Oh, pressa em olhar para o seu amor!
Seja como cavalos atacando na batalha,
Como um jardineiro acordado com o sol,
Queimando para ver seu broto premiado abrir.
~ Fragmento de "Papiro Harris 500"
Uma vegetação tímida e que provavelmente não iria durar mais muito pintava um pontinho verde no deserto marcando onde uma vez havia sido um oásis. As dunas cortavam o horizonte como enormes ondas douradas e a única coisa que fazia sombra na areia era um falcão voando alto no céu sem nuvens. O falcão, obviamente, era Hórus.
Não demorou muito para Hórus começar a ver no horizonte o que era claramente uma serpente estupidamente enorme. O tamanho tão absurdo e irreal deixava claro que aquela cobra era Apófis mesmo que Hórus não tivesse visto ainda o rosto dele. Na verdade, da distância em que estava, não conseguia nem mesmo achar pra que lado deveria ficar o rosto. Mas, pior do que isso, foi ver que em espaços longes o suficiente de Apófis para ser seguro mas ainda estar por perto, havia uma massa formada por outras criaturas.
Hórus sentiu o caos que aquelas criaturas emanavam e soube bem o que eram, demônios, seres oriundos do caos que formava a Terra dos Demônios, uma camada do Duat perigosamente próxima ao Mar do Caos. Um lugar perigoso e hostil cujo único ser não sanguinário ou maligno que criou provavelmente foi Ammit. A presença de dezenas de demônios ali era prova de que Apófis tinha usado seu tempo livre para formar um exército que provavelmente tinha capacidade de acabar com os deuses de uma vez só.
Enquanto Hórus pensava em como seria complicado lidar com tantos adversários e torcia para o plano de Thoth dar certo, as duas logo embaixo dele explodiram. De baixo da areia, a cabeça de Apófis surgiu com a bocarra escancarada e ansiosa para transformar Hórus em café da manhã. Apófis tinha estado até então parcialmente escondido embaixo da areia, como muitas cobras nativas do Saara bem gostavam de fazer.
Foi um pouco no último segundo, mas Hórus conseguiu desviar do ataque surpresa de Apófis voando mais para o alto e para o lado. Abocanhando só o ar seco do deserto, Apófis logo se arrumou e riu da pressa do deus em fugir de sua boca.
- Não me diga que veio sozinho... - disse Apófis - Esperava mais de você, Hórus. Mesmo que aparentemente esteja só patrulhando o lugar provavelmente me procurando, é meio prepotente de sua parte fazer isso sozinho.
- Você claramente também é um tanto prepotente... - disse Hórus ainda em sua forma de águia batendo as asas para manter a altura enquanto encarava Apófis parado no ar.
- Eu? - rio Apófis - Como bem pode ver, a não ser que esteja ficando cego do outro olho também, tenho um exército ao meu redor. Já tiveram dificuldades lutando contra mim sozinho, mas mesmo assim busquei um exército. O que tem de prepotente em aumentar a chance de acabar com vocês todos de uma vez? Bem sei que os deuses que me enfrentaram na última vez não são nem metade...
- Bem, admito que a ideia de buscar um exército sem seus méritos. - admitiu Hórus - Mas não foi por isso que chamei-lhe de prepotente.
Apófis encarou Hórus tentando entender ao o que ele se referia, mas nem sabia que Hórus estava ansioso tentando não olhar ao seu redor perguntando-se silenciosamente quando os outros chegariam. Não podia tirar os olhos de Apófis, mas pôde quando, num piscar de olhos e aparentemente de forma sincronizada, uma pequena névoa negra surgiu num ponto no ar logo ao lado de Apófis mas mais abaixo de onde Hórus estava.
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A Morte Das Areias do Saara
Ficción históricaAntes de as pirâmides serem construídas, as areias do Saara, as águas do Nilo e suas margens pertenciam aos deuses. E, dentre esses deuses egípcios que reinavam, protegiam e castigavam os humanos, existia um deus conhecido por sua ligação com a mort...