Capítulo Quarenta

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|Catherine|

O último dia do julgamento chega com um peso esmagador que me prende ao chão como chumbo. O tribunal de Navarra está lotado, o ar é denso de expectativa, e o silêncio entre as pessoas é quase palpável. A tensão no salão é sufocante, e eu, sentada na seção reservada às testemunhas, sinto o suor frio escorrendo pela minha nuca e pingando sobre meu vestido. Tento manter a cabeça erguida, mas as emoções me consomem de dentro para fora. Sei que tudo está prestes a acabar, mas a sensação de que o pior ainda está por vir me enche de medo como nunca.

Eu fui uma testemunha de toda essa tragédia. Vi com meus próprios olhos como Valois atacou Navarra sem provocação, sem qualquer justificativa. Tudo por culpa do meu tio, Charles Bourbon. Ele desejava o trono de Valois, que pertencia por direito e era governado por meu pai, Louis, mas a ganância o corroeu, e seu desejo de poder o levou a tramar contra sua própria família. Ele arquitetou a queda do rei de Valois e, em meio a mentiras e intrigas, arrastou nosso reino para uma guerra devastadora contra Navarra.

Eu me sinto responsável. Não porque participei de seus planos, eu nunca quis nada disso. Na verdade, desde o princípio fugi com minha mãe e meus irmãos na tentativa de protegê-los da maldade de tio Charles. Mas, no fundo, não consigo deixar de sentir o peso da culpa que carrego comigo até hoje. O mesmo sangue corre em minhas veias, o sangue dos Bourbons, aqueles que causaram tanta dor ao povo de Navarra, o reino onde agora moro. E se não fosse por Frederick... Eu nem sei o que teria acontecido comigo, com minha mãe e meus irmãos. Ele me salvou de um destino sombrio, onde eu e minha família poderia ser executada como conspiradora nessa guerra. Mas, mesmo assim, a vergonha de ser filha de Louis Bourbon, sobrinha de Charles, pesa sobre mim como um fardo insuportável.

Já dei meu depoimento no julgamento anterior. Contei tudo o que sabia, tudo o que Charles tramou, como ele manipulou meu pai, como ele tentou destruir tudo em seu caminho. Fiz isso como parte de um acordo, em troca da segurança de minha mãe e de meus irmãos, prometi contar a verdade. Cumpri minha parte, mas o que recebo agora é o julgamento final. O destino de meu pai, de meu tio... E, de certa forma, o meu próprio destino.

Rei Ferdinando, meu sogro, está prestes a falar. Sua presença no tribunal é imponente. Ele está calmo, como sempre, mas posso ver nos seus olhos o peso da decisão que carrega. Ele é o juiz final nesse julgamento, e o que está prestes a declarar mudará a história de Valois e Navarra para sempre.

Meu coração bate mais rápido à medida que ele começa a falar, suas palavras soando distantes, como se eu estivesse presa em um pesadelo do qual não consigo acordar.

-Louis Bourbon", ele começa, e meu corpo se tenciona.

O nome do meu pai ecoa pelo salão, cada sílaba uma facada em meu coração.

-Antigo rei de Valois, por seus crimes cometidos contra Navarra, o conselho real decidiu pela sua condenação à prisão perpétua.

Prisão perpétua. Essas palavras caem sobre mim como uma tonelada de pedras. Meu pai, um homem fraco e facilmente manipulado por seu irmão, passará o resto da vida atrás das grades. Meus olhos se enchem de lágrimas, mas não deixo que caiam. Não aqui. Não agora. Preciso me manter firme, ainda que tudo dentro de mim esteja em colapso.

-Charles Bourbon..., continua o rei, sua voz fria e sem emoção. -O cérebro maligno por trás de todo o esquema de guerra de Valois contra Navarra, será condenado à guilhotina. Sua execução ocorrerá dentro de três dias.

Sinto o estômago se revirar. A guilhotina. A morte. Meu tio Charles, que sempre foi o verdadeiro vilão dessa história, pagará com a própria vida pelos seus crimes. Parte de mim sabe que essa é a justiça que ele merece. Ele destruiu o reino de meu pai, colocou nossa família em risco, e iniciou uma guerra que trouxe um sofrimento incalculável.

O salão está quieto, mas posso ouvir meu próprio coração batendo descompassado. Meus olhos se movem lentamente na direção de meu pai. Ele está ali, ao lado de Charles, sendo escoltado de volta à prisão. Seu rosto está marcado pelo sofrimento, pelos erros que cometeu. Ele olha para mim por um breve momento, seus olhos carregados de culpa, de arrependimento. Sei que ele sabe o quanto errou. Sei que ele carrega o peso de suas decisões, assim como eu carrego o peso de seu sangue.

Charles, por outro lado, olha para mim com frieza, seus olhos cheios de desdém. Ele não se arrepende. Ele nunca se arrependerá. Sua traição, sua ganância, estão estampadas em seu rosto. E, mesmo sabendo que ele morrerá em breve, sinto uma pontada de medo ao ver o ódio que ainda queima dentro dele.

Então tudo ao meu redor começa a girar. O tribunal, o som distante das vozes, o cheiro de madeira envelhecida e poeira. Meu corpo treme, minhas mãos suadas agarram o tecido do meu vestido com força, tentando encontrar algum ponto de estabilidade, mas o mundo ao meu redor parece desmoronar.

Preciso sair daqui. Preciso me afastar. Mas minhas pernas não respondem. Quando o julgamento termina, quando todos começam a se dispersar, eu tento me levantar, mas minhas pernas falham. Me sinto fraca, tonta, como se estivesse prestes a desmaiar. O medo, a culpa, o peso de tudo isso me consome.

De repente, vejo o rosto de Frederick surgindo a minha frente como uma miragem. Seus olhos azuis estão arregalados, cheios de preocupação. Ele está correndo na minha direção, e consigo ouvi-lo gritar meu nome, embora sua voz pareça distante, como se estivesse debaixo d'água. Ele estende a mão para mim, mas antes que possa me alcançar, o mundo ao meu redor escurece, e tudo desaparece como num piscar de olhos.

Eu desmaio.


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