Anúncio de troca

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Homenagem a ti, Osíris, Senhor da eternidade, Rei dos Deuses, cujos nomes são múltiplos, cujas as formas são sagradas, sendo a forma escondida nos templos, cujo Ka é sagrado.

~ Fragmento do Livro dos Mortos - Hino à Osíris

Duas crianças se sentavam com expressões variadas de preguiça apoiando seus braços sobre a mesa de madeira cheia de tábuas escritas e ou em branco enquanto Thoth tentava demandar das crianças a atenção. Uma delas, Anúbis, estava de pé na frente da mesa onde sentava os dois amigos e, ao seu lado, Thoth cruzava os braços o olhando com calma e um sorriso. Podia reclamar um pouco de ser babá, mas gostava de ensinar os pequenos. Ainda mais porque os estava ensinando a ler no momento.

— Vamos, tente ler de novo. Desde do começo – pedia Thoth olhando para o pequeno Anúbis que o olhou de volta e então voltou a olhar para a tábua que tinha em suas mãos.

A tábua estava repleta de símbolos que em alguns milênios no futuro perderiam seu significado. A criança, no entanto, sabia o significado de a maior parte já e estava aprendendo aqueles que não sabia. Ali, naquele momento, a língua que um dia morreria estava sendo aprendida a ser falada, lida e escrita. Ainda faltavam alguns séculos para o papiro ser inventado, mas isso não significava que eles não podiam ter outras formas de escrever.

— Adoração ao Nilo! Salve para você, o Nilo. – começou o garoto lendo em seu ritmo lento de aprendizado – que se ma... Manifesta sobre... Esta terra, e... venha dar vida ao Egito! Misteriosa é a sua saída da... da...

O garoto parou e olhou rapidamente com o canto do olho para Thoth que, já sabendo de cor o texto, não precisou olhar para saber qual a palavra que vinha a seguir.

— Escuridão – respondeu Thoth ajudando o garoto.

— Escuridão [1] – repetiu Anúbis. Pode se surpreender quem considerar que pequenas crianças que mal começaram a aprender já estavam lendo assim fluente, mas a verdade também era que já haviam perdido a conta de quantas vezes leram esse texto. Além disso, podia-se considerar que eram deuses e, aquela escrita era a escrita dos deuses.

— Vamos, continue. – insistiu o deus da sabedoria dando força ao garoto.

— Neste dia em que é celebrado. Mo... Molhando os pomares criados por Ra para que... Todo o... O... – tentou o garoto fitando a próxima palavra. Era sempre a mesma palavra que ele tinha problemas.

Thoth deixou que o menino se concentrasse e tentasse, por conta própria, descobrir qual era a palavra, mas quando o menino abriu a boca para vocalizar a palavra que leu depois de alguns segundos de concentração, uma mulher entrou de forma discreta. Ela parou no cantinho e Thoth olhou para ela. Ela gesticulou com a mão o chamando e seus lábios pareciam dizer "É importante", mas sem deixar nenhum som sair deles. O professor afirmou com a cabeça e olhou para seus alunos que agora o olhavam com curiosidade.

— Aproveitem para copiar o texto todinho – disse Thoth – e lendo-o também.

Ele deixou a sala que as crianças estudavam e foi falar com a mulher no corredor em tons baixos. As três crianças olharam para ele indo embora, mas pouco se interessaram quanto a o que a mulher queria comunicar ao professor deles.

— Ah... Não quero mais copiar – reclamava Qebui – Nem ler inclusive. Isso cansa.

— Uhumm... – concordou Anput.

Agora sem ninguém lendo e sem Thoth reclamando da maneira correta de fazer o símbolo do abutre ou sobre o quão desleixada era a letra deles, eles puderam prestar atenção nos barulhos que vinham de perto do templo onde estudavam. Por alguns segundos, nada mais ouviram além dos cochichos de Thoth e da mulher e das folhas das palmeiras batendo contra o vento. Isso é, até que eles ouviram um grito.

A Morte Das Areias do SaaraOnde histórias criam vida. Descubra agora