A Sombra do Passado [Completo]

Capítulo Quarenta e três

|Frederick|

O clima no castelo está insuportavelmente pesado desde que a notícia da fuga de Charles se espalhou. Uma reunião de emergência é convocada pelo meu pai, o rei Ferdinando, e todos nós nos sentamos ao redor da mesa do conselho real. O semblante de cada conselheiro reflete a gravidade da situação. Charles Bourbon, condenado à guilhotina, conseguiu escapar sob nossos narizes. Isso não é apenas um insulto à justiça de Navarra, mas também uma ameaça direta à segurança de todos, especialmente de Catherine e nosso filho.

Meu pai está rígido, seu olhar penetrante e inflexível, enquanto comanda o conselho. O exército é acionado imediatamente para iniciar as buscas, e cada segundo que passa é uma espada pendendo sobre nossas cabeças. As buscas começam, e eu mesmo lidero uma das equipes. Seguimos pistas por todo o dia, vasculhando florestas, cavernas e qualquer local onde o verme de Charles poderia estar se escondendo, mas, ao cair da noite, ainda estamos de mãos vazias. O primeiro dia de buscas se encerra sem qualquer resultado, e meu corpo carrega a exaustão de uma batalha que ainda está longe de terminar.

Quando retorno ao castelo, o peso da frustração está sobre mim como uma tempestade prestes a desabar. Cada passo ecoa pelos corredores frios, e tudo o que quero é chegar aos meus aposentos, ver Catherine e esquecer o dia miserável que tive. Mas antes que eu consiga alcançar a escada que leva aos nossos aposentos, alguém me barra o caminho.

A última pessoa que eu queria ver... Selin de Médice.

— Príncipe Frederick, temos assuntos pendentes — sua voz é tão cortante quanto sua postura. Ela se coloca bem à minha frente, os olhos faiscando com a raiva que claramente guardou desde o rompimento do nosso noivado.

Eu não tenho paciência para isso agora. Não com Charles à solta, e o futuro da minha família ameaçado. Respiro fundo, tentando manter a calma, mas minhas palavras saem carregadas de exasperação.

— Selin, agora não é hora. Tenho problemas muito maiores do que...

— Maiores do que a humilhação pública que me causou? — ela me corta, dando um passo à frente, o rosto erguido com aquela mistura de desprezo e indignação que parece nunca abandonar sua expressão. — Você me deixou sem uma explicação, sem sequer uma compensação. Eu era para ser sua noiva, Príncipe Frederick. E agora? Como pretende me compensar por isso?

Eu aperto os punhos, tentando controlar a vontade que tenho de dizer algo que talvez me arrependa mais tarde. Estou prestes a mandá-la embora, definitivamente e sem rodeios, quando ouço uma voz firme e inesperada atrás de mim.

— Se o que você quer é dinheiro, Selin, isso pode ser resolvido.

Viro-me imediatamente e vejo Catherine parada ao meu lado. Sua presença me pega de surpresa, e pelo tom de sua voz, sei que algo mudou nela. Ela continua, sua expressão serena, mas com uma intensidade que eu raramente vejo.

— Propriedades, ouro, isso tudo pode ser dado a você, se é o que realmente busca. Mas em relação ao meu marido, pode esquecer. Isso não está em negociação.

Ela se aproxima mais de mim, segura minha mão com firmeza, seus olhos fixos nos de Selin, e finaliza com uma frase que ressoa em cada canto do corredor.

— Nossa família já está completa. Frederick tem esposa e filho, e não há espaço para mais ninguém nessa relação.

Selin abre a boca, mas as palavras parecem morrer antes de serem pronunciadas. O silêncio que segue é quase palpável. Catherine não recua, não desvia o olhar. A mulher diante de mim agora é forte, segura. A mesma mulher por quem me apaixonei desde o princípio, e por quem meu coração se aquece ao vê-la recuperando seu espírito.

— Agora, se me der licença — diz Catherine, sua voz inabalável, — nós temos coisas mais importantes a tratar.

Sem esperar por uma resposta, ela me puxa pela mão, me guiando para longe de Selin, deixando-a para trás, atônita e sem palavras. Meu coração incha de orgulho ao sentir o calor da mão de Catherine entrelaçada à minha. O que acabei de presenciar foi mais do que apenas uma declaração de posse. Foi uma afirmação de força. Uma prova de que, apesar de tudo, minha Cath está de volta.

Conforme subimos as escadas para nossos aposentos, sinto a tensão do dia escorrer de meus ombros. Catherine olha para mim de relance, e vejo em seus olhos algo que havia desaparecido nos últimos dias: confiança. Aquela tristeza que antes a consumia parece ter recuado, ao menos um pouco, e o brilho de luta voltou a se acender em seu olhar. Quando chegamos ao quarto, ela solta minha mão devagar, mas não diz nada de imediato. Por um momento, ficamos apenas olhando um para o outro, e não consigo evitar sorrir. Um sorriso que começa pequeno, mas que logo se alarga.

— Você me surpreendeu hoje, Cath — digo, minha voz mais suave agora, livre do peso que carreguei durante todo o dia.

Ela ergue uma sobrancelha, fingindo desinteresse, mas vejo o leve rubor em suas bochechas.

— Ela precisava ouvir — responde, com um toque de desafio em sua voz.

Eu rio, um som genuíno e que há tempos não sentia sair de mim. Caminho até ela, minha mão encontrando o caminho até seu ventre, onde nosso filho cresce. Ao tocá-la, um silêncio confortável se instala entre nós. O orgulho que sinto não é apenas por suas palavras afiadas diante de Selin, mas por sua força. A força de quem enfrenta os próprios medos e sombras, e emerge mais forte do outro lado.

— Você sabe que isso não é só por mim — ela diz, baixinho, quase como se confessasse um segredo.

— Sei — respondo, ainda sorrindo. — Mas hoje... hoje eu vi a mulher por quem me apaixonei.

Catherine suspira, mas há um brilho de satisfação em seus olhos. Ela toca minha mão sobre seu ventre e encosta sua testa na minha, um gesto tão íntimo que quase me faz esquecer do caos que ainda reina fora deste quarto. Mas apenas quase. Porque amanhã, ainda terei de encarar o conselho. Ainda precisarei liderar as buscas por Charles, o traidor que fugiu de sua sentença. Ainda haverá desafios, ameaças e o fardo de ser o príncipe herdeiro de Navarra.

Mas por agora, com minha esposa ao meu lado e nosso filho crescendo dentro dela, sinto uma paz que não tenho há muito tempo. Hoje, ao menos, posso descansar, sabendo que a mulher que amo está aqui, forte e pronta para enfrentar o que vier.

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