O oásis de Siwa

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Eu não poderia persuadi-lo a entrar comigo?

Deixe o frio rastejar lentamente em torno de nós?

Então eu mergulharia fundo

e subir para você pingando,

Deixe você encher seus olhos

com o peixinho vermelho que eu pegaria

~ Fragmento de "Cairo Ostracon 25218"

Uma conversa com assuntos tão delicados quanto filhos e que ainda por cima terminava com os dois lados discordando entre si, rapidamente criava um clima meio estranho. O único barulho além do farfalhar do vento batendo nas folhas das palmeiras e tamareiras do oásis, era o suave ronco do dromedário e de Merti. Nem Anúbis, nem Anput sabiam bem como continuar aquela conversa ou mudar de assunto, assim, apenas aceitaram o silêncio que os envolveu enquanto Merti dormia.

Contudo, não muito surpreendentemente graças aos acontecimentos do dia, os sonhos de Merti estavam claramente indo por caminhos não muito agradáveis, pois o suave ronco e suspiro da criança logo se transformou em resmungos sem sentido e começos de choro. Foi o triste som das fungadas de um começo de choro infantil que atraiu a atenção de Anúbis e Anput.

- Parece que, assim como o dia, a noite dela também não está sendo das melhores... - disse Anput tristemente soltando um pequeno suspiro.

- Já tinha achado incrível ela ter conseguido dormir pra começo de conversa. - disse Anúbis olhando para a garota sem saber bem o que fazer.

Merti abraçava cada vez mais forte sua boneca enquanto Anúbis se perguntava se era uma boa ou má ideia acordar ela. Anput estava longe demais para fazer alguma coisa, mas ela se aproximou um pouco mais da menina para poder ver seu rostinho adormecido e choroso melhor. Era fácil ver a dor da perda estampada no rosto de Merti e foi exatamente ela que fez Anput, instintivamente, levar a mão até o rosto da pequena para limpar-lhe uma lágrima.

- Você vai levá-la para a avó logo pela manhã? - perguntou Anput.

- Provavelmente assim que ela acordar. - disse Anúbis.

- Espero que a avó tenha condições de mantê-la. - falou Anput preocupada - Uma boca a mais não é fácil para todos.

Sabendo que isso era bem verdade, Anúbis não se sentiu na necessidade de responder nada para Anput. Mas, silenciosamente, ele torcia para a senhora idosa ter condições de manter a neta, mesmo que ele tivesse que dar uma forcinha. Vendo ainda a expressão de tristeza e aflição no rosto de Merti, o único alento que ele pode dar que não acordasse a garota, foi um leve acariciar em sua cabeça que tentava dizer, silenciosamente, que tudo estaria bem.

Não tinha mais muito o que fazer enquanto a noite não passasse e Merti acordasse. Assim, para não deixar Anúbis sozinho ali, Anput resolveu fazer-lhe companhia quase que fingindo que a conversa anterior dos dois não tinha acontecido. Eventualmente, no meio da noite, Merti acabou acordando. Com sono demais para notar a presença de Anput, já que também nem se deu ao trabalho de terminar de abrir os olhos, ela voltou a dormir poucos segundos depois que sua pequena mão agarrou dois dos dedos da mão direita de Anúbis.

Quando o sol estava ameaçando nascer no leste, Anput foi embora. Afinal, o trabalho só havia se acumulado no submundo e ela torcia, implorava, para que Anúbis não demorasse tanto mais por ali. Mas, claro, demorasse ainda assim o tanto que fosse necessário para deixar Merti em segurança com a avó.

A Morte Das Areias do SaaraOnde histórias criam vida. Descubra agora