SESSENTA E SEIS

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VIRGÍNIA

— Amor? - Ângelo bateu na porta do banheiro e eu congelei, segurando com as mãos trêmulas o teste de farmácia.

Sem esperar para receber uma resposta, Ângelo entrou no banheiro e eu me virei pra ele lentamente, ainda segurando o teste com minha mão tremendo.

Ângelo franziu a testa, mas, notei a compreensão em sua expressão conforme ele se aproximava de mim.

— Você... nós... - ele parecia totalmente em choque, e isso me deixou ainda mais aflita.

Sem saber o que fazer, entreguei a ele o teste e as mãos de Angelo pareciam tão trêmulas quanto a minha.

— O que dois traços significa? - ele perguntou baixinho e eu arfei.

— Acho que vamos ser pais... - sussurrei e engoli seco. — É o que a embalagem diz.

Ângelo ainda estava em silêncio, encarando o teste de farmácia como se fosse um quebra-cabeças, um dos mais complicados.

Eu estava esperando uma reação mais elaborada que essa, sendo sincera.

— Como você está se sentindo sobre isso? - sussurro baixinho, minha voz transbordando pânico.

— Como você está se sentindo sobre isso? - Ângelo ergueu o olhar pra mim e eu notei que ele estava tentando controlar as lágrimas, isso foi o suficiente para que eu permitisse que as minhas fossem livres e comecei a chorar, o que o fez chorar também. — Venha aqui, amor. - Ângelo me puxou para um abraço apertado.

Acomodei meu rosto em seu ombro e chorei, me sentindo protegida entre seus braços.

— Estou aterrorizada, mas eu quero ter uma família com você - sussurrei, me dando conta daquilo apenas quando falei em voz alta. — Nunca foi meu sonho ser mãe e nunca tinha pensado nisso, mas estou tão feliz que essa criança seja nossa.

— Meu amor... - Ângelo capturou neus lábios em um beijo profundo e exigente, as mãos me mantendo perto dele o tempo todo. — Obrigado por isso - ele sussurrou e encerrou nosso beijo com um selinho — Você vai ser uma mãe tão gostosa... - ele sorriu e eu soltei uma risada.

— Oh, cale-se... - eu toquei seu rosto, secando as lágrimas que desciam de forma silenciosa — O que foi?

— Você é a mãe dos meus filhos... - ele encolheu os ombros — Apenas estou feliz. Por ser você. Por sermos nós.

— Eu também.

Sorrimos um para o outro, e Ângelo enxugou o rosto, fungando.

— Você está se sentindo bem? - ele perguntou baixinho e eu me toquei do que ele estava falando quando vi a preocupação extrema estampada em seu rosto. Ele estava com medo.

— Nesse exato momento eu estou ótima. - segurei suas mãos — Estou bem.

— Que continue assim - ele sussurrou e respirou fundo. — Eu ainda não estou conseguindo acreditar.

— Não é como se nós tivéssemos feito algum esforço pra não acontecer, você sabe - falei séria e ele riu. Não tínhamos usado proteção nenhuma vez desde o casamento e, ejacular fora não contava como proteção, mesmo que ele negasse isso veementemente.

— Bom, não imaginei que fosse acontecer tão rápido, principalmente com meu histórico familiar. - ele me olhou pensativo — Eu sou tão novo e tão bonito pra ser pai, - Ângelo suspirou de forma dramática e eu dei um tapa em seu ombro. Ele fez uma careta, sorrindo em seguida, — Mas pelo menos, com nossos genes, essa criança vai ser encantadora, no mínimo. Uma destruidora de corações. Teremos  problemas.

— Que essa criança, não nos dê trabalho igual nós dois demos aos nossos pais. - eu fiz uma careta e Ângelo me acompanhou.

— Quero ver a sua barriga. - ele disse de repente.

— Não mudou nada. - respondi, mas mesmo assim, levantei a blusa do meu pijama e ele se agachou, o rosto ficando na altura da minha barriga, que não havia mudado.

— Está igual a última vez que eu vi... - Ângelo sussurrou, segurando minha cintura com as mãos. — O que no caso foi ontem... - ele franziu a testa e eu revirei os olhos — Olá, bebê. Seja uma criança boazinha com a sua mãe, tudo bem? Ou vamos ter problemas quando você nascer. Sua mãe é o amor da minha vida, então é melhor se comportar aí dentro, entendido?

— Pare de ser bobo - reclamei, mas, meu coração estava estranhamente batendo mais rápido que o normal.

Ângelo me ignorou e colou a bochecha na minha barriga. Ele ficou assim, em silêncio, enquanto eu passava meus dedos por seus cabelos dourados, pensando se a nossa criança teria os seus traços ou os meus... e a personalidade? Eu não sabia qual era a pior entre nós dois, de qualquer forma, seria um desafio, mas com certeza Acsia mimaria aquela criança mais do que fez com o filho e mais do comigo.

— Precisamos contar pra minha mãe. - Ângelo disse, ainda com o rosto colado na minha barriga.

— Ela sabia primeiro que eu - falo sorrindo e ele se levanta, me olhando com a sobrancelha — Ela apostou com Jean, pra saber quando eu ia descobrir

— Ela apostou? - Ângelo ergueu uma  sobrancelha — Ela ganhou pelo menos? Ela é péssima com apostas.

— Ela perdeu.

— Quanto?

— Ciaquenta.

— Ciaquenta euros?

— Cinquenta mil.

— Apenas? Achei que ela estivesse mais empolgada sobre ter netos.

— As vezes eu esqueço que vocês dois são insanos - reviro os olhos.

— Tem certeza que está se sentindo bem? - Ângelo perguntou, a voz voltando a ficar séria e preocupada — Nenhum... sintoma anormal, talvez?

— Não sei o que são sintomas anormais, já que eu nunca estive grávida antes, mas, eu estou me sentindo bem... - garanti. Eu estava me sentindo bem — Emocionalmente abalada e meio enjoada, mas bem. Eu prometo.

Ângelo me fitou por longos momentos, como se quisesse ter certeza de que eu não estava mentindo, antes de assentir e voltar a sorrir.

— Tudo bem, só quero que me prometa uma coisa.

— Que coisa?

— Que, não vai colocar a vida dessa criança acima da sua. - a sua voz se tornou mais sombria — Minha família, você sabe, nos temos um histórico ruim em relação a filhos e... eu não quero que se coloque em risco tentando me dar um herdeiro. Posso viver sem um herdeiro, mas não posso viver sem você.

— Não diga isso, Ângelo - pedi, meu interior arrepiando com suas palavras.

— Não me entenda errado, eu já amo essa criança, é nossa, nosso filho, fruto do que sentimentos um pelo outro, mas você é minha prioridade.

Segurei seu rosto entre as minhas mãos, tentando tranquiliza-lo. 

— Você está sendo irracial, Ângelo - eu falei, tentando manter a minha voz mais calma e suave possível. — Nada vai acontecer comigo, eu sou forte e saudável.

— Eu não posso perder você. - ele sussurrou, engolindo seco — Não posso.

— E não vai. - garanti, tendo certeza do que eu estava falando, — Não se preocupe.

À PROVA DE BALASOnde histórias criam vida. Descubra agora