Nos braços da paz.

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Assim como era ordem do terreiro recepcionar bem e atender de maneira acolhedora os visitantes, Dalila dessa vez fez o mesmo com todos os seus filhos, esperando-os na porta e abraçando-os de um por um, afinal se aquilo ali estava de pé e a gira acontecia, era por causa deles também.

A regra era sempre a mesma, chegar, deixar seus pertences e ir direto para o banheiro para tomar uma ducha higiênica, banhar-se em seguida com um banho de ervas que a mãe de santo já deixava pronto e porcionado para cada filho, seguidamente vestir a roupa sagrada branca que precisariam usar durante os dias, depois saudá-la como autoridade,  saudar o altar e esperá-la dentro do salão.

Ela deu uma maior atenção a Rosa porque era sua filha mais nova no momento, precisou ensiná-la fundamento por fundamento, acompanhado-a desde a porta do banheiro até elogiando-a quando vestiu o branco pela primeira vez, em seguida ensinando-a a saudar tudo como deveria. Genevive e Jesebel já sabiam se virar ali, afinal já tinham anos dentro da religião, assim como os outros filhos de Lumanda.

Incomodada com aquele converseiro distraído no canto da roda, Lumanda passou a balançar com mais força a sineta querendo evidenciar o som e o recado de que estava pedindo por silêncio, significava que queria falar. Ao ver que não obteve o que queria, se aproximou das mulheres que conversavam colocando o sino no meio delas até atrair a atenção.

— Elizabeth!? — Brigou com a esposa, chamando-a em repreensão. — Genevive!? — Franziu o cenho, brava. — Eita que as filhas de Iemanjá hoje tão que tão! Silêncio, rapaz!

— Agô, minha mãe. — Gen se pronunciou tapando a boca e pedindo perdão para autoridade maior que era Lumanda, enquanto Elizabeth continha a risada.

— Me dê agô. — Beth falou depois de um tempo, também pedindo para que ela lhe desculpasse.

— Certeza que se a Iemanjá da cabeça de Jesebel fosse de frente, ela tinha voltado a falar hoje mesmo. — Fez todo mundo rir, inclusive a psiquiatra que estava quietinha do outro lado do círculo.

Estava brincando com o fato de que as filhas de Iemanjá eram conhecidas por serem fofoqueiras e gostarem muito de conversar, mas era só brincadeira, esses esteriótipos não descreviam alguém, só serviam para zoação. Assim como as filhas de Iansã são esteriotipadas como mulheres que se estressam com facilidade, assim como as de Oxum são esteriotipadas como choronas, assim como os de Xangô que são esteriotipados como comilões, assim como os de Ogum são teimosos e birrentos. Dentro do terreiro esses esteriótipos serviam para brincar.

— Meu agô, Iemanjá. — Proferiu a palavra que significava um pedido de perdão ou licença. Estava pedindo desculpas para a orixá por estar brincando com isso. — Mas eu entendo que as fofocas precisam ser atualizadas. — Inocentou, em parte, as duas. — Porém não agora, oxe. — Brigou outra vez caminhando um tanto curvada com a mão posicionada na lombar, resmungando de dor nas costas quando foi se sentar.

— Calma, Nanã. — Taú, o pai de santo, brincou fazendo todo mundo rir. Usando também do esteriótipo da orixá mãe de Lumanda, que era uma idosa conhecida por ser ranzinza, assim seus filhos também puxavam esse lado seu.

— Tá. — Nem ela aguentou com a piada e passou a rir. — Agora parou. — Bateu o martelo. — A mãe vai conversar um pouquinho com vocês agora. — Puxou o banquinho de madeira para perto. — Eita como estão lindos todos de branco. — Fez o papel de mãe babona, rindo, olhando o círculo de filhos sentados no chão, todos vestidos com trajes sagrados. — Todos já acenderam as suas velas e fizeram suas preces?

E eles respoderam todos juntos que sim, logo ela soltou outra piada dizendo "Que bonitinhos, estão parecendo meus alunos", afinal era uma professora universitária também, para além do seu cargo de sacerdote.

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