É uma fotografia que acho que eu nunca tinha visto. As árvores embaçadas ao fundo me orientam imediatamente.
Eu tinha completado 8 anos quando meus pais plantaram essa fileira de árvores na parte oeste da fazenda. Os negócios começavam a decolar naquela época, o que justifica o sorriso no rosto dos dois.
Não tenho vergonha dos meus pais, mas eles sempre acabam fazendo quem cresceu na cidade dar risada. A maior parte das patricinhas idiotas como Simone acham pessoas como meus pais "pitorescos" ou "engraçadinhos". Imaginam minha família como sendo de gente simples, caipiras vivendo à beira de uma cerca coberta de parreiras. Para pessoas como Simone, os morangos nascem dentro de uma caixinha no supermercado.
Na imagem, estou espalhada como um potro aos pés dos meus pais e usando shorts sujos e manchados. Meus cabelos ainda escuros estão bagunçados. A sacola de retalhos que me acompanhava à biblioteca aparece ao meu lado, certamente com a coleção The Baby-Sitters Club e outras histórias antigas de cavalos. Uma das mãos segura uma planta, a outra está cheia das frutas vermelhas. Estou corada por causa do sol e possivelmente uma dose excessiva de vitamina C. Talvez por isso eu seja tão pequena. A vitamina impediu meu crescimento.
– Sabe, ela se parece muito com você. Talvez eu devesse enviar o link por e-mail para todo o pessoal da L&S e pedir para eles adivinharem quem essa menininha seria.
Ela está visivelmente tremendo com a necessidade de rir.
– Vou te matar.
Eu realmente pareço uma menina selvagem nessa foto. Meus olhos estão mais claros do que o céu enquanto os aperto para me proteger da luz do sol, ao mesmo tempo em que ostento meu melhor sorriso. O mesmo sorriso que abri em toda a vida. Começo a sentir uma pressão na garganta, uma queimação subindo pelas minhas bochechas.
Olho para os meus pais. Os dois estão bem novos. As costas de meu pai estão eretas na imagem, mas cada vez que vou para casa encontro-o mais curvado. Pisco os olhos para Simone e ela parece não querer mais dar risada. Meus olhos queimam com lágrimas antes que eu consiga parar para pensar onde estou e diante de quem estou.
Ela lentamente vira a tela outra vez em sua direção, tomando o tempo necessário para fechar o navegador. Uma mulher típica, desconfortável com a imagem das lágrimas de outra mulher. Viro-me e olho para o teto, tentando fazer essas lágrimas voltarem por onde vieram.
– Mas estávamos falando de mim. O que posso fazer para me parecer mais com você?
Alguém à espreita chegaria a pensar que ela está tentando ser gentil. Minha resposta sai quase em um sussurro:
– Poderia tentar deixar de ser uma cuzona.
No reflexo no teto, vejo suas sobrancelhas começarem a arquear.
Ah, Deus. Preocupação.
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Jogo do amor - Ódio
RomanceSoraya e Simone são completamente opostas, mas obrigadas a trabalharem juntas elas aprendem a conviver na base do jogo do amor ou ódio... Uma convivência que leva ambas a descobrirem sentimentos que antes não eram sequer possíveis e que transforma a...