CAPÍTULO 35 - A RESPOSTA

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Chego ao trabalho e tem uma pilha de coisas para fazer na minha mesa. Pelo menos ficarei com a mente bastante ocupada e, como diz um velho ditado "Mente vazia, oficina do diabo".
Já são quase 12h00, preciso sair para o almoço. Pego minha bolsa, vou para o elevador e encontro Marcinho, que estava saindo.
-Olá! Está indo almoçar? - ele pergunta.
-É o que parece, não?
-Poxa! Trocou os cascos hoje?
-Estou só brincando contigo! - dou uma risadinha - Sim, estou indo almoçar.
-Posso te fazer companhia?
-Vou lá no China, comer um yakissoba, está afim? - pergunto-lhe.
-Esse tal de yakissoba é aquele negócio, cheio de coisas verdes? - ele ri.
-Você quer dizer legumes e verduras? É isso mesmo! - respondo sorrindo - É macarrão frito no molho shoyo, com verduras, legumes e carne.
-Acho que não vou gostar, mas eles só servem isso?
-Claro que não.
-Então, vou, aliás, se você quiser.
-Vamos, seu chato! É sempre bom ter companhia. Você tem que aprender a comer verduras e legumes, faz a gente crescer! - dou um sorrisinho.
-Se vai fazer piada com a minha altura, fico por aqui mesmo!
-Poxa! Calma, estou apenas brincando. Trocou os cascos hoje, foi? Desculpe-me, tenho mania de roubar os bordões alheios! - começamos a gargalhar.
No restaurante, peço o meu super, ultra, mega, blaster yakissoba especial. Marcinho pede rolinhos primavera com recheio de carne. Depois de analisar o cardápio ele acha que tudo tem coisas verdes.
-Você tem algo contra o verde? - pergunto.
-Não com a cor especificamente. Adoro os seus olhos! - sua resposta imediata me enrubesce - Nunca fui adepto a esse tipo de comida, acho que quem come capim é cavalo.
-Isso me soa bem ofensivo! Está me chamando de quê? - tento fazer cara de brava.
-Poxa, desculpe-me, não foi o que eu quis dizer, foi apenas força de expressão.
Começo a rir da cara que ele faz ao tentar pedir desculpas. Quando percebe que estou só brincando, ele solta uma gargalhada. Enquanto estamos rindo, meu celular toca. Atendo, ainda rindo:
-Alô!
-Deusa?
-Oi, Wagner.
-Essa risada é pra mim?
-Não necessariamente, não vi que era você.
-Então, por que está rindo? Está almoçando?
-Estou, mas não é nada, apenas uma brincadeira.
-Está brincando com quem?
-Um amigo.
-Amigo? Que amigo?
-Calma, ainda não aceitei a sua proposta, lembra?
-Acho que você ainda não tem que se preocupar com isso.
-É inevitável.
-Percebi.
-Nossa! Isso até que é bom! - Marcinho disse, mas sua voz saiu um pouco alta.
-Que bom que gostou.
-Gostou do que? - ele pergunta no meu ouvido.
-Não é com você. Desculpe-me.
-Estou interrompendo alguma coisa?
-Para de ser bobo, estou apenas almoçando. Nós já passamos dessa fase, lembra?
-Como se eu pudesse esquecer.
-Por que ligou?
-Não gostou de ter ligado?
-Gostei, mas desde que atendi você está brigando comigo.
-Não estou brigando. Estou apenas fazendo perguntas e analisando a situação.
-Que situação?
-Essa! Você está almoçando com outro homem e se divertindo bastante. Isso me parece familiar.
-Quem vive de passado é museu. Tenho amigos, aliás, vários agora. Acho que se você quer retomar alguma coisa, precisa ter em mente que, talvez, dessa vez será ainda mais difícil. E não estou disposta a abrir mão de mais ninguém. Sei bem como terminou da outra vez.
-Desculpe-me. Não quero aborrecê-la.
-Não me aborrece. Só estou deixando claro algumas cláusulas do nosso acordo.
-Então, isso é um sim?
-Talvez.
-Sério? Quando posso te ver?
-Durante a semana é complicado. Tudo é muito corrido e não tenho tempo.
-Onde você trabalha? Pode me dar o endereço?
-Você vai aparecer aqui?
-Por quê? Tem algum problema?
-Em horário de expediente não acho conveniente.
-Jamais apareceria no seu horário de trabalho. Só estou pensando em buscá-la na sua saída.
-Assim, tudo bem! Pode anotar.
Passo-lhe o endereço, enquanto Marcinho fica me olhando, com uma interrogação enorme em sua fisionomia, então, despeço-me de Wagner e desligo o celular.
-O que foi isso? - Marcinho pergunta.
-Só um ex, agora atual namorado, acho eu. - dou um sorriso.
-Como assim? Você voltou com aquele filhinho de papai? Você disse que ele era um babaca! Achei que vocês não voltariam.
-Não, não é ele.
-Então? - ele pergunta.
-Wagner. Foi o meu primeiro namorado, meu primeiro beijo, meu primeiro amor. - e dou-lhe um sorrisinho.
-Como assim? Como voltaram agora?
-É uma longa história, que não dá pra ser contada num almoço e ainda não comi. Está quase na hora de voltarmos. Outra hora eu lhe conto, certo?
-Não sei se quero saber. Por que decidiu voltar à pré-história?
-Está me chamando de velha? - dou um sorriso - Só tenho 18, quase 19. - digo - E nem faz tanto tempo assim, apenas cinco anos.
Nossa! Que papa anjo, você tinha quanto? 13 anos? - ele fala em tom ríspido.
-Na verdade, tinha 14 anos. Ele dançou comigo a minha valsa de 15 anos - a imagem daquele dia vem a minha mente e dou um sorriso.
-Está na hora, já terminou? - ele pergunta.
-Não, mas temos que ir, não é?
Ele se levanta, pega as nossas comandas e vai para o caixa.
-Espere! Eu pago a minha. - digo.
-Será quem nem isso posso fazer?
-Poder, pode. Mas não precisa.
-Mas eu quero.
-Tudo bem! Então, muito obrigada pela gentileza!
Ele paga e depois seguimos de volta ao trabalho.
Quando entramos, o relógio já marca 13h00. Volto ao trabalho, pois ainda tenho muitos relatórios para terminar. Enquanto entretenho-me em meio a contas e papéis, a portaria me chama pelo ramal.
-Senhorita Anna? - Sr. Luiz, o porteiro, diz - Tem algo aqui embaixo pra você.
Olho no relógio e vejo que são quase 15h30. Não pode ser ele. Pedi para que não aparecesse em horário de expediente. Será?
-Algo ou alguém, Sr. Luiz?
-Algo, Senhorita.
-Já vou descer, obrigada!
Pego o elevador e vou até a portaria. Encontro Sr. Luiz agarrado ao enorme buquê de rosas brancas. Pego, agradeço e subo novamente. Vejo que tem um cartão e, quando estou saindo do elevador, encontro novamente com Marcinho.
-Ele é rápido! - ele diz com uma cara horrível.
-Parece que sim.
Volto para a minha sala, pego o cartão.

"Querida Deusa,
Essas rosas são para demonstrar todo o amor que sinto por você. Deveriam ser vermelhas para demonstrar a minha paixão, mas as brancas representam a pureza do amor que sinto por você. Hoje voltei a ser o homem mais feliz do mundo!
"Meu universo é você, Baby - Ah! Se eu puder ter a chance, juro todo seu amor merecer..." Será que você ainda se lembra?
Com amor.
Do sempre seu, W."

Nossa! Ele ainda se lembra dessa música? Acho que deve ter passado muitas noites solitárias em companhia dela. "Músicas nos fazem sempre relembrar momentos", penso. "Poxa, são lindas as rosas, mas como vou levá-las para a faculdade?"
Mais um dia termina com a minha rotina diária cumprida. Vou ao banheiro, verifico o cabelo, a maquiagem, escovo os dentes, reforço o perfume, me olho no espelho e vejo que estou feliz. Vou até minha mesa, pego o buquê, que está em um vaso improvisado sobre a minha mesa, Marcinho me espera na porta do elevador segurando-o aberto.
-Vamos? Vai descer. - ele diz.
-Obrigada!
-Então, vai mesmo aceitar?
-Provavelmente.
-Para que voltar ao passado, se existem outras possibilidades? - ele pergunta.
-Outras possibilidades? - dou um sorriso - Está achando que namorado cai do céu?
-Será que precisa ser do céu?
-Ainda não decidi, eu acho. Vou saber quando estiver novamente com ele.
-Quando será isso? - ele pergunta.
-Na verdade não sei. Não tenho tempo, você sabe, durante a semana não posso sair para vê-lo. Então, talvez no fim de semana.
-Então, ainda tem uns dias?
-Acredito que sim.
-Acho que você devia procurar alguém que tenha a mesma rotina, alguém que você possa ver quase todos os dias - ele sorri - Você sabe, namoro à distância tende ao fracasso!
Dou um sorriso e finjo não ter entendido a indireta.
-Vamos deixar com que cada coisa aconteça ao seu tempo, não acha? Pelo menos tenho até o fim de semana pra pensar.
Quando saímos, em frente ao prédio da empresa, encostado a parede vejo-o. Ele me lança um sorriso. Marcinho logo percebeu o que estava acontecendo e se despediu de mim com um beijo no rosto e disse:
-Acho que você não terá tanto tempo pra pensar. Até amanhã. - e vai embora.
-Quem é o anão? - ele olha para Marcinho.
-Boa tarde pra você também! - digo.
-Desculpe-me, Minha Deusa, boa tarde!
Ele me toma em seus braços e sente o meu cheiro.
-Nossa! Ainda lembro-me desse cheiro - ele diz.
-Como? Eu não uso mais o mesmo perfume de antes! - digo.
-Não é do seu perfume que me lembro, é do cheiro da sua pele. O aroma continua o mesmo.
-Cheiro da minha pele? Poxa, nunca ninguém disse que sentia o cheiro da minha pele. Minha Deusa interior se esparrama. Ele não tenta me beijar, mas acho que é melhor assim, ainda precisamos conversar.
-Não imaginei que você viria hoje! - digo.
-Não vou dar tempo para que você mude de ideia - ele diz - E estou com saudade.
-Saudade? Ainda é segunda e nos vimos no sábado!
-Qualquer momento longe de você é uma eternidade. Pense, esperei cinco anos, não acha que já foi tempo demais?
-Vamos subir até a faculdade, lá a gente conversa.
-Está bem.
-Ele se enlaça na minha cintura e seguimos quietos, lado a lado. Lembrei-me de todas as vezes que íamos para o colégio daquele jeito. Paramos em frente à faculdade. Ele encosta-se ao muro, pega o meu buquê, coloca-o sobre a mureta e me puxa para junto de seu corpo.
A cena é familiar, mas há muito não se repetia. Ele está apoiado com as costas no muro, com as pernas entreabertas, para que eu possa ficar mais próxima e assim ficamos quase da mesma altura. Era assim que ele ficava comigo no colégio. Dessa forma seus olhos ficam na altura dos meus.
-Sei que você pediu um tempo, mas é que simplesmente não consigo ficar longe. Preciso de você, entende?
-Estou feliz que você tenha vindo. Adorei as flores.
-Fico feliz que tenha gostado. Mandaria vermelhas, mas acho que ainda não é o tempo para isso. - ele diz. - Será que você já tomou uma decisão?
-Ainda não.
-O que mais preciso dizer? - ele pergunta - Será que você não vê que estou sendo sincero em tudo? O que mais ainda falta?
-Confiança.
-Gostaria que você pudesse confiar em mim, mas essa confiança é algo que só o tempo poderá lhe trazer.
-Então, me dê esse tempo. - ele diz.
-E se não der certo?
-Vai dar.
Ele me gruda em seu corpo e envolve os braços sobre as minhas costas. Sinto-me tão confortavelmente aquecida, acolhida, salva. Coloca seu rosto no meu pescoço, entre os meus cabelos e respira fundo. Repousa a cabeça sobre o meu ombro e diz:
-Não vou te forçar a nada, mas, por favor, só não me peça para ficar longe de você novamente.
-Não quero que fique longe.
Então, ele levanta seu rosto e novamente olha para mim.
-Me deixa ficar hoje com você? - ele pede.
Como posso recusar, se não consigo recuar? Meus olhos estão nos seus, ele começa a se aproximar, sua respiração me invade, me toma, me inebria. Quero-o, preciso dele, então, me entrego. Um beijo de perdão, não pelos nossos erros cometidos, mas pelos desencontros. Ficamos ali por horas, acho que temos muito para resgatar a cada beijo, a cada toque de tantos, por anos esperados.
Os alunos vão chegando, passando por nós. Não consigo ver ninguém, pensar em alguém, quero apenas estar ali, nos seus braços e me sinto novamente uma adolescente descobrindo seu primeiro amor.

A Deusa do Mago - Uma história de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora