Ele foi e ... todos os tipos de armas ... para servi-lo. O homem conduziu-o para o Oriente. Ele disse-lhe: "Vá agora para onde quiser." Ele saiu e o cachorro com ele. Ele subiu para o campo de acordo com sua vontade, ele viveu do melhor de todos os animais do campo
~ Fragmento de "Papiro Harris 500"
O clima havia ficado repentinamente tenso graças à Anúbis e Qebui. Os outros já mal ousavam respirar, quem dirá falar algo. Eles apenas observavam, tensos, Anúbis e Qebui se encararem intensamente só esperando para ver quem seria o primeiro a acrescentar mais palavras ao que era indiscutivelmente o começo de uma discussão.
Era evidente que as palavras queriam sair da boca de Qebui, pois ele remexia os lábios e a língua, irritado, como se estivesse com alguma balinha azeda dentro da boca. Todavia, ele não falava nada. Apenas encarava de volta o olhar sério e frio que Anúbis direcionava à ele, não tão pacientemente assim, esperando para ouvir quais as palavras que estavam coçando na ponta da língua do deus do vento do norte.
- E então? - incentivou Anúbis - Desaprendeu a falar? Está a séculos me tratando assim e não quer ao menos explicar o que eu lhe fiz?
- É irritante... - resmungou Qebui bufando mas logo aumentando a voz novamente - É irritante! Você é irritante! Toda essa situação é irritante!
- O que tanto eu lhe fiz para você ficar tão irritado com tudo? - questionou Anúbis.
- Eu, você e Anput começamos juntos na mesma merda. Tá que você é filho de Set e Néftis... mas o Nefertem é filho de Ptah e Sekhmet e a Seshat do Thoth! - exclamou Qebui - Não tínhamos grandes importâncias, mas estávamos juntos nessa. Mas você tinha que ficar importante...
- Eu não simplesmente escolhi que queria ser deus da morte! - defendeu-se Anúbis interrompendo Qebui.
- Mas escolheu se achar importante demais para andar com a gente! - continuou Qebui.
Por alguns segundos, Anúbis encarou Qebui como se estivesse louco. Não fazia ideia de onde ele havia tirado que Anúbis se achava importante demais para andar com eles. Com medo de acabarem sendo puxados para aquela discussão, Nefertem e Sopdet desviam o olhar, temerosos, e Seshat abaixava os olhos fitando o próprio colo.
- De onde você tirou uma coisa tão ridícula quanto essa? - quis saber Anúbis.
- Talvez de você claramente parando de passar um tempo com a gente? - perguntou Qebui retoricamente.
- Pode ter passado despercebido para você, mas todos os mortais morrem e tem algum parente ou amigo que morreu. - rebateu Anúbis - Dezenas morrem todos os dias! Tenho que vigiar sacerdotes, preparar corpos, julgar almas...Eu não tenho tanto tempo quanto você acredita que tenho! A culpa não é minha se "o vento do norte" praticamente só é importante para os comerciantes que usam o Nilo!
Nesse ponto, a raiva que cresceu dentro do coração de Qebui se tornou cada vez mais palpável. Uma boa prova disso foi a mão de Qebui que se fechava num punho tão apertado que os nós das mãos saltavam por debaixo da pele negra-castanha. O aperto das mãos acompanhava a aparição de uma brisa leve mas claramente não natural, pois surgiu do nada percorrendo o pequeno grupo em círculos perfeitos balançando o cabelo dos deuses, inocente, mas tensa.
A brisa mágica deixou todos, menos Anúbis, mais preocupados com a possibilidade de aquilo virar uma luta, mesmo que por acidente. Vendo a força com a qual Qebui apertava a própria mão, isso não seria surpreendente. Parecia uma questão de tempo para Qebui lançar uma forte rajada de vento contra Anúbis ou simplesmente lhe dar um soco. Anúbis, no entanto, não parecia minimamente preocupado com nenhuma das possibilidades embora enxergasse ambas.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Morte Das Areias do Saara
Ficção HistóricaAntes de as pirâmides serem construídas, as areias do Saara, as águas do Nilo e suas margens pertenciam aos deuses. E, dentre esses deuses egípcios que reinavam, protegiam e castigavam os humanos, existia um deus conhecido por sua ligação com a mort...