Me sinto infantil enquanto olho para os punhos enrolados da camisa dela, um dos quais agora contém meu DNA.
Está concentrada na tela de seu computador e não fala comigo há horas.
Eu sem dúvida estraguei tudo, e estraguei feio.
– Vou mandar lavar a seco a sua camisa – ofereço, mas ela não reconhece a minha presença. – Eu compro outra para você. Desculpa, Simone...
Ela me interrompe:
– Você pensou que tudo seria diferente hoje?
Sinto um nó enorme apertando a minha garganta.
– Eu esperava que sim. Não fique brava.
– Não estou brava.
Seu pescoço está vermelho em contraste com a gola branca.
– Estou tentando dizer que sinto muito. Eu queria agradecer por tudo o que você fez por mim.
– E essas belas margaridas são para mim, então?
As palavras me fazem lembrar uma coisa que pode consertar tudo.
– Espere. Eu trouxe um presente para você.
Pego em minha bolsa o pequeno cubo plástico com um laço vermelho.
Entrego como se fosse um Rolex.
Seus olhos brilham com uma emoção que não consigo decifrar antes dela franzir outra vez o cenho.
– Morangos.
– Você disse que amava morangos.
A palavra "amor" provavelmente nunca foi pronunciada neste escritório, e ela faz minha voz tremer. Simone me lança um olhar afiado.
– Fico surpresa por você se lembrar de qualquer coisa.
Ela coloca os morangos em sua bandeja de documentos a serem recolhidos e loga outra vez no computador.
Depois de vários minutos de silêncio, arrisco mais uma vez:
– Como eu posso retribuir... tudo o que você fez?
O equilíbrio mudou dramaticamente entre nós.
Agora eu estou em dívida com Simone. Eu devo a ela. Ela cuidou de mim.
– Me diz o que eu posso fazer. Eu faço qualquer coisa.
O que eu quero dizer, na verdade, é:
"Converse comigo. Explique para mim. Eu não vou conseguir corrigir nada se você me ignorar."
A vejo ainda digitando, seu rosto tão sem expressão quanto o de um boneco de teste de colisão.
Uma pilha de documentos com as estatísticas de vendas descansam à sua direita e ela usa um marca-texto para destacar alguns números.
Enquanto isso, não tenho o que fazer sem Leila aqui.
– Eu limpo seu apartamento para você. Vou ser sua escrava por um dia. Eu... faço um bolo para você. Droga, eu cozinho mal, Tebet.
É como se um painel à prova de som tivesse sido instalado entre nós. Ou como se eu tivesse sido levada daqui.
Eu devia deixa-la trabalhar em silêncio, mas não consigo parar de falar. Ela não está me ouvindo, então pouco importa se eu pronunciar as próximas palavras em voz alta:
– Eu vou com você ao casamento.
– Fique quieta, Soraya.
Então ela está me ouvindo.
– Vou ser sua motorista. Você pode beber o quanto quiser. Pode ficar superbêbada e se divertir pra caramba. Eu vou ser sua chauffeur.
Ela pega a calculadora e começa a digitar.
Insisto.
– Eu a levo para casa e a coloco para dormir, como você fez comigo. Pode vomitar na Tupperware e eu lavo. Aí estaremos quites.
Simone descansa os dedos na lateral do teclado e fecha os olhos. Parece estar recitando mentalmente uma série de palavrões.
– Você nem sabe onde é o casamento.
– Só não vou com você se for na Coreia do Norte. Quando é?
– No próximo sábado.
– Eu estou livre. Combinado. Me passe o seu endereço e eu vou ir te buscar e tudo. Diga a que horas posso ir.
– É muita presunção da sua parte imaginar que eu não tenho uma acompanhante.
Quase abro a boca para responder que de fato sei que eu sou sua acompanhante. Nesse exato momento, meu celular toca.
Pacheco. Giro minha cadeira em 180 graus.
Será que ele ainda não descobriu que já inventaram mensagens de texto?
– Oi, Sory. Está se sentindo melhor? Nosso jantar ainda está em pé? –
Sussurro baixinho:
– Não sei. Tenho que ir buscar o carro e estou me sentindo péssima.
– Já ouvi tanto sobre esse seu carro.
– Acho que ele é prata... É basicamente o que me lembro dele.
– Eu reservei uma mesa para às 19h hoje. Marie Cuisine Você disse que gosta de lá, certo?
Não me resta escolha, então. É difícil conseguir uma reserva nesse restaurante.
Tento não bufar.
– O Marie Cuisine é legal. Obrigada. Não vou ter muito apetite, mas farei o meu melhor. A gente se encontra lá.
– Até mais tarde.
Desligo e passo um tempinho olhando para a parede.
– Rodrigo Pacheco tem uma noite cheia de clichês à sua espera. Restaurante italiano, toalha de mesa xadrez. Provavelmente uma vela. Ele vai empurrar a última almôndega com o nariz na sua direção. Segundo encontro, certo?
– Vamos mudar de assunto.
Finjo começar a digitar. Minha tela fica tomada por mensagens de erro.
– A maioria dos caras arrisca um beijo no segundo encontro.
Essas palavras me deixam paralisada, provavelmente com a loucura transparecendo nos meus olhos.
A ideia de Simone fazer um esforço em um segundo encontro é inconcebível. Simone em um encontro romântico por si só é uma ideia inconcebível.
Imagino ela sentada diante de uma bela mulher ou homem, não sei ainda, sorrindo, rindo.
Aquele mesmo sorriso que ela abriu para mim. Seus olhos brilhando, esperando um beijo de boa noite. Sinto a pressão no peito.
Tento limpar a garganta, mas não funciona.
Não sou a única com aparência de louca.
– Admita, você parece estar prestes a explodir.
Oi, Moranguinhos, passando para pedir a famosa estrelinha... Obrigada por lerem, vcs são tudo.
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Jogo do amor - Ódio
عاطفيةSoraya e Simone são completamente opostas, mas obrigadas a trabalharem juntas elas aprendem a conviver na base do jogo do amor ou ódio... Uma convivência que leva ambas a descobrirem sentimentos que antes não eram sequer possíveis e que transforma a...