Capítulo Trinta e dois

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|Frederick|

Após aquela noite intensa com Catherine, sinto como se uma parte de mim, que estava há muito tempo em silêncio, finalmente despertou. A discussão que começou com acusações, ciúmes e palavras afiadas terminou de um modo que eu nunca poderia ter imaginado. O desejo entre nós sempre esteve lá, latente, porém escondido, mas aquela noite... aquela noite foi diferente. Foi o momento em que tudo que segurávamos, reprimíamos, se libertou. E agora, enquanto ela dorme tranquila ao meu lado, posso respirar mais leve, sabendo que, pelo menos por ora, o que nos separava parece ter se dissipado.

Na manhã seguinte, explico a verdade do que aconteceu com Selin. Digo a Cath que o que ela viu foi apenas um fragmento de um momento muito mais complexo. Ela não viu quando eu rejeitei Selin, quando a afastei. Não viu o fim da conversa, quando deixei claro que qualquer coisa entre nós estava morta e enterrada. Catherine ouve em silêncio, os olhos castanhos fixos nos meus, como se buscasse a verdade por trás das minhas palavras. No fim, ela parece acreditar, ou pelo menos aceitar. Nosso relacionamento, de algum modo, parece ter se fortalecido desde então. Uma nova sintonia se instala entre nós, algo profundo e silencioso, como se estivéssemos conectados por fios invisíveis, uma dança entre o desejo e a compreensão.

No entanto, nem tudo está resolvido em minha mente.

Há duas questões que me perturbam. A primeira é o tal soldado com quem ela estava conversando. Toda vez que tento perguntar sobre isso, ela desconversa, muda de assunto, como se não quisesse falar sobre ele. Não vi o rosto dele com clareza naquela ocasião, apenas uma imagem vaga de suas costas e sua altura, o que torna impossível localizá-lo entre meus homens. Esse mistério me irrita mais do que gostaria de admitir. Quem é ele? Por que ela nunca fala sobre o que conversaram? Apesar disso, decido não insistir demais por enquanto. Nosso relacionamento está se curando, e a última coisa que quero é destruir o progresso que fizemos por causa de uma desconfiança mal colocada.

Mas o segundo assunto que me atormenta é muito mais grave. Cloud continua desaparecida. Um mês se passou, e ninguém a encontrou. Uma mulher que deveria estar sob guarda reforçada, em uma das prisões mais seguras do reino, simplesmente desapareceu como se nunca tivesse existido. As buscas têm sido incessantes, cada recurso disponível foi utilizado, e, no entanto, não há nenhum rastro, nenhuma pista. É como se ela fosse um fantasma.

O julgamento pelos crimes de guerra cometido por Valois contra Navarra foi adiado mais de uma vez. O conselho está impaciente. A corte inteira fala sobre isso como se fosse uma ferida aberta que ninguém consegue fechar. E, por mais que eu tente focar em Catherine, em nossa vida juntos, a ausência de Cloud é um peso constante sobre meus ombros. A qualquer momento, ela pode surgir novamente, e o que isso significaria para Navarra? Para mim? Para Cath?

No entanto, hoje, as coisas tomam um rumo inesperado. Meu pai, o rei Ferdinando, convoca mais uma reunião de emergência. É um daqueles encontros que todos esperavam, mas temiam. O salão do conselho está lotado, e a atmosfera é pesada, carregada de tensão. Os olhares de todos estão voltados para o rei, esperando por alguma novidade, uma esperança de que Cloud tenha sido finalmente capturada, de que a incerteza acabe.

Ferdinando está sentado à cabeceira da longa mesa de mármore, com a expressão fechada e os dedos batendo lentamente contra o braço do trono. Ele espera até que o silêncio se torne absoluto antes de começar a falar.

— As buscas têm sido incansáveis — ele começa, a voz profunda reverberando pelas paredes do salão. — Semanas se passaram, e ainda assim, nenhuma pista, nenhum sinal de Cloud foi encontrado. Nossos recursos estão se esgotando, nossos homens estão cansados, e o reino está em constante estado de alerta.

Os conselheiros trocam olhares inquietos. Sei que muitos deles esperavam por algum tipo de progresso, mas é claro que isso não virá. O desânimo é palpável.

— Eu compreendo a frustração de todos — o rei continua. — Entendo que todos aqui desejam justiça, desejam segurança. Mas a realidade é que continuar a buscar um fantasma não é uma solução. Estamos consumindo tempo e energia valiosos. E, por isso, tomei uma decisão.

Fico tenso imediatamente, sentindo o ar ao meu redor mudar. Algo não está certo. Algo em sua voz me diz que não vou gostar do que ele está prestes a dizer.

— As buscas por Cloud estão encerradas — declara rei Ferdinando, sem rodeios. — Até segunda ordem, todas as equipes devem cessar suas atividades. Não haverá mais recursos dedicados a essa perseguição.

O choque se espalha pelo salão como uma onda. Por um momento, o silêncio que cai é tão pesado que mal consigo respirar. Meus punhos se fecham automaticamente. Encerrar as buscas? Agora? Quando estamos tão perto de encontrar respostas?

— Pai, isso é uma loucura — minha voz se eleva antes que eu possa me controlar. Todos os olhos se voltam para mim, mas ignoro os olhares. — Ela ainda está lá fora. Não podemos simplesmente parar.

Rei Ferdinando me encara, os olhos implacáveis.

— Eu compreendo seu desejo de justiça, Frederick. Mas essa decisão não foi tomada de ânimo leve. Estamos arriscando recursos demais, e isso está nos enfraquecendo. Já se passaram semanas, um mês. É hora de reconsiderarmos nossas prioridades.

Prioridades? Minha mente está a mil. Prioridades? O que pode ser mais importante do que capturar a traidora que quase destruiu nosso reino? Que ainda pode estar tramando algo pior? A frustração borbulha dentro de mim, ameaçando transbordar, mas me contenho. Este não é o momento de perder a compostura.

Os outros conselheiros parecem igualmente perturbados, mas ninguém ousa questionar o rei diretamente. Sabem que ele já tomou sua decisão, e contestá-lo seria inútil. O peso da derrota silenciosa se instala no ar, sufocante.

— Esta decisão é final — diz o rei, encerrando qualquer debate antes mesmo que ele comece. — Quando e se novas informações surgirem, retomaremos as buscas. Até lá, todas as operações relacionadas a Cloud estão suspensas.

Eu sinto como se o chão tivesse sido arrancado debaixo de mim. Cloud ainda está lá fora, e agora, estamos deixando as portas de Navarra abertas para qualquer ataque que ela possa planejar. Minhas mãos tremem com a fúria que tento suprimir. Olho para meu pai, tentando entender como ele pode fazer isso, mas ele já desviou o olhar, terminando a reunião com um simples aceno. Os conselheiros começam a murmurar entre si, o salão que antes estava em silêncio absoluto agora é preenchido por vozes agitadas. Mas eu não escuto nada. Apenas o som ensurdecedor da decisão do rei, ecoando em minha mente.

As buscas estão encerradas... O reino está vulnerável... E eu estou impotente diante de tudo isso.


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