa a camisa creme, suave e sedosa como os lençóis do sonho.

Jogo do amor - ÓdioOnde histórias criam vida. Descubra agora